Traduzir em palavras o que sente o próprio corpo, às vezes, não é tarefa fácil. E a gente precisa falar do jeito que sabe, que consegue comunicar. Quem nunca disse que estava com uma “fininha” ou sentiu algo tão intenso que chegou “a se ver de dor”? Em cada comunidade, é fácil observar um vocabulário característico e que diz de forma clara sintomas e doenças. Rinites alérgicas podem ser simplesmente um “estalecido”. A miopia, uma “vista curta”.
Pesquisa do Departamento de Ciências da Informação da Universidade Federal do Ceará (UFC), estuda a construção do vocabulário utilizado por comunidades indígenas do Ceará. Mas não é difícil, para a população geral, se identificar em um ou outro termo.
“A gente estava se confrontando com as dificuldades que as pessoas tinham de dialogar com os médicos que vinham pelo Mais Médicos. A proposta era contribuir para o processo de comunicação médico-paciente, diminuir as interferências. Do ponto de vista antropológico, da representação da informação, da construção das palavras”, explica a professora Virgínia Bentes, uma das responsáveis pelo projeto, iniciado em 2014.
Esses cruzamentos serão discutidos, entre os dias 19 e 22 de junho, no V Seminário Internacional de Informação para a Saúde, promovido pelo curso de Ciência da Informação da UFC. “As pessoas precisam ter uma conscientização, se empoderar sobre as condições de sua saúde. Entender os aspectos daquilo que você está enfrentando, envolve compreensão, terminologia, léxico. O evento também aborda a parte de ordenamento jurídico, quais os protocolos de cuidados. É preciso compreender a parte tecnológica, ética, deontologia, bioética”, frisa Virgínia.
Segundo ela, a linguagem popular usada para falar sobre os sintomas, muitas vezes, soava como uma brincadeira. “As pessoas têm um léxico pelo qual se comunicam em qualquer local. Isso dificultava o processo de comunicação”, explica. Após a parte teórica, a dificuldade surgiu quando o grupo foi à campo. Essa etapa foi feita junto aos tapebas (Caucaia), tremembés (Itarema e Acaraú), pitaguaris (Maracanaú e Pacatuba) e jenipapo-canindés (Aquiraz).
“A gente comparou o léxico com dicionário de termos e a classificação internacional das doenças. Discutimos com o nosso consultor, o professor Henry Campos, reitor da UFC. Porque a gente queria construir um vocabulário controlado. A terminologia de especialidade vai se misturando com o léxico das comunidades”, diz.
A ideia é construir uma página na internet sobre esse léxico e disponibilizar o conteúdo com mais de 400 palavras. A pesquisa ainda não está terminada e deve ser continuada com o trabalho com outros públicos, como pescadores.
Ana Rute Ramires
PARA ENTENDERO VOCABULÁRIO
CAROÇO
NóduloCURUBA
Micose não especificadaDESMENTIDURA
Deslocamento (de osso, articulação) ou contusão (muscular, ligamentar etc.); luxação, entorse, desconjuntamentoDOR NA JUNTA
Artrite reumatoide não especificada
INTIRIÇA
Diarreia e gastroenterite de origem infecciosa presumívelMANCHA NO PULMÃO OU TISGO
Tuberculose
OSSO RENDIDO
Fraturar ossosPASSAMENTO
Síncope e colapso, “apagamento”, desmaioREQUENGADO
DebilidadeRUSSARA
UrticáriaVENTO PRESO
Acúmulo de gases intestinais
V SEMINÁRIO INFORMAÇÃO PARA A SAÚDE
19/6
18h30 – Conferência de Abertura: Neurociências, informação e tecnologias digitais a serviço da saúde coletiva
20/6
8h30 – Mesa redonda: Regime de informação e protagonismo na saúde coletiva: interlocuções entre Ciência da Informação, Ciência da Saúde e tecnologias digitais
14h30 – Mesa redonda: Tecnologias digitais e educação em saúde
21/6
8h30 – Mesa redonda: A contribuição da terminologia para a mediação da informação em saúde no Brasil: a atuação do Ministério da Saúde
14h – Mesa redonda: Saúde baseada em evidências, mineração de dados e preservação digital em prontuários do paciente
18h – Conferência de encerramento: Ciencia de la Información y Ciencia de la Comunicación: otro dialogo interdisciplinar
Local: Departamento de Ciências da Informação/UFC
Av. da Universidade 2762, Benfica