A adolescência é uma época da vida que gera desconfortos para a maioria das pessoas. Mudanças corporais, desenvolvimento da identidade, socialização com pares são alguns dos aspectos que podem causar dúvidas e conflitos. Para pessoas no espectro autista, a fase também pode ser conturbada e tem particularidades.
O início do 1º ano do ensino médio de Amanda Gabrielle Campos Cabral, 15, coincidiu com o período de descoberta do autismo. “Eu olhava ao meu redor e pensava ‘cara, todo mundo vai me achar estranha’. Porque eu já sabia que a galera tinha um pouco de preconceito”, conta. O medo do julgamento fez com que o diagnóstico fosse dividido com poucos colegas na escola de ensino fundamental em que estudava até 2022.
Agora cursando o ensino médio em uma escola profissionalizante, pouco a pouco Gabrielle busca fazer novos amigos. “É muito difícil para socializar. Eu sempre tenho na cabeça que as pessoas não gostam de mim. Desde que eu tinha uns sete anos já tinham implicância comigo e comecei a ter várias inseguranças”, relembra. Apesar de já ter o entendimento de que se relacionava de uma forma diferente com o mundo, fazer amizades na infância era mais fácil para a jovem.
A psicoterapeuta infantojuvenil Anna Beatriz Gomes explica que pessoas no espectro autista têm experiências muito diversas durante o período, algumas com mais ou menos dificuldade de socializar. A necessidade de se encaixar em grupos e procurar entender melhor a identidade como indivíduo é uma parte importante da adolescência que pode ser complexa para autistas.
“Muitas vezes não vai ser compreendida a necessidade de um grupo, não vão se identificar com um grupo específico. A pessoa autista pode ter essa dificuldade de se vincular, de se perceber, de identificar o que quer e o que não quer”, afirma a profissional.
Também é no momento da adolescência que pessoas autistas podem começar a perceber como é ser neurodivergente dentro da sociedade. “É muito importante que essa identidade seja colocada, que estimule a se auto perceber como pessoa autista”, diz Beatriz. Para ela, isso influencia até mesmo na luta por direitos, que ainda hoje é mais protagonizada por familiares e profissionais da saúde do que pelas próprias pessoas que estão no espectro.
Por isso, trabalhar a aceitação do diagnóstico é uma das formas de ajudar o adolescente autista a lidar com a diversidade de maneiras de existir no mundo. “Também não é porque você é diferente que as pessoas podem te julgar, que você tem que se julgar. Ser diferente é bom”, afirma Gabrielle.
A psicóloga relata que o contexto da internet atualmente permite que os adolescentes tenham mais informações sobre questões de saúde mental, dando mais oportunidades para que a pessoa entenda sinais de autismo, de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), sintomas de ansiedade, entre outros. Com isso, também se tornou mais comum partir dos próprios jovens a busca por suporte psicológico.
“Quando a gente percebe que é diferente, muitas vezes pode assustar. Contudo, se a gente observa que a pessoa se percebe diferente e se aceita, a família fomenta isso e ela está num contexto favorável para se compreender como uma pessoa autista, vai trazer muitos benefícios para a questão da autoestima”, diz Beatriz. Sem a ajuda psicológica e emocional necessária, algumas pessoas neurodivergentes podem ter mais dificuldade de se aceitar e desenvolver comorbidades, como ansiedade e depressão.
Procura por pessoas parecidas
Foi só na faculdade que Carolina de Souza Ribeiro, 19, conseguiu encontrar pessoas com os mesmos gostos que ela, como games e animes. A estudante do terceiro semestre de Ciências da Computação na Unifor recebeu o diagnóstico de autismo aos 10 anos. "Infelizmente, eu nunca tive muita gente no meio real que compartilhasse a maioria dos meus interesses", conta. Na adolescência, socializar não era tão simples e Carolina procurou fazer amigos fora da escola, pela internet.
Gabrielle também procurou na internet pessoas que gostassem tanto de Kpop quanto ela, mas que também fossem autistas. Ela chegou a entrar em uma comunidade do aplicativo de mensagens Discord para tentar socializar. "Eu pensei 'vai que eu encontro alguém, um grupo para eu me entender melhor'. Mas o grupo não me respondia. Eu precisava achar alguém igual a mim, mas acabou que não achei. Acho que vai ser bem difícil", diz a adolescente.
"É aquela coisa de todo jovem. A nossa forma de buscar por amigos é naturalmente por identificação. Eu observo que meus pacientes autistas se identificam mais com pessoas que também são neurodiversas", afirma a psicóloga.