A fome pôs a mesa ontem, no Palácio da Abolição. E se revelou múltipla, durante a reunião do governador Camilo Santana (PT) com 13 representantes do movimento organizado de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transgêneros (LGBT). O encontro não estava no menu do dia e foi consequência do ato público contra a barbárie transfóbica, que começou na praça Luíza Távora e terminou na porta da sede do Governo estadual, perto do meio-dia. Justo na hora do almoço.
[SAIBAMAIS]
Ainda que não tivesse planejado receber o grupo, Camilo Santana foi um anfitrião pródigo. Depois de ouvir as reivindicações de todos os representantes, o governador se comprometeu a atender de pronto a três das quatro principais solicitações. Autorizou a elaboração do Plano Estadual de Políticas Públicas Para a População LGBT, a constituição do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos LGBT e o estabelecimento de um centro de referência para dar assistência jurídica e psicossocial às vítimas de LGBTfobia.
Este último ponto gerou o mais apimentado debate do encontro, porque colocou em lados opostos Élcio Batista, chefe do gabinete do governador, e a
militância LGBT.
Batista defendia que o Centro de Referência em Direitos Humanos do Ceará, já em funcionamento, pode atender a esta demanda da comunidade LGBT. Os militantes insistiram na necessidade de um centro de referência específico. “Se o Centro de Direitos Humanos atendesse esta demanda geral não haveria necessidade da Casa da Mulher Brasileira, muito menos de uma coordenadoria especial para políticas públicas para LGBT no Governo”, pontuou Samilla Marques, representante no Ceará da Rede Trans Brasil. “Segmentos específicos requerem políticas específicas”, reforçou.
Na queda de braço com o homem forte do governador, gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros venceram e Camilo anunciou a criação de um centro próprio para esta comunidade. “Questão resolvida. Eu estou morrendo de fome, vocês não estão? Já mandei preparar um almoço para vocês, porque a fome está grande e ninguém pensa direito com barriga vazia. Posso mandar servir?”, perguntou Camilo.
Ambulatório
Mas a fome orgânica do mais alto executivo do Estado teve que esperar que outra fome, a das reivindicações do movimento LGBT, roncasse mais uma vez na sala de reunião. Faltava a resposta a uma das mais emblemáticas lutas deste segmento: a implementação de um ambulatório transexualizador no Ceará.
Feito o apelo, Camilo garantiu que articulará, junto à Secretaria da Saúde (Sesa), a vinda de um desses equipamentos para o Estado. Compromisso assumido, fome de reivindicações saciada, o almoço pôde, então, ser servido.
Bastidores
O jornalista Caco Barcelos (TV Globo) cobriu o ato e a reunião no Palácio para o programa Profissão Repórter. A presença dele causou verdadeiro frisson e disputa pelos holofotes globais.
Participaram da reunião a vereadora Larissa Gaspar (PPL), o chefe de gabinete Élcio Batista, a vice-governadora Izolda Cela, o secretário da Cultura, Fabiano Piúba, o secretário da Segurança Pública, André Costa, e o coordenador de Políticas Públicas para LGBT, Narciso Junior.
Saiba mais
Conforme O POVO publicou ontem, a Polícia Civil apurou que Dandara foi morta após moradores seguirem falso alerta de que a travesti estaria praticando roubos. Conforme a delegada Arlete Silveira, a informação era falsa e teria servido para incitar a violência.
A delegada disse a investigação continua, pois as condutas dos suspeitos serão individualizadas. Quatro adolescentes estão apreendidos e três adultos presos no 12º DP. Para Arlete, é clara a conotação transfóbica na ação, pois a todo o momento a vítima era humilhada pela condição de travesti.