Com uma mãe professora, Maria Inês Pinheiro Cardoso esteve ligada à leitura desde o ventre. Amante da Literatura e professora há mais de 20 anos, Inês faz e conta história nas praças de Fortaleza. O projeto "Leituras na Praça", idealizado e coordenado por ela, convida a comunidade e hábeis leitores para desfrutar e ocupar espaços da Cidade com a leitura, sem conceitos complexos ou palavras robustas.
Ao levar a literatura às praças, Inês relembra uma preciosa memória materna e reivindica junto aos alunos o hábito de ler ao ar livre em uma era de leitura automática por vozes robotizadas, legendas curtas para atrair o público e resumos por Inteligência Artificial (IA). Mestre em salas de aula da Universidade Federal do Ceará (UFC), a professora também leva gerações para conhecer e promover o prazer da leitura.
OPOVO - Graduada, mestra e doutorada em Letras, sua história com a leitura é extensa. Como iniciou essa relação?
Inês Cardoso - Vivi a infância no Pé da Serra do Araripe em um sítio chamado sítio Massapê. E essa infância rural foi muito beneficiosa, no sentido de que eu entrei em contato muito cedo com o mundo imaginário. Você pode imaginar que não tínhamos televisão em casa na zona rural, havia apenas rádio. Então, sobrava tempo para contação de história.
OP - Visualizar pessoas lendo ao ar livre se tornou um cenário raro na atualidade. A decisão de iniciar o projeto partiu de alguma observação, experiência pessoal ou algum fato histórico?
Inês Cardoso - Na verdade, eu já fazia isso há muito tempo, minha mãe e eu sempre aos domingos pela manhã íamos ali pra Praça das Flores. A gente sentava, nós tínhamos a cadeirinha dela, meu banquinho e a gente lia. Eu lia muito com ela, porque ela foi professora. Até hoje, com 95 anos de idade, ela lê muito e é a única atividade na qual ela realmente se concentra.
OP - Qual a finalidade do "Leituras na Praça"?
Inês Cardoso - Em 2016, houve uma comemoração ou uma celebração dos 100 anos da morte de Cervantes, Miguel de Cervantes, escritor espanhol. Na época, eu tive muita vontade, justamente por conta da surpresa dos alunos quando liam Cervantes, no sentido de que eles se davam conta de que entendiam perfeitamente os textos. A ideia é principalmente levar a leitura que nós aprendemos na sala de aula para fora da universidade. Seduzir o leitor para esse tipo de leitura e, simultaneamente, ocupar esses espaços públicos com atividades qualificadas com atividades culturais e ao mesmo tempo acessíveis.
OP - Como projeto de extensão na UFC, quem colabora com a iniciativa e como funciona?
Inês Cardoso - Nós temos uma bolsista remunerada e dez bolsistas voluntários. Esses bolsistas, na verdade, atuam em grupos de três, dessa forma a gente pode fazer leituras em quatro ambientes, quatro praças e parques da cidade separados simultaneamente. Os encontros aconteciam sempre aos domingos. Quase sempre era o primeiro domingo de cada mês ou o último domingo de cada mês. O projeto era itinerante e, portanto, nós visitamos várias praças diferentes. Eu fazia um percurso às vésperas, procurando uma praça que tivesse sombra que tivesse digamos assim as condições necessárias para que a gente se reunisse às vezes sentado na grama no chão, às vezes em banquinhos. Enfim, o público foi fidelizando.
OP - Como fomento ao costume da leitura e atuação a partir do território alencarino, o projeto contempla as obras e autores cearenses?
Inês Cardoso - Esse último encontro nós levamos a Jari de Arrais e o Airton Monte, que foi um grande cronista. Já levamos Ana Miranda, Ângela Gutierrez, Tércia Montenegro. Nossa, muita gente. Se não com as obras dos escritores, levamos os próprios para que eles também participem, escolhendo eles os seus livros favoritos também. Não se trata apenas de promover o autor cearense, se trata também de seduzir o leitor. As pessoas se deixam seduzir também por aquilo que lhes resulta mais familiar, pelo menos no início, e depois você vai expandindo naturalmente.