Antes de mais nada não há como não realçar o censo de 1872, porquanto foi o primeiro que o país fez, ainda ao tempo do Império; à altura, por mais que outros países já fizessem censos, e os Congressos Internacionais de Estatística já orientassem a elaboração das estatísticas, há que convir que o nosso Brasil era muito grande, e nossas experiências em produzir estatísticas eram no máximo localizadas; assim sendo dado que esse censo foi um sucesso, há que se valorizá-lo.
Outro marco foi o censo de 1920, que esteve sob o comando do médico Bulhões Carvalho, e que conseguiu repensar a atividade estatística brasileira, sendo o grande mestre de Teixeira de Freitas, o idealizador do IBGE. Pois já sob o IBGE eu marcaria seu primeiro, o de 1940, exatamente por ter sido seu primeiro, já que garantiu sua existência, em seguida merece realce o de 1970, pois recoloca nos trilhos a série censitária depois do atraso na apuração do de 1960 (no qual se tentou usar o chamado "cérebro eletrônico", que foi então um fiasco).
Daí eu marcaria dois momentos: o censo de 1991 (infelizmente não realizado em 1990, o que quebrou a série histórica), porque ele tornou, pela primeira vez, o censo uma pesquisa contínua na estrutura do IBGE, o que foi essencial; e os que viriam a partir de 2000, dado que já não mais usariam questionários em papel, mas antes o PDA, com crítica imediata da entrada de dados, e pondo fim aos pools de digitalização, o que diminuiria enormemente o tempo de divulgação dos resultados, inclusive permitindo a não mais divulgação em papel, mas antes em arquivos eletrônicos.
Estarmos fazendo o censo nesse momento em que a pandemia ainda não acabou, em que a vacinação ainda não atingiu por inteiro a todas as pessoas, em todas as doses recomendadas pelos cientistas, não é o ideal, mas os Agentes Censitários estarão devidamente protegidos, por si, e pela população (afora que se dará, com ênfase, a chance de resposta pela Internet e por telefone). Outro ponto é que estaremos em meio a uma eleição por demais polarizada; fazer um censo em meio a uma eleição não é problema e o IBGE já o fez, mas esta já se antevê será muito polarizada; será preciso ter muito cuidado a todo instante.
Noutro ponto, ainda que o orçamento tenha sido liberado sempre há despesas não previstas que se não forem supridas de imediato podem impactar irremediavelmente o andamento da operação censitária, não importa em que momento ela esteja. Por fim, não haver censo é sempre um prejuízo irremediável para todo e qualquer país, por melhor que seja seu portfólio de pesquisas, por o censo é a única pesquisa que chega a todos os domicílios e a todos os municípios. Um detalhe, estarmos fazendo o censo em 2022, em não o termos feito em 2000, não importa a razão, implicará fazer uma contagem de população no meio da década, lá para 2026, mais ou menos.
Não tenho a menor dúvida em afirmar que os governos precisam dar autonomia e independência ao IBGE. Deixar-lhe o orçamento livre, e jamais interferir em suas liberdades técnicas. O IBGE precisa ser valorizado, e não há dúvida de que seu papel se equivale ao do Banco Central ou do BNDES e a outros órgãos tão em voga. Ele não pode e não deve ser visto como um dos tantos órgãos postos no achincalhamento, sempre injusto, que se faz ao serviço público. É preciso distingui-lo como um órgão de excelência, sempre respeitado na ONU, na OIT, na FAO, e nos demais organismos internacionais.
Sem a Casa de Teixeira de Freitas o Brasil fica ingovernável, só os maus governantes não veem isso; só os governos que não planejam para o amanhã, por curto que seja esse amanhã, é que podem dispensar as estatísticas, sob a coordenação de um órgão como o IBGE.
(*) Pesquisador e professor no IBGE, doutor em Ciência da Informação pela UFRJ e Mestre em Economia pela FGV-RJ