O engenheiro mecânico Jean Carlos Pejo tem vasta experiência profissional quando o assunto é ferrovia e transporte de carga. Mas, à frente da Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional, sua prioridade deve ser invertida. O transporte ativo, a exemplo de caminhadas e pedaladas, precisa ser mais importante do que o transporte motorizado. Modos coletivos precisam receber mais incentivos do que os modos individuais. E a segurança das pessoas nesse ir e vir precisa ter mais peso do que todo o resto.
Por isso, convidado para expor seu projeto de governo no Mobilize Summit — evento internacional de mobilidade sustentável ocorrido em Fortaleza no fim do mês passado —, Pejo adotou a postura de gestor que se dispõe a aprender com especialistas. No entanto, apesar de ter um plano em mente (cidades compactas, resilientes e inclusivas), deve ainda aprimorar a execução dessas ideias e compreender de que forma a mobilidade urbana deve se atrelar a outras áreas do conhecimento para garantir que as cidades sejam mais saudáveis.
Em entrevista exclusiva ao O POVO, ele falou sobre as prioridades da gestão Jair Bolsonaro para o Brasil no âmbito da mobilidade, destacou a necessidade de integração intermodal e disse como o transporte ferroviário, sua especialidade, se insere nesse contexto.
O POVO - Quais são as prioridades deste Governo no que diz respeito à mobilidade urbana?
Jean Carlos Pejo - É uma obsessão nossa, na Secretaria (Nacional de Mobilidade), ter empreendimentos de mobilidade urbana que estejam diretamente associados à inclusão social. O tema principal é levar mobilidade incluindo as pessoas e dando qualidade de vida pra elas.
OP - Como o senhor pretende fazer essa inclusão?
Jean Pejo - Não é efeito único da mobilidade, mas a mobilidade tem, sim, uma participação importante (na inclusão social), que é a de tornar as pessoas em condições de ter acessibilidade a todos os meios que precisam: creche, ambulatórios, hospitais, armazéns, centros de lazer, supermercados, enfim, que dão qualidade de vida. Como a gente pode prover essas condições? Incluindo, no desenvolvimento de empreendimentos da área de mobilidade, junto a estações, por exemplo, de metrô e de sistemas de BRT, centros de lazer para crianças e conjuntos poliesportivos, de tal forma que a mobilidade atraia as pessoas a praticarem esporte e terem lazer.
OP - O senhor diz no sentido de desenvolver as cidades orientadas pelo trânsito (transporte)?
Jean Pejo - O sistema de mobilidade vai orientar o desenvolvimento. O desenvolvimento é muito importante porque você pode dar condições, inclusive, de geração de riqueza. Mas, não podemos perder de vista a importância de trazer a inclusão social. Então, o sistema de mobilidade urbana pode ser, sim, indutor de crescimento.
OP - E o senhor acredita que essa proposta de inclusão social somada ao Projeto de Lei entregue em junho pelo presidente Jair Bolsonaro à Câmara está alinhada às estratégias de mobilidade e segurança viária que vêm sendo desenvolvidas por cidades como Fortaleza?
Jean Pejo - Isso tudo é fundamental. Temos que ter uma coragem muito grande de começar a desincentivar o uso do automóvel nas grandes cidades. O automóvel ficar mais pra uso de lazer, pra longas distâncias, mas, pro dia a dia, ser utilizado o transporte coletivo. Claro que, pra isso, temos que ter uma estrutura de transporte coletivo que tenha condições de atrair as pessoas pra que elas deixem seus automóveis em casa ou em estacionamentos. É fundamental. Não adianta o grande esforço de colocar ônibus elétrico, trem elétrico, e o carro continuar poluindo como polui as cidades.
OP - Mas, nesse projeto (presidencial), a questão do automóvel privado está muito em evidência. Tem a história da cadeirinha, a (redução da) penalidade pro uso incorreto do capacete. Pontos que preocupam especialistas em segurança viária. Essas propostas não estão na contramão do que o senhor aponta?
Jean Pejo - Não. Acho o seguinte: o importante pra nós é que, dentro da política nacional de mobilidade urbana, os primeiros a receberem as melhores condições são os pedestres. Em seguida, vem o transporte não motorizado através das bicicletas e faixas seguras. Segurança em todo sentido: da pessoa, na integridade da pessoa, e, também, do trânsito. Em seguida, os sistemas de transporte coletivo, não poluentes, seja ferroviário ou em equipamento sobre pneu. Sistemas de transporte coletivo, mesmo que continuem com combustíveis derivados de petróleo, também são muito mais importantes do que o automóvel circulando nas cidades. Daí, sim, vem o automóvel.
OP - Aprendemos, em Fortaleza, que a qualidade das estatísticas de mobilidade resulta em estratégias mais acertadas. O Governo Federal pretende, também, a nível nacional, desenvolver sistemas mais sofisticados de coleta dessas evidências?
Jean Pejo - O que a gente pretende fazer e é por isso que estou sempre em contato com as prefeituras, viajando bastante, seguindo a orientação do próprio presidente de "Mais Brasil e menos Brasília", é distribuir para o País como um todo as boas ações que estão sendo praticadas. Então, sem dúvida nenhuma, em Fortaleza existe uma preocupação muito grande no ambiente da mobilidade. Muito tem sido feito. Isso, sem dúvida, vamos estar levando a nível nacional.
OP - Outra questão que o senhor comenta como prioridade é o desenvolvimento do transporte ferroviário. Mas já existe o projeto da Transnordestina, por exemplo, se arrastando há anos. Como esse atual Governo pretende impulsionar a mobilidade sobre trilhos?
Jean Pejo - Estamos tendo um entendimento direto junto ao Ministério da Infraestrutura com relação ao aproveitamento das linhas (ferroviárias) que serão devolvidas pra União e retrabalhadas. Talvez, até, com aquele PL (Projeto de Lei) 261, que dá uma facilitação maior no uso da infraestrutura ferroviária e, também, na questão da construção dos contornos. Existe, dentro do programa da renovação das concessões, a obrigatoriedade da construção de retornos pra que as ferrovias que hoje operam com trens de alta capacidade fiquem distantes das cidades. Mas as ferrovias e as cidades se desenvolveram praticamente juntas e isso também é objeto de trabalho nosso.
OP - O senhor também defende a mobilidade sobre trilhos no sentido de transporte de passageiros. Mas, aqui em Fortaleza, esse meio de transporte ainda é pouco utilizado. Como impulsionar esse desenvolvimento?
Jean Pejo - Com relação ao Metrofor (Metrô de Fortaleza), tenho agenda pra acompanhar as obras de conclusão da Linha Sul e o início das obras da Linha Leste. As ferrovias de grande distância estão no âmbito do Ministério da Infraestrutura, não estão dentro do ambiente do Ministério do Desenvolvimento Regional, que é onde está nossa Secretaria, mas temos conversado bastante.
OP - Quais, na sua perspectiva, são os rumos da mobilidade no Brasil?
Jean Pejo - Por uma questão de necessidade, é a integração cada vez maior. É nosso trabalho, nosso em termos de Governo Federal, dos governos estaduais e, especialmente, das prefeituras, que estão na linha de frente do desenvolvimento e da execução dessas políticas, tornar as cidades cada vez mais resilientes, cada vez mais compactas e cada vez mais inclusivas. Essas três condições é que vão determinar as políticas do futuro. Porque, além de tudo isso, temos uma responsabilidade muito grande com o meio ambiente. Foi dito aqui que, no mundo, 54% das pessoas vivem nos municípios. Aqui, no brasil, é diferente. Aqui, 80% das pessoas vivem nos municípios. E, se pegar por regiões, têm regiões como o Sudeste em que 93% vivem nos municípios. Mesmo aqui na região Nordeste, nas regiões próximas às capitais, esse número também não é muito diferente. Então, nossa responsabilidade com o meio ambiente é fundamental. As políticas sempre vão ter que estar voltadas pra esse programa: da cidade resiliente, compacta e inclusiva.
Visita técnica
No último 25 de junho, Jean Carlos Pejo, acompanhado do secretário da Infraestrutura do Ceará, Lúcio Gomes, e do presidente do Metrofor, Eduardo Hotz, visitou obras das linhas Sul e Leste do metrô de Fortaleza e conheceu o projeto do ramal de VLT Parangaba-Mucuripe.
Mensagem de otimismo
Em seu discurso no Mobilize Summit, logo após a fala introdutória do prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio (PDT), o secretário nacional de Mobilidade afirmou que "vivemos um período especial no Brasil onde, independente de questões políticas e partidárias, o interesse maior é a melhoria da qualidade de vida das pessoas". Trabalho que, do ponto de vista dele, deve ser protagonizado pelos municípios.