“Foi nos dada a possibilidade de ser livre para transar e gozar, mas ainda não nos foi ensinado a obter esse prazer”. Assim, a psicóloga, sexóloga e terapeuta de casais Josi Mota indica que, mesmo após desvinculação do sexo como fator unicamente de procriação, à mulher foi negada uma educação sexual que pregue liberdade e igualdade de gêneros. Desta forma, se perpetuam tabus em relação à masturbação feminina, ao autoconhecimento, e à busca e exigência da mulher pelo próprio prazer.
Por anos, Josi explica, a psicanálise freudiana diferenciava orgasmos vaginais de orgasmo clitorianos — estes tratados como orgasmos infantis. Imputar o orgasmo vaginal como o ideal de uma mulher adulta age, conforme a especialista, em duas frentes deletérias do prazer feminino: frustrando às mulheres que não alcançam ápice do prazer pela penetração e inibindo o estímulo do clitóris pela parceria ou por ela mesmo. “No final da década de (19)80 para cá, é que a gente começou a entender o clitóris como um lugar de potência e um dos principais responsáveis por disparar o orgasmo feminino — não o único, mas um dos mais eficazes”, elucida.
“Muitas mulheres nunca nem se tocaram ou olharam para própria vagina. Essa mudança passa muito mais pelo clitóris, de descoberta do próprio prazer. Acionar o clitóris requer que a mulher tenha conhecimento do corpo, que ela se toque e se descubra. O orgasmo pode acontecer em todo o corpo, mas a grande descoberta é que o clitóris é o ponto principal”, sentencia. Ela acredita também que são ainda poucos os anos passados desde a revolução sexual promovida pelas pílulas anticoncepcionais e do descortinamento do papel do clitóris. E muitos ainda são os limites impetrados ao comportamento sexual feminino.
Assim, se sedimenta a proibição e o sentimento de culpa em torno da masturbação. Para a presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Carmita Abdo, o número de mulheres que têm o autoestímulo sexual como rotina é ainda pequeno, frente ao percentual masculino que cotidianamente se masturba. “Mulheres muitas vezes não se permitem o autotoque e, na maioria dos casos, delega à parceria essa função. A partir do autoconhecimento, ela pode ajudar a parceria a lhe oferecer prazer, porque ela poderia informar o que gosta, o que não gosta, e isso seria proveitoso porque ela teria no sexo uma atividade mais compensadora”, indica.
Fingir o orgasmo
Ainda assim, para a sexóloga Debora Britto, a cada dia, mesmo que a passos pequenos, “mais mulheres ampliam suas noções de autoconhecimento sobre o corpo e a sexualidade feminina. Impulsionadas pelo movimento feminista, o acesso a ferramentas de informação como a internet, a própria mídia e a construção de uma atenção à saúde mais holística e humanizada”. É, por meio do autoconhecimento e do entendimento do poder da vagina e das possibilidades que o clitóris dá, que mais mulheres se apoderam do próprios corpos e passam a ter o prazer delas como prioridade numa relação sexual.
Domitila Andrade
OBRA VAGINA DA ARTISTA VISUAL KAREN DOLOREZ