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Betania Moura e Celso dos Santos: "Você ao criar está se redescobrindo. Você expressa sentimentos"
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Betania Moura e Celso dos Santos: "Você ao criar está se redescobrindo. Você expressa sentimentos"

Anualmente, Betania e Celso não deixam de abrir as portas do salão de eventos do condomínio onde moram, no bairro Edson Queiroz, para exibir a Exposição de Arte em Cerâmica
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FORTALEZA, CEARÁ, 20-04-2023: Betânia e Celso, aposentados e artistas plásticos, que realizam obras como esculturas e mosaicos de cerâmica. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo). (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA, CEARÁ, 20-04-2023: Betânia e Celso, aposentados e artistas plásticos, que realizam obras como esculturas e mosaicos de cerâmica. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo).

Foi após a aposentaria que os ex-bancários Betania Moura, 64, e Celso dos Santos, 75, descobriam outras linguagens através da arte. Em 2008, ambos investiram em práticas que ao longo da vida já admiravam desde sempre: a escultura de argila e os mosaicos de azulejo.

O que antes começou em cursos por Fortaleza e presentes dados a amigos e família, anos depois se transformaria em obras de referência conhecidas em toda a Capital.

Ex-funcionária da Caixa Econômica Federal, Betania Moura é também escritora e facilitadora de Biodança do Ceará. É com o trabalho criativo em torno da argila que a artista, sempre com a colaboração do esposo, leva seu trabalho para além das paredes de casa, tento participado de exposições no Centro Dragão do Mar e na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece).

Ela também carrega o uso do barro em ações de arteterapia, como é o caso do trabalho com crianças do projeto Movimento Saúde Mental Bom Jardim (MSM). 

Anualmente, Betania e Celso abrem as portas do salão de eventos do condomínio onde moram, no bairro Edson Queiroz, para exibir, sempre em novembro, a Exposição de Arte em Cerâmica e Mosaico. Entre as obras estão peças únicas, entre as decorativas e utilitárias. 

O POVO - Como iniciou o trabalho de vocês com cerâmica e escultura? 

Betania - Foi pouco antes de me aposentar. Em 2008, já próximo da minha aposentadoria, que foi em 2010, eu comecei a pensar o que vou fazer depois que eu sair da Caixa. A ideia da cerâmica e da escultura de mexer com argila começou na infância, porque sou do Interior e perto da minha casa tinha uma olaria e lá eu criança brincava muito de fazer aqueles bonequinhos. Um dia num trabalho que eu estava fazendo terapêutico se trabalhou com argila e veio aquilo tudo. Aquela memória desse contato com um material tão primitivo. Comecei a fazer bem intuitivamente e aí depois descobri um ateliê aqui da Denise Saboia que é maravilhoso, que era a última pessoa que dava aula de escultura. Comecei a fazer peças utilitárias e educativas, mas minha tendência mesmo é fazer esculturas. A partir disso começamos a fazer exposições muito com os amigos, a família foi conhecendo. Fizemos três exposições todo ano. Só não fizemos em 2020 por conta da pandemia. Em 2009, um ano antes da minha aposentadoria, a gente já começou.

Celso - O meu foi mais ou menos assim. Eu me aposentei e a Betania falou ‘olha, não vai ficar em casa vendo televisão’. Me botou para a rua né (risos). Eu falei “não de jeito algum”. Ela perguntou o que eu gostava de fazer e o que admirava e eu falei 'eu acho lindo mosaico, uma obra de arte maravilhosa e gostaria de aprender'. Fizemos um curso básico, começamos a aprofundar na internet e fomos aprimorando a técnica, principalmente do mosaico. Aí nós dávamos sempre de presente, ao invés de comprar alguma coisa em shopping e em loja, as nossas peças de presente que nós tínhamos feito e as pessoas adoravam, encantavam. elas gostavam e falavam 'porque vocês não fazem uma exposição das obras de arte de vocês?'. Foi quando nós fizemos a primeira exposição nossa. Foi um sucesso, em 2008.

Betania - A primeira foi no ateliê, depois a gente ficou fazendo em casa no salão de festa do prédio. Fazemos agora aqui também neste salão. Fizemos também no Dragão do Mar, na Assembleia Legislativa, em evento que teve lá.

OP - Como vem sendo o retorno do público diante dos materiais? No sentido financeiro e simbólico?

Betania - É maravilhoso. Como artistas, temos muita dificuldade em colocar preço. É um problema sério porque a gente não tem ideia como avaliar. Tem a criação, o trabalho. O ato criativo, ele não tem preço, porque você tem a ideia naquela hora, desenha, cria e como você calcula o preço disso? Mas a gente tem uma boa venda, muitas encomendas depois, apesar da gente não trabalhar com encomenda porque nunca sai como o cliente quer. E ele quer igual um que viu e a gente nunca repete a peça, não repetimos porque é autoral. A recepção é muito boa, as pessoas até dizem que já faz parte do calendário, final de ano, que é sempre em novembro, um mês antes do natal.

OP - A gente percebe que a arte é muito transformadora de diversos sentidos. O que esse trabalho com cerâmica e mosaico trouxe para o pessoal de vocês? Qual foi o ganho que a arte lhes trouxe?

Betania - Eu considero a arte como a arte mais profunda de si mesmo. Você ao criar está se redescobrindo. Você expressa sentimentos e emoções que nem imaginava, imagens que vêm. Quando você está criando é algo misterioso. E com argila é impressionante porque ela tem uma vida própria. A gente vai pegando a argila, você quer dominar e chega uma hora que a gente entra numa harmonia, então isso é extremamente terapêutico, é muito gratificante você começar uma coisa inerte e aquilo criar vida.

OP - De onde vem a inspiração de vocês?

Celso - Você dá vida. Você cria aquilo e vê as coisas depois com outros olhos, uma outra visão. É profundamente graficamente (...) Quando acontece uma inspiração eu corro para a agenda e começo a esboçar um desenho. A inspiração tem que aparecer, não é todo o momento, não é toda hora. Às vezes estou aqui de bobeira, me ligo, pego o papel e aquilo que estou gravando eu estou passando para o papel, mas de repente também para, a inspiração passou e eu abandono um pouco. E assim vai sucessivamente até você chegar na conclusão que é aquilo ali que você quer fazer. Aí você começa a pegar as cores, pegar um lápis de cor e começa dar vida às cores, a combinação de cores.

Betania - Uma vez eu acordei e ele estava na cama assim [gesto de movimentação e risos]. Aí ele disse 'é uma imagem que está me vendo e eu sonhei'. Ele fez uma mandala. Olha, não vou dizer igual, mas pouco tempo depois aquela mesma imagem numa arte inca, foi uma coisa impressionante. Ele sonhou com essa imagem e depois ele fez. Era uma arte andina, um negócio impressionante.

Celso - E essa mandala a pessoa viu e disse “é isso aí o que eu quero”. Porque a peça tem o seu dono. Tem peça que às vezes você bota na exposição e não sai. Vem a segunda exposição e não sai. Aí eu digo 'Betania não saiu'. Ela me diz para ter calma porque ela tem seu dono. Aí você bota na terceira e a primeira pessoa que entra diz 'adorei aquilo ali. É ela que eu vou levar'.

Betania - Ele termina o café e diz assim 'vou para o meu trabalho' e aí vai para a área de serviço. O meu não, já depende de fogo, tenho que levar para a queima, tem um processo diferente. Porque o dele é material seco. ele pega a cerâmica, quebra, lixa para montar o mosaico. O meu não posso parar, porque ela pode desmoronar. O meu tem que sair um pouco de casa. Eu boto ele para sair de casa (risos).

Betania - O mosaico do Celso ficou conhecido aqui em Fortaleza pela qualidade. Muita gente faz mosaico, mas não tem esse cuidado da lixa. Você passa a mão e é aquele mosaico áspero, os pedaços muito longe. Tem quadro do Celso que parece uma pintura. Aí ele brinca e diz 'passe a mão e se cortar você leva a peça'. Parece um espelho. Trabalho terapêutico a gente já fez com grupos. Eu já fiz trabalho de argila com crianças do movimento e saúde mental, no Bom Jardim. Já trabalhei com mulheres em periferia de expressão por argila. Tanto faço comigo quanto com grupos.

O POVO - Tem algo vindo para o futuro? Algo que pode vir nos próximos meses?

Betania - De imediato não. A gente já está com ideia de não fazer assim particular. Já estamos com projeto de fazer no Mauc (Museu de Arte da UFC), nas galerias de Fortaleza e ficar um tempo maior. Porque quando termina a exposição a gente guarda o material em casa. Uma ou outra pessoa que vem e conhece, fica muito espaçado. E a gente tendo uma galeria que possa ficar mais tempo muito mais gente tem acesso. Estamos com esse plano de fazer isso.

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