Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
Voltei a postar pássaros no Instagram para tentar voar um pouco. Contentar-me com vida desconhecida desses bichos que ainda insistem com a Cidade. Tenho a ilusão de que são felizes, mesmo que uma Frangolândia corte mais de uma dezena de árvores e enterremos um Pajeú pré-colonial.
Vai ver são menos complicados e desprecisados de terapias ou do cartesianismo de um coaching. É bonito encontrar pelo caminho um surucuá-de-barriga-vermelha. Só em ter sido batizado com este nome (ele nunca soube), penso, é mais leve do que ostentar um Jereissati.
Não é por nada, mas não terá de se preocupar com divisão de herança. Nem perderá momentos bons com os netos porque estava discutindo alianças para ser o próximo presidente do Senado.
E se o Iguatemi não for mais superavitário de que o concorrente RioMar? O surucuá não estará nem aí.
Deve ser bom ser um sucucuá-de-barriga-vermelha, voar. Também deve ter gozo ter encarnado um Jereissati. Só acho que o Surucuá, se o gavião não comê-lo, terá vivido muito melhor que nós.
Um amigo querido disse-se que eu estava muito sisudo na crônica. Ele preferia ler a velha Das Antigas. Atravessada por uma Cidade sem ataques e longe de uma guerrilha de miseráveis abduzidos pelo crime.
Também prefiro os voos mais leves, a vida passeada. O mar e olhar o Mara Hope. Fabular que um dia ele se libertará e novamente se encontrará com baleias. Deve ser infeliz, encalhado ali há tanto tempo.
É verdade, ando reimoso, pouco brincante. Com um sentimento de querer entrar num avião, mas tenho saudades de vésperas. E invento que, um dia, deixo até os amores e me mando quando o Mara Hope desencalhar.
Minha mãe, dona Edmar, começou a querer ser outra pessoa. Não aceita mais ouvir notícias ruins, não quer mais assistir jornal que não lhe projete uma possibilidade.
Sofre da impaciência com notícia ruim, que lhe rouba o juízo. Que apaga as lamparinas e a imobiliza de um jeito que nunca havia visto.
E tão sem ternura, penso logo num psicólogo para ela. Talvez eu é que esteja precisando. Já estou com ele, insistindo comigo. Tentando entender de quais cidades fui embora, quais afetos me encalham.
Acabo de ler que Camilo Santana oferecerá recompensa para quem informar sobre a bandidagem... Até entendo a intenção do governador, o aperreio de querer cuidar dos outros. Mas se embrenhar pelo faroeste é perder prumo do voo.
Vou tentar continuar postando pássaros... Ainda encontrá-los, já é uma recompensa.
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