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Número de data centers no Ceará mais que quadruplica desde o início da pandemia
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Número de data centers no Ceará mais que quadruplica desde o início da pandemia

Necessidades geradas pela crise sanitária e fato de ter o segundo maior entroncamento de cabos submarinos do mundo ajudam a explicar expansão. Qualificação ainda é desafio
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Volume de dados a ser transportado e armazenado cresceu exponencialmente, tornando muito complexa e cara esse tipo de operação, o que favoreceu a expansão dos data centers (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Volume de dados a ser transportado e armazenado cresceu exponencialmente, tornando muito complexa e cara esse tipo de operação, o que favoreceu a expansão dos data centers

Um mês antes da pandemia de Covid-19 atingir o Ceará, o estado contava com três data centers (ou centro de processamento de dados) de grande porte. Àquela altura, conforme noticiava O POVO, acabara de ser assinando um memorando de entendimento para instalação de um novo data center, da Elea Digital.

Hoje, após pouco mais de dois anos, esse número mais que quadruplicou passando para 13 centros de processamento de dados, o que representa um aumento de 333,3%. Quatro deles, inclusive, têm atuação internacional. A expansão foi bem superior a que ocorreu com relação ao número de novos cabos submarinos de fibra óptica a chegar em Fortaleza, que passaram de 14 para 16, ou 14,2% de crescimento, nesse período.

Entre especialistas ouvidos pelo O POVO, essa infraestrutura, configurada como o segundo maior número de entroncamento de cabos submarinos de fibra óptica do mundo, ajuda a explicar o interesse crescente de grandes empresas de Tecnologia da Informação e da Comunicação (TIC) Brasil e do Exterior em instalar data centers no Ceará, mais precisamente na Região Metropolitana de Fortaleza.

Veja a estrutura de um Data Center(Foto: Infografia de Luciana Pimenta)
Foto: Infografia de Luciana Pimenta Veja a estrutura de um Data Center

A Capital, por exemplo, tem 11 data centers. Os outros dois estão sediados nos municípios vizinhos de Eusébio e Maracanaú. Juntos, geram 702 empregos diretos, em postos que exigem alta qualificação profissional.

Contudo, outros fatores como as próprias necessidades geradas e aceleradas pela crise sanitária global também contribuíram.

Afinal, em um cenário no qual, de uma hora para outra, residências se transformaram em escritórios improvisados e em que novas tecnologias e conceitos, tais como o 5G, a internet das coisas e o metaverso, começaram a se tornar realidade, o volume de dados a ser transportado e armazenado cresceu exponencialmente, tornando muito complexa e cara esse tipo de operação para empresas que não tenham a TIC como foco de negócio. Isso sem falar em outras instituições, incluindo órgãos governamentais.

Volume de dados a ser transportado e armazenado cresceu exponencialmente, tornando muito complexa e cara esse tipo de operação, o que favoreceu a expansão dos data centers(Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Volume de dados a ser transportado e armazenado cresceu exponencialmente, tornando muito complexa e cara esse tipo de operação, o que favoreceu a expansão dos data centers

Nesse sentido, o secretário-executivo de comércio, serviços e inovação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado do Ceará (Sedet-CE), Júlio Cavalcante Neto, lembra que “o potencial de desenvolvimento da computação em nuvem no mundo é da ordem dos bilhões de dólares.

E o interessante é que a gente pode participar desse mercado sem precisar estar lá fora. A gente pode fornecer esse serviço para empresas nos Estados Unidos, na Europa a partir de data centers instalados no Ceará. Então, a gente tem, sim, uma chance muito grande de participar desse mercado global de forma muito consistente”.

Ele acrescenta que a localização estratégica de Fortaleza, que deve receber mais duas novas redes de fibra por cabo submarino até o fim do ano, dá ao Estado vantagem competitiva em relação a outras unidades federativas, dispensando, inclusive, a necessidade de fazer prospecção ativa por esse tipo de negócio.

“Temos uma série de atrativos no Ceará e o que precisa ser feito é criar uma ambiência de formação de capital humano. Nós temos a questão do 5G, que demanda uma conectividade em alta velocidade, também por terra e, hoje, temos uma rede de fibra que nos liga a todo o País”, destaca.

Embora reconheça a importância da chegada dos grandes atores da área de TIC, tais como a Amazon e a Angola Cables, e dos investimentos feitos em instalação ou contratação de data centers, o CEO do Iracema Digital e pesquisador do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Mauro Oliveira, alerta que é preciso estar atento ao que chama de “efeitos colaterais” desse processo.

“A gente não quer ficar só como economia periférica em que essas grandes corporações cheguem aqui e somente beneficiem suas respectivas matrizes, mas que haja maior interação com as empresas e com as entidades locais. Para isso, é necessário que o Ceará tenha um ecossistema de inovação em TIC, mas também que sejam negociadas contrapartidas desses grandes players”, defende.

Oliveira conclui afirmando que é preciso ter, ainda, “uma formação massiva para atuar nesses data centers e outras empresas da área de tecnologia, principalmente em cloud (computação em nuvem). Essa é uma área em que você acaba favorecendo os jovens, muitos dos quais estão sendo fisgados pelo tráfico, e com formação massiva você gera oportunidade e renda para eles”.

Um data center e três continentes conectados

Embora esteja instalado no Ceará desde 2019, portanto antes da pandemia, o data center AngoNAP Fortaleza, da gigante do segmento de TIC Angola Cables, é considerado um divisor de águas para a expansão do interesse de empresas que lidam com armazenamento de dados, de um modo geral, estando interligado diretamente a dois cabos submarinos, o SACS e MONET e indiretamente ao WACS. Por meio dele, três continentes estão interligados: América, África e Europa.

A Angola Cables ressalta que o “data Center em Fortaleza é um ponto chave de conectividade. A sua localização é interessante à medida que possibilita uma menor distância da América Latina tanto para a África como para os Estados Unidos para um eficiente cacheamento de conteúdos, garantindo também uma baixa latência (tempo que um pacote de informação leva para chegar de um computador para outro) para os Estados Unidos e Europa enquanto ponto estratégico de chegada e saída de dados do e para o Brasil”.

Fachada do AngoNAP Fortaleza, data center  da Angola Cables, na Praia do Futuro (Foto: Rogério Lima/Divulgação)
Foto: Rogério Lima/Divulgação Fachada do AngoNAP Fortaleza, data center da Angola Cables, na Praia do Futuro

Segundo a empresa angolana, “com padrão Tier III certificado pelo Uptime Institute, o Datacenter AngoNap Fortaleza tem atualmente cerca de 3 mil m² construídos de área na Praia do Futuro, na capital cearense, com uma área total de 9 mil m² e está disponível para mais quatro fases de expansão”. Vale lembrar que as classificações Tier atribuídas aos data centers vão da escala I a V, seguindo a numeração romana. Quanto maior o número, mais complexa é a estrutura. Um data center Tier III, como os que estão se instalando no Ceará, têm como principal característica se tratar de um sistema autossustentado.

Ainda conforme a empresa angolana, “a instalação atingiu 1.2 Terabits de tráfego de dados no Brasil em março de 2020 (início da pandemia de Covid-19 no Ceará), tem uma capacidade de energia de 12,5 MVA com redundância e podendo chegar a 1000 racks escaláveis, oferecendo aos clientes um padrão de disponibilidade de serviço de 99,982%”.

Data center cearense também prepara expansão

Se há, por um lado, um movimento crescente de instalação de data centers de grandes empresas de outros Estados e países no Ceará, há, por outro, o planejamento por parte da companhia cearense HostWeb de expandir suas operações direta ou indiretamente para fora das fronteiras do Estado.

A Hostweb é uma empresa de armazenamento de dados em servidores. O data center é gerenciado por Sérgio Uchoa(Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS A Hostweb é uma empresa de armazenamento de dados em servidores. O data center é gerenciado por Sérgio Uchoa

De acordo com o gerente da HostWeb, Sérgio Uchoa, a empresa do grupo SecrelNet, “está mirando nesse momento o Norte-Nordeste, ou seja, entrarmos em mercados como os de São Luís, Belém, Recife, Teresina e aí, se for necessário, fazer investimento em data center. Esse é um investimento muito alto e você realmente demora um pouco para rentabilizar, mas a gente não descarta, por exemplo, contratar estruturas fora do estado ou montar estrutura intermediária”.

Nessa direção, ele exemplifica que entre os clientes atuais da empresa já se inclui um hospital paraense. “Ele fica em Belém e toda a operação de ERP (sigla inglesa para Planejamento de Recursos Empresariais) dele roda aqui em Fortaleza. Vem de lá para cá pela internet. Além disso, tem uma empresa cearense da área metalúrgica, cliente nossa, cuja maior operação deles também fica no Pará, só que no interior”, cita.

Sobre o crescimento do mercado de data centers, de um modo geral, Uchoa avalia que entre os fatores por trás desse fenômeno estão a segurança e a comodidade da operação. “Se uma empresa concentra seus dados em um servidor próprio, em um feriado de Carnaval, por exemplo, tem que se preocupar com escala de funcionários, vigilância, energia”, lista.

“Se você tem um varejo precisa ter uma ERP e um banco de dados, por exemplo, e para cada sistema desse precisa ter prestadores de serviços. É uma mão de obra cara que, muitas vezes fica ociosa, como se fosse uma espécie de seguro. Já quando você contrata um data center dilui esse tipo de custo, que é mais competitivo”, explica.

"Um dia parado equivale a seis meses de hospedagem"

Mais até que a questão da comodidade, o que pesou para a Simplifique contratasse um data center para armazenar e gerenciar seus dados foi a relação custo-benefício.

Emmanuel Nóbrega é diretor comercial da Simplifique. A empresa resolveu hospedar seus dados em um data center e focar na expansão do número de unidades no Interior do Ceará(Foto: Thais Mesquita)
Foto: Thais Mesquita Emmanuel Nóbrega é diretor comercial da Simplifique. A empresa resolveu hospedar seus dados em um data center e focar na expansão do número de unidades no Interior do Ceará

Segundo explica o diretor comercial da empresa, “o custo mensal é caro, mas se eu for comparar com o prejuízo que eu venho a ter com uma queda de sistema, em que a loja para de faturar, eu conseguiria pagar seis meses de hospedagem”.

“Um dia parado é de prejuízo enorme. Eu deixo de faturar, o cliente não volta e quando o sistema cai, geralmente o backup só salva seis horas para trás. Essas seis horas que eu perdi de produção, não tenho como controlar. Eu não sei do que foi. Eu não sei o que saiu. Então, além do prejuízo de não vender naquele momento em que o sistema está fora do ar, tenho o prejuízo de não poder contabilizar o que eu vendi nesse período de delay do backup. Isso não acontece quando eu tenho minhas informações hospedadas em um data center”, avalia.

Nóbrega lembra que a decisão de terceirizar esse tipo de operação ocorreu durante a pandemia também por conta dos custos com atualização de maquinário. Outro fator que ele aponta como vantajoso na contratação de um serviço de data center é a possibilidade de expandir a capacidade de armazenamento de dados na medida em que a empresa vai inaugurando novas lojas.

“Em um ambiente terceirizado, esse espaço é ilimitado. Tem lá dezenas de servidores e terabytes à disposição. Então, eu vou crescendo e ele vai liberando espaço para mim”, pondera.

“Eu posso abrir n lojas, na hora que eu quiser, que já tenho espaço suficiente lá disponível para fazer o meu armazenamento”, acrescenta, ao afirmar que a empresa, que hoje conta com 11 unidades, deve inaugurar uma nova loja em Itapipoca em 2022 e planeja abrir outras três no Interior até o fim de 2023.

>> PONTO DE VISTA

O data center e o tempo

(*) Hamilton Nogueira

Hamilton Nogueira é jornalista e colunista de tecnologia do jornal O POVO(Foto: Acervo pessoal)
Foto: Acervo pessoal Hamilton Nogueira é jornalista e colunista de tecnologia do jornal O POVO

O data center vai além de sua tradução literal. Sim, é um centro de dados, mas é também um centro concentrador de serviços ou da disponibilidade deles. Eu não preciso dizer pra você o quão importante se tornou o dado para toda e qualquer estratégia social, comercial, bélica ou humana. Ocorre que a centralidade fundamental das relações humanas, fundamentadas mais e mais em dados, derivou para outra necessidade: a disponibilidade do dado.

Ou seja, ter os dados não basta. É preciso tê-los à mão. E tantas são as aplicações que precisam manuseá-los, que essa exigência não reconhece guerra, fins de semana, falta de energia ou manutenção. A disponibilidade precisa ser total, constante e inquestionável. Ao ponto de ser óbvia. Como assim desligar o servidor para fazer uma atualização? Dá-se risadas. Estruturas que se prezam espelham dados e equipamentos, e trocam hardwares sem que sequer uma fração irrisória de tempo seja perdida ou percebida.

Essa obviedade que é a disponibilidade absoluta criou uma indústria pujante, poderosa e desafiadora cujas missões são manter, organizar, traduzir, proteger, capacitar para o uso dos dados. Isso exige gente preparada, tecnologia de ponta. Estamos falando em serviço sim, mas também estamos falando em infraestrutura - essa doce palavra que permeia a vida dos brasileiros há tanto tempo, cercada de desejos. Porque vai dos metrôs nas grandes cidades até as vias lógicas de alta velocidade como suporte às nossas crescentes demandas.

Nesse trajeto há um data center. Impávido colosso. Frio e inatingível. Feito pra ser discreto, uma vez que só é lembrado diante de uma indisponibilidade. Seu sucesso é ser invisível. Todavia é um gerador de mão de obra, um dissipador de desafios e um moedor de novas necessidades. Talvez caiba devamos ressignificá-los, transformando-os em laboratórios humanos de inteligência, de desenvolvimento de ponta e potencial atrativo de jovens para o conhecimento em tecnologia da informação.

Uma biblioteca moderna? Ou um banco de tempo? As contradições existentes na digitalização cada dia mais aguda, a fim de que se conquiste mais tempo disponível para o analógico, traduz um pouco desses nossos novos tempos. Se ficou alguma dúvida sobre essa questão, você pode buscar algum artigo no Google ou chegar a alguma boa reflexão no seu aplicativo para mentalização de boas energias. Tente. Se tiver um data center próximo de você, mesmo que você não saiba, a resposta poderá chegar bem mais rápida.

(*) Jornalista e colunista de tecnologia de O POVO

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