Pássaros de madeira, palhaços de cerâmica, bolsas de crochê e bustos de barro. Na janela colorida, um gato siamês, outro logo abaixo. Na entrada, cestas artesanais de frente para um quadro representando uma festa popular, feita com pedaços de persianas pintadas. A luz ilumina uma cadeira artesanal, adornada, inusitada.
A diversidade e o colorido é o que mais chama atenção na Expedição Galeria, ainda da fachada da loja. Aberta em outubro de 2019, o novo espaço se localiza em uma ruela de bares e escritórios de arquitetura da Aldeota, mas sua idealização como galeria começou em outro lugar e em outra data.
Da paixão de Marcio e Maristela Gurgel pela arte, ainda mais especificamente a arte considerada popular, surgiu a ideia de criar algo que pudesse mostrar as descobertas artísticas do casal durante suas viagens pelo Brasil. “A gente viaja pensando nas galerias, nos museus e nas lojas, sempre fazendo pesquisa. Conhecemos a obra do João das Alagoas em 2019, que despertou nosso interesse de conhecer a arte popular”, explica Maristela, responsável principalmente pelo comercial da galeria.
A ideia cresceu e Marcio começou a pegar a estrada e realizar as chamadas “expedições” para conhecer ateliês, oficinas e casas de artistas. No retorno, o carro voltava cheio de nomes conhecidos - como Véio (Cícero Alves dos Santos), de Minas Gerais, e João Borges, de Pernambuco - e de novos artistas descobertos ao longo do caminho. A residência do casal logo passou a parecer um museu, resultado das várias aquisições. A primeira ideia foi criar um blog, talvez um livro ou catálogo. Mas logo a galeria surgiu à mente.
De bonecas de pano de R$ 39 a santas neo-barrocas por quase R$10 mil, o acervo atual da galeria é de 500 obras feitas por cerca de 80 artistas de diversos estados do Brasil. Em torno de 70% das obras são de nomes nordestinos, cada um com sua história, percurso e representação.
Das viagens de carro, Marcio, o principal curador, ressalta que, mais do que a obra, ele retorna com novas vivências e histórias. “O que eu acho mais interessante é conhecer a alma do artista. Chegamos lá e é tudo do tempo deles. Se você quiser, pode chegar e passar o dia inteiro conversando com ele, mesmo tendo tanta peça para entregar. Aprendemos com essa relação, de como vem a matéria prima, do meio que o artista está inserido”, explica ele, que já realizou, pelo menos, 15 viagens expedicionárias por diversos estados brasileiros.
O grande foco da galeria é a busca da arte popular, obras que representem o ambiente, o contexto e a realidade em que cada artista se insere. A proposta da galeria é manter a expansão constante do acervo, para novos artistas e novas realidades. “Temos um sonho de ter um pedaço de cada artista popular na nossa galeria”, elucida Maristela.
No espaço de Marcio e Maristela, a grande variedade já basta para a visitação. Tem desde esculturas mais inusitadas - como móveis decorados e pessoas-pássaros - até as mais tradicionais - como xilogravuras e obras sacras. Com livros nas paredes, de dicionários artísticos à literatura nordestina, o local permanece aberto até para os que não desejam adquirir nenhuma peça, mas sim conhecer os fragmentos da arte brasileira e, principalmente, nordestina.
Maristela ressalta a presença de nomes que valem a visitação, como os alagoanos Salvinho da Ilha do Ferro e Sil da Capela. “Queremos passar a ideia de que qualquer pessoa consegue comprar uma obra, mas que se sinta acolhida para vir, conhecer, aprender e ver o que o Brasil tem de arte popular. Por mais que ela não compre nada, tem história aqui pra todo mundo”.
Expedição Galeria
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, 10h às 19 horas; sábado, de 9h às 14 horas
Onde: rua Sabino Pires, 75 - Aldeota
Outras infos: (85) 99901 9876
Frida ressignificada - Guima
“O Guimarães Bezerra, conhecido como Guima, é artista potiguar. É neto de artesã e marceneiro. Com 26 anos se transferiu para Recife. O Guima fez faculdade, mas a alma de artista foi maior. Ele trabalhava na área administrativa, mas a arte começou a tomar de conta que ele não teve como se dedicar às duas profissões. Começou então a descobrir sua obra colorida no maracatu, o reisado e no folclore pernambucano. Desenvolveu essa arte de palhaços retratando personagens, como a Frida (foto), músicos, profissionais, com uma beleza que só ele consegue fazer. Ele expressa toda essa beleza das festas pernambucanas e retrata na obra dele”.
Cesta colonião - Juão de Fibra
“Juão de Fibra é o autor das cestas, tecidas no capim colonião. É cearense, mas muito cedo foi residir em Goiás com a família, perto de Brasília. Lá, andando pelos ribeirinhos do cerrado, conheceu o capim colonião e começou a tecer o material. Ele trabalhou com outras atividades, mas a arte foi se desenvolvendo dentro dele. Começou a traçar o capim de várias formas, a desenvolver os cestos, criou técnicas... Adotou o nome Juão de Fibra porque é o que representa a arte dele. Tem mais de 50 tipos de trançado do capim e cada parte da cesta é um trançado diferente”.
Pássaros da tradição - Salvinho da Ilha do Ferro
“Salvinho é mestre alagoano, nascido na Ilha do Ferro, distrito do município de Pão de Açúcar, às margens do rio São Francisco. Com pouca idade, já se considerava homem, porque já trabalhava como adulto, na extração de cana de açúcar. Inspirado pela tradição da Ilha do Ferro, que já tinha artesãos que trabalhavam com a madeira, Salvinho começou a frequentar ateliês e desenvolveu essa arte belíssima, dos pássaros. (Sua arte) tem relação com o ambiente que convive, na região com pássaros, da volta à natureza, ao sertão e ao agreste. Salvinho pega esses pássaros e desenvolve com esse colorido para dar vida à imaginação do que ama”.