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Como uma vitória de Biden pode impactar a economia do Ceará
Economia

Como uma vitória de Biden pode impactar a economia do Ceará

Dentre os setores que podem ser beneficiados no Estado estão o de energias renováveis. Hoje, pás eólicas são o segundo item mais exportado para os Estados Unidos
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Relações comerciais como os EUA (Foto: Luciana Pimenta)
Foto: Luciana Pimenta Relações comerciais como os EUA

O candidato democrata Joe Biden está mais próximo de ser eleito o 46º presidente dos Estados Unidos. Reflexo deste movimento, ontem, a B3 fechou acima de 100 pontos e o dólar no Brasil bateu os R$ 5,39, queda de 2,74% e menor valor desde 18 de setembro. Mas como as eleições norte-americanas podem impactar a economia brasileira e, em especial a cearense, nos próximos anos?

A preocupação é natural. Além de ser uma das maiores potências econômicas do mundo, os EUA lideram parceria comercial com o Estado, responsável por 36% das exportações cearenses. Dentre os produtos de interesse do país, destacam-se: aço, equipamentos para geração de energia eólica, castanha de caju e água de coco. Também é o principal fornecedor de insumos ao Ceará, 30,6%, sobretudo quando se tratam de combustíveis minerais e vegetais e fibras de carbono.

Ante o perfil da indústria cearense, o economista Alcântara Macedo acredita que uma eventual vitória de Biden pode ser positiva, principalmente para o setor de produtos eólicos, já que o candidato democrata tem reforçado em sua campanha a promessa de alavancar os investimentos nesta área. De janeiro a setembro deste ano, a exportação de pás eólicas do Ceará para os EUA somou mais de US$ 43,47 milhões, segundo dados do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Estado (CIN/Fiec).

"Para o Ceará é favorável esse interesse em relação às energias renováveis. Assim como essa visão mais ampla do Biden em relação ao meio ambiente e ao social pode ser muito favorável para o Brasil".

Ele acredita que, independentemente do já declarado apoio e alinhamento ideológico do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, com Donald Trump, as relações comerciais devem se manter.

"O Brasil é a maior nação latino-americana, tem 212 milhões de consumidores, então, isso não é algo a ser desprezado, principalmente, quando se tratam de negócios e tem muitos produtos a oferecer. Essa boa relação direta é algo que se mantém independentemente de quem sejam os presidentes".

Mas, diante deste novo cenário, no qual Biden já deu indicativos de que vai pressionar o governo brasileiro em relação à questão ambiental, é possível que cresça a pressão dentro do Brasil para que o Governo Bolsonaro, sobretudo, a ala mais ideológica, reveja em certa medida o tom adotado nesta área. "Isso pode afetar diretamente a forma como o agronegócio é tratado aqui no Brasil, certamente esse setor será impactado pela provável eleição do democrata, mas ainda é cedo para definir como acontecerá", avalia o gestor de riscos Yuri Utida.

O mercado financeiro também está atento aos efeitos que as propostas econômicas de Biden, se efetivadas, podem ter no processo de recuperação da economia norte-americana. Dentre estas, o aumento de impostos para empresas, de 21% para 28%, na contramão do que foi feito por Trump em seu governo, e a ideia de uma taxa mínima sobre lucros estrangeiros de 21%, acima dos atuais 10,5%.

O sócio da iHUB Investimentos, Paulo Cunha, diz, no entanto, que mesmo este ponto, no cenário atual, já foi precificado pelo mercado. "É claro que aumento de impostos nunca é visto com bons olhos e, neste quesito, Trump era preferido pelo mercado. Mas o fato de a eleição estar praticamente definida é algo extremamente positivo, porque a incerteza é sempre o pior cenário. Tanto que nas últimas semanas as bolsas do mundo inteiro já tiveram valorização e a cotação do dólar caiu".

Além disso, ele reforça que, como na eleição para o Congresso dos EUA, a correlação de forças entre democratas e republicanos está até mais equilibrada do que o que era previsto, são grandes as chances de Biden não conseguir aprovar esse tipo de mudança com facilidade.

A gerente do CIN, Karina Frota, também não acredita em mudanças no curto prazo nas relações comerciais dos EUA com Brasil. "Após quase dois anos de negociação, recentemente foi firmado um acordo muito animador para as relações comerciais com o País, acenando para a possibilidade de simplificação de procedimentos e redução de barreiras tarifárias entre os dois países e essa agenda internacional não é facilmente reversível".

Para ela, um aumento ou queda no volume de negócios, no entanto, estaria muito mais atrelada à capacidade de recuperação da economia das duas economias, além de uma maior diversificação e competitividade da pauta de exportação.

 

Fator China e a briga por tecnologia

O Governo Trump foi fortemente marcado pelo maior protecionismo econômico e o acirramento dos embates com a China, sobretudo, quando se trata de protagonismo tecnológico e a chegada do 5G. Na avaliação do professor de Relações Internacionais na Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo (ESPM SP), Leonardo Trevisan, apesar de perfil mais conciliatório de Joe Biden, pouca coisa deve mudar nesta área.

"Nesta questão, quando aparece a palavra China na frente da elite norte-americana a reação é praticamente a mesma. Ambos os partidos olham a China como uma potência emergente que vai assustar a economia no mundo e que precisa ser contida o quanto antes".

Ele diz que um exemplo forte disso foi a aprovação, há quatro meses, na Câmara dos Representantes e no Senado, por quase unanimidade, das sanções em relação a Pequim.

"E a expressão mais forte dessa concorrência é a tecnologia. Na questão comercial é absolutamente possível que sentem à mesa e façam concessões, como fizeram em 2019 e neste ano, até por se tratarem de economias complementares, mas quando se fala de tecnologia e de 5G, ambos países buscam protagonismo. E não acredito que haverá recuo se Biden ganhar", diz.

Ele entende que, na atual conjuntura, na qual é projetada uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA em torno de 5%, tampouco haverá maior flexibilidade em relação às medidas protecionistas. "Não acredito que Biden vai recuar de qualquer sobretaxa já colocada por Trump. Historicamente, os democratas são muito mais protecionistas que os republicanos".

 

Algumas das propostas econômicas dos candidatos

Joe Biden

Aumento de impostos para empresas, de 21% para 28%.

Taxa mínima sobre lucros estrangeiros de 21%, acima dos atuais 10,5%.

Acelerar plano de investimento previsto para dez anos.

Investimento de US$ 2 trilhões ao longo de quatro anos, voltado principalmente para o incentivo a energias renováveis.

Impulsionar empresas ligadas ao ESG - "environmental, social and governance" (ambiental, social e governança, em português).

Donald Trump

Cortar impostos sobre salários para aumentar o salário líquido.

Manutenção dos impostos para empresas e de lucros sobre o capital no nível atual. Ele já reduziu as taxas para os atuais 21%.

Continuar sua política para atingir independência energética, priorizando o uso de combustíveis fósseis em relação às energias renováveis.

Criar 10 milhões de novos empregos em 10 meses.

Construir um grande sistema de defesa de cibersegurança. 

 

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