Tendo em sua estrutura alicerces de metal e concreto, que são afetados pela maresia, as construções em Fortaleza precisam obedecer a parâmetros rigorosos para não apresentarem deterioração precoce. Mas até onde vai a maresia em Fortaleza? Ela se comporta de forma similar em todas as áreas? As edificações precisam todas atender às mesmas normas em diferentes partes da Capital? Respondendo a esses questionamentos, o estudo da agressividade do ar em Fortaleza foi feito pela arquiteta mestre em Engenharia Civil Ana Mara da Rocha Campos e pelo professor doutor do Departamento de Engenharia Estrutural e Construção Civil da Universidade Federal do Ceará e especialista em patologia das edificações, Eduardo Cabral.
[SAIBAMAIS]Por um ano, entre 2015 e 2016, velas úmidas (compostas por tubo de PVC, envolto em gaze cirúrgica e fixado a um frasco coletor de vidro) foram distribuídas e uma malha amostral de 46 pontos da Cidade, começando a 50 metros da orla e chegando até 8 km dela. A abrangência foi de 101 km², cerca de 32% do território de Fortaleza e a área em que há maior concentração de construções. A cada mês, era feita troca das velas e coleta dos dados de quantos miligramas de cloreto por metro quadrado por dia se depositaram em cada vela.
Quanto mais próximo do mar, maior a concentração do teor de cloreto.
Mas, ao contrário do que se tinha como conhecimento prático na Cidade, a classificação obtida não determina que a Fortaleza está toda em área definida como de “forte” agressividade. “Até cerca de 200 metros na área da Praia do Futuro, essa classificação é de “muito forte”, classe 4; de 200m a 2km em toda a orla era “forte”, classe 3. E no restante do território ela é “moderada”, classe 2”, explica Ana Mara.
A maresia é tão forte em alguns dos pontos estudados que, para entender, o professor dá exemplo visual, usando o ponto próximo a rua Francisco Delgado Perdigão, na Praia do Futuro, onde se atingiu o teor máximo de concentração de cloreto [5.285,06 mg/(m².d)]. Se lá for colocada uma placa com um metro quadrado pesando um quilo, ao final de 365 dias, ela pesará 2,92 kg. Ou seja, 1,92 kg de sal será depositado na placa em um ano.
“Até esse trabalho, se dava a classificação por um feeling de pessoas que já haviam construído aqui. Sem dados, se nivelava por cima e, por ser uma zona marinha, se construía tudo como classe três, independentemente se era na Praia do Futuro, onde sabemos que é classe 4, ou no José Walter, que é classe dois. O prédio que deveria ser pensando para 50 anos, se deteriora muito mais rápido na Praia do Futuro, enquanto do José Walter dura mais, mas tem um custo muito mais elevado do que deveria”, exemplifica Eduardo, lembrando que 98% dos diagnósticos de problemas em estruturas na Capital tem como causa dos a agressividade do ar por cloreto.
A deterioração se dá porque os sais penetram na porosidade do concreto, atingem estruturas metálicas internas. A corrosão faz com que o metal aumente de tamanho. Sem vazios, o concreto acaba por ruir, o que dá origem a rachaduras e fissuras. Para evitá-las é preciso que o concreto obedeça a padrões de resistência (quanto mais resistente, menos poroso), de espessura de cobrimento da estrutura metálica e relação cimento/água, conforme a agressividade do ar da região, aponta Ana Mara.
Sinais
Morando na Praia do Futuro há 17 anos, a garçonete Margarida Soares Santana, 42, mudou-se recentemente pelo medo das rachaduras que tomavam conta do pequeno apartamento na avenida Zezé Diogo. “Eu mal dormia com medo de que, por falta de manutenção, aquilo fosse cair qualquer dia em cima de mim”. Ela não saiu da praia, mas procurou apartamento recém-construído para ficar mais tranquila. “A maresia só não come o Baby (o gatinho de estimação), mas se você for ver até a coleira dele é enferrujada”, brinca.
Com casa construída há sete anos, também na Praia do Futuro, a dona de casa Rita de Cássia Marques Nogueira, 40, já contabiliza rachaduras. “Ali (diz, apontando para uma coluna com fissura aparente) eu sei que é um pilar que tem ferro e que por isso tá assim. Não demora muito, vamos ter de reformar de novo”, lamenta.
Eduardo explica que leigos podem estar atentos a sinais, como manchas escuras que podem indicar corrosão, fissuras e deformações. Mas, diagnóstico e reparo devem ser dados por profissionais, como especialistas em patologias de edificações. Manutenções constantes e revestimentos apropriados são as principais indicações.
[FOTO2]