[FOTO1]
Teve um tempo, isso é pura impressão, que a maior parte dos adolescentes de Fortaleza eram feios que doíam. Talvez a imposição de que brancos, loiros e olhos claros do Sul e Sudeste eram o padrão de beleza que o Brasil todo deveria se desenhar.
Na contramão da lorota de que brasileiro, de modo geral, nunca foi nazista nem racista, tampouco machista nem homofóbico... quem não rebentava no Rio, São Paulo, Rio Grande do Sul sempre foi o cabocal do Brasil profundo. Brotado no resto de País.
Rebotalho da mistura de pobres, índios, pretos, retirantes, paraíbas, nortistas e infelizes por não terem sido invadidos, até o talo, por europeus. Ali, sim, sangue bom de cruzar. Ainda há o ranço, a diferença é que aprendemos dar cotoco pra eles.
Talvez nossa autoestima, às vezes ainda às avessas, tenha mudado. Por causa de mil variáveis e a besta fera da Internet.
O preconceito enrustido teria ganhado outra máscara. Tanto que minha geração, ou a dos que têm de 30 anos pra cima, acha bonito o que antes era feio no espelho.
Canso de ouvir que os adolescentes e jovens de hoje são muito mais bonitos do que os garotos e garotas dos anos 70, 80 e 90. Não acho, não. Por um tempo alimentei esse trauma de cachorro pé duro.
Devem ter se alimentado melhor que nós. Se penteado mais. Tiveram mais horas de médico. Entraram mais nas universidades. Tiveram pais mais endinheirados. Viajaram mais... Isso também dá boniteza para além dos padrões.
Ou nada disso tem sentido e a revolução dos shoppings centers é que nos padronizou mais ainda? Pode ser. Loiras bombadas, peitudas e chapinhas inteligentes para esconder o pixaim. Rapazes e meninos arrochados na maromba, cabelo no estilo...
Nunca deixamos de ter medo do crespo, da pele negra no nascimento, do sotaque não cantado ou do sufixo que não produzisse a chiadeira carioca ou “o” acentuado da “bolacha” paulista.
O shopping sofisticado é território estrangeiro dentro da própria Cidade. Espaço protegido do terror da feiura, uma espécie de embaixada dos bem parecidos. É até Fortaleza ou Sobral, terá algum traço. Porém é mais qualquer lugar do que aqui.
Última vez que fui a Sobral, fiquei em um hotel dentro do primeiro shopping do município do Norte cearense. Na desculpa de que o calor estava infernal, pouco fui ver o movimento lá fora. A não ser nos compromissos e almoços.
No shopping de lá, a percepção era de que não estava em Sobral. Muita loira e alisada na progressiva, morena embranquecida, marmanjos com lentes verdes, azuis...
Não sou contra se enfeitar, ficar bonito pra se mostrar. É só uma inquietação do olhar.
Noutro dia, me assustei quando uma amiga me disse que eu era preto. Ou quando o flanelinha perguntou se eu era o motorista da loira, minha companheira branca.
É que fui “pardo” por muito tempo. Uma desculpa pra negar o negro-índio-caboclo. E que era feio, nos anos 70 e 80, porque não nasci (ou “naisci”) na Cidade Maravilhosa...