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73% dos assassinatos de pessoas trans no Estado não geraram denúncia
Cotidiano

73% dos assassinatos de pessoas trans no Estado não geraram denúncia

|INSEGURANÇA| Dossiê elaborado por movimentos sociais traz dados inéditos sobre violências LGBTQIA+fóbicas e cobra políticas públicas para essa população
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DIVULGAÇÃO do dossiê ocorreu na Assembleia Legislativa  (Foto: Lucas Barbosa)
Foto: Lucas Barbosa DIVULGAÇÃO do dossiê ocorreu na Assembleia Legislativa

Dos 26 casos de travestis e transexuais mortos e mortas no Estado em 2020 e 2021, 73,07% dos inquéritos instaurados não geraram denúncias, sendo que apenas 26,92% das investigações foram concluídas. Apesar de 88,46% dos casos terem sido tipificado como homicídio doloso (contra apenas 3,85% de latrocínios), em apenas um desses casos houve a menção a crime de ódio na denúncia ofertada à Justiça.

Essas são apenas algumas das informações levantadas em um dossiê elaborado pela Associação de Travestis e Mulheres Transexuais do Ceará (Atrac) em parceria com diversos movimentos sociais e a Defensoria Pública. A pesquisa foi divulgada na tarde de ontem em evento realizado na Assembleia Legislativa do Estado.

O dossiê e o evento ocorrem no contexto do mês de enfrentamento à LGBTQIA+fobia — na próxima terça-feira, 17, é celebrado o Dia Internacional contra a Homofobia, a Transfobia e a Bifobia. Além da divulgação do dossiê, o evento também abordou a necessidade de políticas públicas de saúde específicas para a população trans. E também fez o lançamento das atividades que ocorrerão em todo o Estado em alusão ao mês de luta contra LGBTQIfobias.

Conforme André Marinho, integrante do Fórum Cearense LGBT e um dos pesquisadores responsáveis pelo dossiê, o levantamento tem entre as motivações rebater a negativa do poder público de que não existem casos de assassinatos por LGBTQIA+ no Estado. Conforme a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), em nenhuma das investigações de crimes contra pessoas trans em 2020 e 2021 a Polícia Civil identificou crime de ódio.

Lacunas na legislação

Além disso, o dossiê também se propõe a apontar as lacunas da Legislação brasileira para combater violências LGBTIfóbicas, assim como o despreparo técnico dos servidores dos órgãos de segurança e justiça para identificar tais violações. "Quando a gente invibiliza a violência contra LGBTs e o assassinato dessa população, a gente também impede que seja notória a necessidade de construção de políticas públicas", disse Marinho em sua fala.

Para a presidenta da Atrac, Andrea Rossati, ocasiões como essas do evento são importantes para instar o Poder Público a pensar e construir políticas de segurança que possam contribuir para a erradicação de violações de direitos de pessoas LGBTQIA+.

"Esse dossiê vem ratificar vários outros dossiês que foram lançados durante o decorrer deste ano, como o dossiê da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), do GGB (Grupo Gay da Bahia), como várias outras fontes de pesquisa que colocam o Ceará como o estado que mais mata pessoas LGBTQIA+ no Nordeste".

Caso Soraya

Entre os casos destacados pelos pesquisadores está o assassinato de Soraya de Oliveira Santiago, morta a tiros ao lado de Francisco Ediberto dos Santos Brasileiro em 12 de julho de 2020 nas proximidades da Lagoa da Maraponga. Conforme a investigação, o caso ocorreu no contexto da disputa entre facções criminosas — quatro acusados de integrar a facção Guardiões do Estado foram pronunciados pelo crime.

Rossati lembra de Soraya como uma cabeleireira de excelência, "uma mulher responsável, de vida social, conhecida por várias de nós". Para ela, é "bem mais fácil" relacionar casos assim com sendo motivadas por conflito entre as facções, pois acaba gerando uma "justificativa" para o assassinato e a transfobia.

Por fim, o dossiê ainda fez uma série de recomendações ao Poder Público, entre eles a criação da Delegacia Especializada em Crimes Raciais e de Intolerância.

 

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LGBTQIA+ foram mortos no CE de 2016 a 2021, conforme o Grupo Gay da Bahia

FATOS SOBRE LGBTQIA

— 73% de 1016 estudantes ouvidos em pesquisa de 2016 da ABGLT afirmou ter sofrido agressões por serem LGBTQIA

— 64% de todos os LGBTQIA mortos em 2017 eram pessoas trans, sendo 69% negros e 70% tinha até 34 anos

—72% das pessoas trans não têm ensino médio e apenas 0,02% estão na Universidade

Fonte: Dossiês dos Assassinatos Violentos do Ceará 2017-2021, elaborado pela Atrac

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