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Em par com a ideia de uma boa morte que cada ser humano tem, a medicina foi se aprimorando em conhecimentos e aparatos que possam dar suporte tanto à vida quanto à morte. Também as diferentes culturas guardam preceitos e rituais que tornam mais sereno ou mais desafiador o morrer. “Cada cultura tem uma compreensão do transcendente”, reconhece a médica neonatologista Eliane Oliveira.
Houve um tempo em que era comum morrer cedo, em casa, sob a mediação de uma religião, restaura o psicólogo Erasmo Ruiz. Além disso, ele observa, “morrer com dor era a coisa mais natural do mundo”. Com as duas Grandes Guerras, na primeira metade do século XX, demarca Ruiz, as tecnologias de suporte de vida
se desenvolvem.
A ideia de uma boa morte se expande quando o aparato hospitalar já pode elastecer o tempo de vida de alguém. É o que a medicina chama de “distanásia”: se esgarça a vida, mas sem contrapartida de cura, definem os especialistas nesta reportagem. Para Ruiz, foi quando nos desacostumamos com a morte e desenvolvemos uma “mentalidade salvívica: temos que fazer tudo para salvar vidas. Só que chega um momento em que não dá mais para salvar”.
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É neste momento que a eutanásia pode adiantar a morte, escolhem algumas pessoas, ou que os cuidados paliativos (tecnicamente, chamados de “ortotanásia”), defendem outras, atuam no controle do sofrimento, sem apressar ou retardar o fim. “Nossos esforços devem ser dirigidos no sentido de promover e priorizar o seu conforto (do paciente), diminuir o seu sofrimento e evitar o prolongamento de sua vida a qualquer custo”, esclarece, em entrevista por e-mail, a enfermeira e professora Angela Maria Alves e Souza, coordenadora do Projeto Integrado de Pesquisa e Extensão em Perdas, Lutos e Separação (UFC).
“Devemos integrar acompanhamento amoroso e de qualidade com equipe interdisciplinar para implementar um plano terapêutico, no qual a pessoa que está morrendo possa ter interferência sobre seu morrer”, sublinha. Nesse sentido, os cuidados paliativos se iniciam ao tempo de um diagnóstico irreversível e podem se estender até o luto, amparando os que ficam. “Para a dor biológica, hoje, temos remédios. E não é para ninguém morrer sentindo dor, é direito da pessoa não sentir dor. E temos como aliviar o sofrimento espiritual, ou através da religiosidade, ou de alguma forma que contemple a demanda desse sujeito”, conclui a médica Eliane Oliveira. (Ana Mary C. Cavalcante)
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A lei e o direito de escolher
A reformulação do Código Penal Brasileiro, que tramita no Legislativo desde 2012, deve considerar a eutanásia como crime específico e com pena entre dois a quatro anos de prisão, podendo haver casos de perdão judicial (artigo 122): “Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença”.
Atualmente, até que se altere a legislação de 1940, a prática não tem tipificação e é considerada homicídio.
No mundo, os países que regulamentaram a eutanásia ou o suicídio assistido são: Holanda, Bélgica, Suíça, Luxemburgo, Alemanha, Colômbia e Canadá. Também em alguns estados norte-americanos – Oregon, Washington, Vermont, Montana -, a morte é marcada por meios legais. As leis se assemelham em certas condições: é preciso sofrer uma doença terminal ou irreversível, sem perspectivas de melhora do sofrimento, e o doente deve expressar, voluntária e reiteradamente, o desejo de morrer. Os casos são acompanhados e chancelados por dois ou mais médicos. (AMCC)