Gosto de pensar que eu e quem permanece em casa em isolamento social temos as mesmas razões para fazer o que estamos fazendo. Compartilhamos não só o medo, as incertezas, a insegurança, mas também o mesmo intuito de reduzir possíveis danos e promover saúde. Eu, saindo de casa buscando fazer da escuta terapêutica ferramenta para outros caminhos possíveis no processo de adoecer, indo ao encontro dos pacientes oncológicos - estes que, antes da pandemia, já ocupavam leitos de UTI, rodavam dentro do sistema de saúde em busca de tratamento e deparavam-se com a perspectiva de finitude. Você, que fica em casa, buscando diminuir a tal curva que põe pessoas em risco - inclusive e principalmente as que já estão. No que diz respeito à saúde mental, olhar para fora pode ser um bom caminho para olhar para dentro. Em um contexto de incertezas, ouvir histórias, trocar com o mundo, pode ser um meio de elaborar junto à realidade do próximo passo, sabendo, por enquanto, ser impossível traçar uma linha de chegada, a meta final - e tudo bem. É uma situação para qual ninguém está preparado. Yoga, live com seu cantor preferido, aprender uma língua são ótimas maneiras de passar por este período de desarranjo da normalidade, mas não são elas que renovam, a cada dia necessário, sua decisão por permanecer em casa. Não é o prazer individual, é o contexto do coletivo. Por ele ficamos. Só através dele sairemos.
Sarah Monteiro
Psicóloga residente em oncologia