Quem vê a cantora Téti pelas ruas de Fortaleza, em meio a aparelhos de academia, pelas praias de Canoa ou Jeri, onde ela gosta de se refugiar, ou em eventos culturais em cafés, livrarias, espaços musicais, talvez não imagine sua chegada aos 75 anos, neste tão difícil 2019. Nem saiba estar diante de uma das maiores vozes da música do Ceará. A grande dama da canção cearense, como o compositor Henrique Beltrão sempre fez questão de dizer. Assinamos embaixo.
Mãe de três filhos e dois discos com Rodger Rogério, outro nome essencial para a geração que se tornaria nacionalmente conhecida por "Pessoal do Ceará", avó e agora bisavó - ou "bivó", como ela saborosamente prefere -, Maria Elizete Morais de Oliveira carrega no corpo e na voz a energia intensa e misteriosa dos monólitos forjados sob a luz cegante de seu Quixadá. "Sol quente pra todo lado". Cantando, hipnotiza com seu timbre vestido de prazer e beleza, de força e sensibilidade, deslizantes matizes ancestrais, sertanejos, ensolarados, das composições mais líricas às mais experimentais. Uma forma própria de fazer cada canção acontecer.
Falando, se expressa igualmente enfática, mãos sem dar conta de acompanhar as ideias e o volume das palavras projetadas, recortadas, esculpidas pelo ofício de intérprete, mas acrescidas de doces e particulares nuances da grande mãe. "Ô meu bichim. Você me desculpa? Pra esse show, pra essa viagem, a Tetinha não vai poder ir não... Mas na próxima eu vou".
Ora se! Ao longo de 2018, Téti, nos últimos anos menos assídua nos palcos, por coisas de um Ceará que ainda precisa (re)conhecer o Ceará, deu ao público a alegria de fazer oito shows ao lado de colegas de geração, como Rodger, e de outros mestres que a eles se seguiram, como Calé Alencar, Edmar Gonçalves, Kátia Freitas, Davi Duarte, com o projeto "Futuro e Memória", parceria nossa com o compositor Rogério Franco, incluindo disco e show que passou por diversos espaços de Fortaleza, do Cariri, da região norte e da Paraíba.
Téti assistiu à estreia do primeiro videoclipe de sua carreira, da música "Reinvenção", lançado no Theatro José de Alencar. Também gravou diversos programas de rádio e TV. Em um deles, emocionou (ainda mais) a todos: "Eu já fui o futuro da nossa música. Hoje, já sou quase memória".
Nada, Tetinha! Você tem é muito ainda pra fazer e cantar, mulher! Você é "Senhora do universo", como na nova canção-presente de Rogério e Calé. Como você mostrou em seu show de 75 anos, com público e músicos em um partilhar intimista e inesquecível no palco do Cineteatro São Luiz. Tem disco novo pra 2020, com lindas canções de Rogério Franco e Alan Mendonça, reencontrando Rodger em um álbum inteiro dos dois. Tem muitos aplausos pra receber e muita estrada pra pegar. Discos pra relançar e outros pra gravar. Tem filhas, netas e bisneta pra ensinar tanta coisa, com tanta força, tanta verdade, tanta elegância. Como você faz com todos ao seu redor. Como só uma grande dama sabe fazer.
Dalwton Moura, jornalista e produtor musical