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A cada novo lançamento, o cineasta Halder Gomes quebra os próprios recordes. Do fenômeno Cine Holliúdy (2013) ao crescimento com O Shaolin do Sertão (2016), o diretor chegou com Os Parças (2017) a uma marca inédita: o longa, que tem o youtuber Whindersson Nunes e os humoristas Tom Cavalcante e Tirullipa no elenco, passou de 1 milhão de espectadores. Em um ano em que somente outros dois filmes nacionais obtiveram o mesmo êxito (Polícia Federal e D.P.A. Detetives do Prédio Azul – O filme), o sucesso ressalta a potência que Halder representa no cinema brasileiro.
OPOVO - Três longas brasileiros ultrapassaram 1 milhão de espectadores em 2017. Entre eles, Os Parças foi a única comédia.
Como você encara esse decréscimo na bilheteria de filmes nacionais?
E em relação à queda no sucesso do gênero, qual sua avaliação?
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Halder Gomes - É uma questão econômica. Quando se tem certa queda na renda, você começa a cortar o orçamento e o entretenimento é o primeiro a sair. Se você via uma quantidade de filmes por ano, vai ter que reduzir e priorizar. Normalmente, essa prioridade é voltada para a produção hollywoodiana, que têm milhões de dólares de orçamento e marketing, um apelo muito forte.
O ingresso custa o mesmo preço de um filme nacional e, no inconsciente, o espectador tenta alocar o investimento dele naquilo que acha que dá maior retorno de entretenimento, que seriam filmes de uma Marvel, uma DC (produtoras de filmes de super-heróis como Os Vingadores e Mulher-Maravilha). Tanto é que essas produções continuam cruzando a casa dos 5 milhões. Sobre a comédia, aí vem outra camada além da questão econômica. O cinema brasileiro, para conseguir ser expressivo, precisa encontrar identificação. Num ano em que as pessoas tiveram que pensar o que fazer com os recursos, você só tem chance de competir se tiver essa identificação muito forte. No caso de Os Parças, havia algo muito forte com o público que era a identificação pela amizade e, também, pela questão do empreendedorismo do nordestino. A maior bilheteria do filme acabou sendo no Nordeste. Foi um sentimento de pertencimento, porque as pessoas se viram nele e, assim, ele conseguiu transpor a questão de ser um mero entretenimento para ser um filme com camadas além da comédia em si.
OP - Como o filme está de bilheteria agora?
Halder - A gente está, hoje, com aproximadamente 1.240.000 espectadores. Já é a segunda bilheteria do ano e certamente vai chegar a ser a maior. Polícia Federal, que está em primeiro, fechou com mais ou menos 1.370.000 espectadores. Alguns dados interessantes colocam Os Parças na condição de fenômeno, não apenas de sucesso: nós abrimos em 250 salas e, na quarta semana, tínhamos 340. É uma curva inversa que raramente acontece no mercado. Ficamos, em números absolutos, por quatro semanas nos quatro filmes mais vistos do País deixando para trás filmes grandes como Assassinato no Expresso Oriente, Jogos Mortais e outras produções hollywoodianas. No Nordeste, somos até então a bilheteria número um em números absolutos, mesmo levando em consideração Liga da Justiça, Thor, esses blockbusters.
OP - Na lista do Observatório Brasileiro do Cinema e Audiovisual (da Agência Nacional do Cinema) que elenca os filmes nacionais com mais de 500 mil espectadores lançados de 1970 até 2016, aparecem As Mães de Chico Xavier (2011, co-dirigido por Halder Gomes e Glauber Filho, em 480º lugar) e O Shaolin do Sertão (2016, 402º lugar). Sâo filmes que fazem parte de um pequeno grupo que não pertence ao eixo Rio-São Paulo...
Halder - O Cine Holliúdy (2012) encostou nesses 500 mil também, por alguns poucos ingressos não entrou na lista aí (risos).
OP - O que esses dados significam para o cinema cearense?
Halder - Acima de tudo, é uma quebra de paradigmas. É a prova de que é possível empreender e disputar mercado com Hollywood. É bacana poder ver que a nossa produção marcou um território e fidelizou uma plateia. O mais importante é a fidelização. Essa estatística representa um olhar transformador de algo que pode ser a ponta de um iceberg de uma grande transformação, de uma descentralização não só da produção, mas também da fidelização de público ao conteúdo produzido. De certa forma, tudo isso volta para a nossa economia em forma de investimentos que fomentam a nossa indústria, que fazem com que nossos profissionais possam se lapidar. Tenho a preocupação de que isso tudo possa voltar para a nossa economia criativa. Os números me ajudam a capitalizar projetos lá fora, trazer esses recursos para o Ceará e, daqui, a gente exporta um conteúdo nosso feito com dinheiro de fora. Isso me motiva bastante.
OP - Ajudou ter feito um filme que se passa em São Paulo e com nomes nacionalmente conhecidos no elenco?
Halder - Ah, ajuda! Eu considero uma progressão. O Cine Holliúdy encontrou um público que se mostrou fiel, ali na casa dos 500 mil espectadores e isso já é um achado no cinema nacional. O Shaolin do Sertão ampliou esse horizonte em quase 150 mil ingressos. Os Parças manteve a qualidade e a consistência e trouxe nomes fortes, principalmente da Internet, como o Whindersson e o Tirullipa. É a soma do legado que os filmes anteriores plantaram agregado ao capital muito forte que os meninos têm. Mas esse capital só é válido se o filme for bom, essa foi até a primeira conversa que eu tive com eles. A mídia de Internet tem grande potencial, mas não vale nada se o filme não funcionar. A prova disso foram os outros filmes que tiveram youtubers, todos “floparam” (termo comum nas redes sociais, usado quando algo ou alguém não obteve sucesso) porque esqueceram que o mais importante é a história que você vai contar, senão você só tem fôlego para o primeiro dia. Os Parças teve fôlego, entra na quinta semana com 170 salas e está prestes a ser a bilheteria do ano. Foi uma soma de fatores que fez com que ele fosse
muito além.
OP - Quebrar os próprios recordes é uma meta, uma preocupação, ou simplesmente acontece?
Halder - Eu não estabeleço nada como meta. Meu compromisso é fazer o melhor possível pelo filme. Os resultados vêm como consequência do trabalho. Esses recordes são interessantes porque viabilizam outros projetos, no olhar do mercado, das majors (grandes estúdios e distribuidoras), impõe respeito. Aqui no Ceará e em alguns lugares do Nordeste, temos o peso da Marvel ou da DC, só que ainda maior, pois fazemos números maiores do que os delas.
Isso bate lá nos investidores, eles sabem que é raro de acontecer e isso faz com que tenham interesse em se aliar para desenvolver projetos. Os Parças, por exemplo, é um projeto com a Fox , Cine Holliúdy 2 (que estreia em maio) e O Shaolin do Sertão 2 têm parceria com a Paramount. Estamos fazendo a série Cine Holliúdy para a Globo, começo em janeiro a desenvolver o projeto e escrever o roteiro da continuação de Shaolin. Também em janeiro, lançamos o show do Edmilson Filho, Nota – Uma Comédia de Relacionamentos, que a gente fez para a Netflix, e temos o projeto em desenvolvimento de uma comédia romântica, Bem-Vindo à Quixeramobim. Os Parças 2 já teve o sinal verde para ser desenvolvido e ainda temos outros, mas só quero falar quando a bola estiver na marca do pênalti. Até 2023 eu tô até o pescoço, graças a Deus.