Logo O POVO+
Adeus ao menino criador
DOM

Adeus ao menino criador

Pai do "Menino Maluquinho", Ziraldo parte aos 91 anos e deixa impacto na história das produções para o público infantil
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
SP - INDENIZAÇÕES/ANISTIA/ZIRALDO - VARIEDADES - ATENÇÃO, SENHORES EDITORES: MATÉRIA COM EMBARGO. PUBLICAÇÃO LIBERADA A PARTIR DE DOMINGO, DIA 27 DE   JUNHO DE 2010. Ziraldo, 77 anos, conta que partiu do Sindicato dos Jornalistas a iniciativa de pedir indenização por perseguição política em   nome de vários de seus colegas, logo após a promulgação da Constituição de 1988.        03/09/2009 - Foto: TIAGO QUEIROZ/AGÊNCIA ESTADO/AE (Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO CONTEÚDO)
Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO CONTEÚDO SP - INDENIZAÇÕES/ANISTIA/ZIRALDO - VARIEDADES - ATENÇÃO, SENHORES EDITORES: MATÉRIA COM EMBARGO. PUBLICAÇÃO LIBERADA A PARTIR DE DOMINGO, DIA 27 DE JUNHO DE 2010. Ziraldo, 77 anos, conta que partiu do Sindicato dos Jornalistas a iniciativa de pedir indenização por perseguição política em nome de vários de seus colegas, logo após a promulgação da Constituição de 1988. 03/09/2009 - Foto: TIAGO QUEIROZ/AGÊNCIA ESTADO/AE

Presente nas memórias de infância de diferentes gerações de brasileiros, Ziraldo cumpriu, ao longo de 91 anos de vida, a missão de alimentar sonhos e defender o papel da leitura. Cartunista, escritor, chargista, caricaturista e jornalista, o múltiplo criador partiu neste sábado, 6, e deixou o País menos colorido.

Reconhecido como um dos principais nomes da literatura nacional, o artista mineiro faleceu em sua casa, no bairro Lagoa, na cidade do Rio de Janeiro. Em 2018, o artista sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e, desde então, estava com a saúde debilitada. A causa da morte, no entanto, não foi informada.

Com mais de 70 dedicados à arte, Ziraldo Alves Pinto iniciou sua trajetória na arte ainda criança, com apenas seis anos, ao ter seu primeiro desenho publicado no jornal “A Folha de Minas”, em 1939.

Grande contribuidor na iniciação da leitura de crianças por todo o Brasil – posição que carrega ao lado de Maurício de Sousa, o “pai” da Mônica –, Ziraldo é, e será, principal referência a inúmeros ilustradores e quadrinistas que viram em sua arte uma nova forma de retratar o mundo.

“Eu diria que há dois nomes no Brasil que me influenciaram muito na minha trajetória no desenho, que é o Ziraldo e o Flavio Colin (1930-2002), acho que esse dois brasileiros foram quem melhor representaram, e representam, a nossa cultura dentro dessa área do cartum e dos quadrinhos, que é área que mais gosto e mais consumo”, declara o ilustrador Daniel Brandão, quadrinista do O POVO.

Leia também | Quadrinistas, times e personalidades prestam homenagens a Ziraldo

Autor das tirinhas “Os mundos de Liz”, “Desenho Vivo" e “Primeiras Paixões” publicadas no Vida&Arte, o desenhista cearense afirma, ainda abalado com a notícia da morte do autor, que Ziraldo era um “gênio” em todas as áreas que se permitia aventurar.

“O Ziraldo é, sem sombra de dúvidas, dentro dessa área das artes gráficas, o maior gênio que temos. Eu estou muito emocionado e triste, isso está mexendo comigo e está sendo muito forte mesmo. Eu passei minha vida inteira admirando a arte dele, o trabalho dele… Ele foi o primeiro autor brasileiro a fazer sozinho uma revista em quadrinhos, a “Turma do Pererê”, que tinha tiragem regular, utilizando da nossa fauna, flora e o nosso folclore. Eram personagens tão brasileiros e isso por si só marcará a história dele”, detalha.

Entre as criações marcantes na história da literatura nacional, em 1960 Ziraldo fundou o jornal “O Pasquim”, principal publicação de resistência à ditadura militar no Brasil. Em 1969, lançou seu primeiro livro infantil, “Flicts”. A publicação fala sobre uma cor diferente e que não era “como as outras”, mas que no final teve sua importância reconhecida.

Com a afirmação “A lua é flicts”, dado pelo astronauta Neil Armstrong ao ganhar uma cópia do livro após sua visita à lua, “Flicts” ultrapassou a marca de 500 mil exemplares em 2019. Em 1980, trouxe à vida o Menino Maluquinho, personagem do quadrinho homônimo que conquistou o País.

Leia também | Ziraldo já desenhou para a Marvel? Lembre os heróis do cartunista

Marco na literatura infanto-juvenil brasileira, “O Menino Maluquinho” se tornou um fenômeno editorial que inspirou, fascinou e acompanhou inúmeras crianças por gerações. “Ziraldo foi uma grande influência, principalmente na minha infância, por seu estilo de desenho único. As suas histórias sobre o cotidiano do Menino Maluquinho e sobre a cultura do folclore brasileiro com a turma do Pererê me motivaram ainda criança”, relembra a ilustradora Rebeca Jéssica.

Também quadrinista do O POVO, com as tirinhas “Zootirinhas” publicadas no Vida&Arte, Rebeca acrescenta que a linguagem produzida por Ziraldo favoreceu para a iniciação de crianças e jovens no universo da leitura. “Ele contribuiu muito na literatura brasileira, principalmente a sua forma de linguagem acessível que trouxe para nós a facilidade de iniciar no mundo da literatura e da arte”.

Com mais de 110 milhões de livros publicados desde seu lançamento, a obra já ganhou adaptações para o teatro, videogame, histórias em quadrinhos e cinema. Importante legado que seguirá inspirando muitas e muitas infâncias. (Com agências)

Ziraldo e a "única solução para o Brasil"

Ziraldo queria ser ministro da Educação. Veja só: 14 anos atrás, me sentei ao lado do homem de voz chiada, como um radinho, e gestos amplos, como quem desenha no ar, e ele cheio de risos e de uma generosidade que lhe era muito vistosa, afirmou que era essa a "única solução para o Brasil". Eu acreditei. E como não acreditar? Em "Flicts", a primeira obra infantil do contador de histórias, Ziraldo nos fala de uma cor que buscava se encaixar no arco-íris.

A Educação de Ziraldo seria, pois, inclusiva. Na Turma do Pererê, a primeira revista de história em quadrinhos de um único autor publicada no País, Ziraldo se imbui de uma brasilidade para contar causos. A Educação do mineiro de Caratinga seria baseada nas experiências e no cotidiano real de um Brasil plural. Um dos idealizadores d'O Pasquim, Ziraldo foi preso três vezes durante a Ditadura Militar. A Educação do desenhista só poderia ser revolucionária.

Em Menino Maluquinho, é o garoto com "olho maior que a barriga, fogo no rabo e vento nos pés" que nos cativa. E na esteira de seu maior sucesso, a Professora Maluquinha, uma educadora não convencional nos fazia embarcar na aventura do aprendizado.

A Educação do homem de sobrancelhas brancas e muito expressivas só poderia ser inventiva, sagaz e divertida. Ziraldo Alves Pinto partiu ontem, 6, sem ter ocupado o cargo que desejava. Mas, como pai de um menino de panela na cabeça e figura afetiva para um sem-fim de gente que o leu, Ziraldo inspira e seguirá educando.

Domitila Andrade

Depoimentos

"Ele foi um dos fundadores do jornal "O Pasquim", nos anos 60, e deixa um imenso legado à cultura brasileira, com o seu Menino Maluquinho e tantas outras criações"

Camilo Santana, ministro da Educação

 


“São inúmeras e diversas as contribuições de Ziraldo, seja com a turma do Pererê, em seu trabalho à frente do ‘Pasquim’, nos anos da ditadura, em livros inesquecíveis, como ‘Flicts’, e num extenso trabalho em revistas e jornais brasileiros. Na defesa da imaginação, de um Brasil mais justo, com democracia e liberdade de expressão”

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil

 


“Perdi mais que um grande amigo. Perdi um irmão. Das letras, dos traços e da vida! Mas ele estará sempre aqui em meu coração. E nos corações de milhões de brasileiros maluquinhos, de todas as idades, que seguirão apaixonados por sua obra. Viva, Ziraldo!”

Maurício de Sousa, cartunista e ilustrador, criador da Turma da Mônica

 

“Uma perda irreparável. Ziraldo foi uma fonte de inspiração. Lembro-me do tempo em que participei de uma montagem baiana da peça ‘O Menino Maluquinho’. Tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente. Obrigada por tudo, Ziraldo, Sua partida deixa um vazio imenso”

Margareth Menezes, cantora e ministra da Cultura

 


“Ziraldo me deu a primeira oportunidade de desenhar profissionalmente, quando foi editor do Caderno B, no extinto Jornal do Brasil. Também escreveu prefácio do meu primeiro livro. Dono de desenho monumental, foi um dos maiores artistas gráficos de todos os tempos. Descanse em paz”

André Dahmer, cartunista e autor das tiras “Malvados”

O que você achou desse conteúdo?