Todo início de ano um ritual se repete para muitos cinéfilos: assistir a lista de filmes indicados ao Oscar. Começa então a temporada de palpites, as discussões sobre os favoritos, os pitacos sobre as categorias, as especulações sobre possíveis vencedores. Muitos não sabem que o caminho que as produções percorrem para estar ali é longo e cheio de nuances que passam longe do olhar de um expectador comum.
Alheios a esses bastidores, muitos acusam a premiação de ser uma festa comprada, já que não entendem como teoricamente funciona a votação para os indicados e, principalmente, para os vencedores. Para começar, a Academia, que conta atualmente com um grupo de mais de seis mil profissionais da sétima arte, tem como intuito promover aqueles que honraram o cinema no ano que se passou. Os votantes da Academia são separados em Sindicatos, o que garante que cada grupo ofereça o prêmio para categorias específicas. Os grupos incluem diretores, produtores, editores, maquiadores, escritores, técnicos de som e de efeitos visuais, atores etc. Um exemplo: o SAG, o sindicato dos atores, premiou Gary Oldman por seu trabalho em O Destino de uma Nação, e a atriz Frances McDormand como melhor atriz em Três Anúncios para um Crime. Já é quase certa a vitória de ambos na cerimônia de hoje à noite.
[SAIBAMAIS]Para o jornalista e crítico de cinema Arthur Gadelha, ainda há outro elemento, pouco discutido, que precisa de total atenção: muitos votantes levam em conta o que está sendo comentado na mídia e nas redes sociais sobre as produções, e ficam atentos com o que os filmes têm a dizer. “Oscar é política. Ano passado Moonlight – Sob a Luz do Luar venceu. Era um ano após o Oscar “So White”, que premiava só astros brancos. Para se diferenciar, eles garantiram o prêmio para um filme de temática negra. Esse ano, a tendência são os filmes com mulheres fortes. Não à toa os dois mais cotados para vencer são A Forma da Água e Três Anúncios Para um Crime, protagonizados por heroínas determinadas”, contextualiza.
Outro exemplo é o filme Trama Fantasma, que fez o seu marketing baseado na aposentadoria de Daniel Day-Lewis, que já coleciona três prêmios de Melhor Ator. “Trama Fantasma é o último trabalho desse ator. Convenientemente, o filme se apoiou nessa imagem. Se Daniel não fosse tão querido da Indústria, talvez o filme não tivesse tantas indicações. E se o filme for baseado em fatos reais, melhor ainda, já que exalta uma pessoa forte e um ator que se doou para viver essa pessoa”, diz o crítico.
[QUOTE1]O também crítico de cinema e professor Ailton Monteiro destaca que devemos observar a campanha do filme. “Se um ator ganhar esses prêmios no sindicato, provavelmente, ele vai vencer o Oscar. Mas não é só isso. O filme passa por uma longa estrada para receber as indicações e vencer”.
Siga a crítica
OS CRÍTICOS de cinema possuem um dever aqui muito importante. Considerando que o filme precisa ficar semanas em exibição, sem interrupções, seus produtores precisam garantir mais dinheiro para fazer ele durar. É o apoio dos críticos que muitas vezes garante que eles fiquem mais tempo em tela, como aconteceu com Corra!, que no último ano estreou em abril nos Estados Unidos e, meses depois, voltou para os cinemas, em novembro. O mesmo para Dunkirk, que estreou em julho e ficou até novembro nos Estados Unidos, quase seis meses de exibição. Os dois estão concorrendo ao Oscar. Historicamente, a opinião da crítica garantiu vários prêmios, como aconteceu com Poderoso Chefão (1972) e Rocky, Um Lutador (1976), que ganharam forças graças aos textos das revistas de cinema da época.
Em 2018, as opiniões ajudaram outros filmes, como, por exemplo, Lady Bird: A Hora de Voar (foto), que, ao estrear nos cinemas, recebeu 100% de aprovação no site Rotten Tomatos, que acumula críticas dos especialistas.
O melhor momento
EXISTE UMA teoria de que grande maioria dos votantes da Academia é de idosos. Muitos deles participam das votações desde a década de 1970, por exemplo. Sabendo disso, as distribuidoras deixam para lançar os filmes semanas antes deles começarem a escolher seus favoritos, por volta dos meses de novembro e dezembro. O que as distribuidoras acreditam é que como os votantes assistem a mais de cinco mil filmes por ano, os que são vistos por último tendem a ficar mais presentes em suas memórias. Foi o que aconteceu com Trama Fantasma e A Forma da Água.
Gaste pouco
UMA TENDÊNCIA que vem se popularizado é a de premiar filmes que gastaram pouco em seu orçamento. Os últimos quatro ganhadores mostram isso. Moonlight – Sob a Luz do Luar (2017) custou cinco milhões de dólares; Spotlight – Segredos Revelados (2016) custou 20 milhões; Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) (2015) e 12 Anos de Escravidão (2014) custaram 18 milhões. A Forma da Água, provável vencedor deste ano, também custou 18 milhões. O segundo grande destaque do ano, Três Anúncios Para um Crime está estimado em 12 milhões, um custo “pequeno” se comparado a outras produções.
O último “blockbuster” a levar a estatueta foi O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei. Com produção que custou 95 milhões de dólares, o longa foi grande vencedor em 2004.