Ariel* tem 23 anos e uma cabeça cheia de sonhos, vontades, certezas. Uma delas é a de que é um ser humano agênero e demisexual (pessoa que sente atração sexual pelo outro apenas quando cria vínculos afetivos). Mas nem sempre foi assim. Ele nasceu Gabriela*, cresceu em um ambiente familiar conservador e teve de provar ao mundo que o autismo não seria um obstáculo.
O preconceito fez com que Ariel decidisse esconder sua verdadeira natureza. "É difícil ser trans na sociedade atual. Eu tentava evitar pensar sobre isso. Pesquisando, eu me descobri agênero, pessoa que não é homem e nem mulher." Hoje, o estudante universitário busca, em grupos de apoio na internet, o suporte que não encontrou em casa, principalmente para discutir questões relacionadas à própria sexualidade.
"É preciso que a sociedade pare de tratar a gente como um anjinho, inocente, que não pensa nisso, porque isso prejudica. O autista precisa de educação sexual até para fugir dos abusos que são muito frequentes, principalmente entre mulheres autistas", lembra.
De acordo com o psiquiatra Alexandre de Aquino, pessoas autistas tendem a aceitar com mais respeito as múltiplas orientações sexuais. "Questões como homossexualidade e bissexualidade são tratadas de uma forma muito mais natural, sem preconceitos. Inclusive, muitos autistas se reconhecem com orientação sexual não-heterossexual, mas como homossexuais, bissexuais e, às vezes, assexuais. A frequência disso é maior do que na população em geral", avalia.
Em casos assim, o médico orienta que pais e responsáveis sigam o mesmo protocolo dirigido a adolescentes que não são autistas. Ele lembra que não se trata de doença, perversão sexual ou desvio de caráter. "Pessoas podem apresentar orientação sexual diferente da heterossexual e isso deve ser respeitado", defende.
A neurologista infantil Carolina Figueiredo recomenda que não apenas o adolescente com TEA, mas também os pais tenham acompanhamento psicoterapêutico em casos assim. A criação de um ambiente em que o indivíduo se sinta seguro para falar sobre o assunto é fundamental. "A sexualização é algo que ocorrerá naturalmente, independentemente de sexo, religião, cultura e diagnóstico. Cabe aos cuidadores serem apoio e orientação frente às dificuldades que, inevitavelmente, surgirão." (Nut Pereira)