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Gasto com 13º salário requer cautela devido ao momento de pandemia e indefinição da economia
Economia

Gasto com 13º salário requer cautela devido ao momento de pandemia e indefinição da economia

Valor menor para quem teve contrato suspenso, indefinição para quem reduziu jornada e instabilidade justificam pé no freio
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Impacto do BEm (Foto: luciana pimenta)
Foto: luciana pimenta Impacto do BEm

No próximo dia 30 deve ser paga a primeira parcela do 13º salário para quem trabalha na iniciativa privada. Mas o benefício deve irrigar menos a economia e o orçamento das famílias neste ano, em função do impacto que o Programa de Benefício Emergencial (BEm) terá sobre a base de cálculo. Além disso, o atual cenário de instabilidade em relação ao futuro da pandemia e da economia vai exigir maior atenção na hora de decidir o melhor uso dos recursos.

No Ceará, pelo menos 9,6 mil pessoas vão receber um 13º menor neste ano. Este é o contingente de trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho suspenso na pandemia, de acordo com dados do Ministério da Economia. Para eles, o valor da gratificação natalina será proporcional aos meses efetivamente trabalhados. Mas o número pode ser bem maior se acrescidos os 14,5 mil trabalhadores que tiveram reduzida a jornada de trabalho e, consequentemente, a remuneração. Para esses trabalhadores, a situação ainda é indefinida.

Isso porque a MP do Governo Federal, que criou o programa e que depois foi convertida na Lei 14.020/2020, não diz expressamente se as medidas emergenciais, lançadas em função da pandemia, interferem na base de cálculo.

Dessa forma, há quem entenda que o considerado é o que está em vigor em dezembro e que pode ser menor se a pessoa estiver com jornada reduzida. Ou ainda que no caso da redução de 70% da carga horária, as horas trabalhadas ao longo do período não contarão para efeito do 13º por caracterizar menos de 15 dias efetivamente trabalhados.

Porém, o Ministério Público do Trabalho do Ceará (MPT-CE) entende e orienta às empresas que nos casos de redução de jornada, o cálculo deve ser feito com base no valor integral do salário. "Como a lei é omissa em relação ao 13º, entendo que deve ser aplicado o que diz a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), até porque esse foi um programa de caráter emergencial. Além disso, a própria Constituição diz que o cálculo deve ser feito sobre o salário integral", afirma a procuradora-chefe do MPT Ceará, Mariana Férrer.

Ela diz que esse foi também o entendimento preliminar da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. "Saiu o parecer, mas ainda não foi formalizada a posição pelo Ministério da Economia. Mas mesmo depois é algo que pode dar margem para discussão judicial, somente o tempo vai dizer".

Procurado, o Ministério da Economia informou que "em relação ao entendimento sobre 13º salário para trabalhadores que fizeram acordos do BEm, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional permanecem em contato para elaborar uma orientação uniforme sobre o tema. É possível que essa orientação saia ainda nesta semana".

Em função deste contexto, a orientação do pesquisador de Finanças Comportamentais da Universidade Federal do Ceará (UFC), Érico Veras Marques, é cautela. Ele explica que, como a questão é controversa, o primeiro passo é procurar saber como a empresa está fazendo a conta. A partir disso, começar a fazer o planejamento dos gastos.

"É um cenário que abre margem para várias situações. Para quem tem dívidas em atraso, o ideal é usar o recurso para reduzir o endividamento e ver o que é possível colocar em dia. Já para quem não está nesta situação, essa pode ser uma oportunidade para comprar o que precisa e até mesmo antecipar as compras de Natal e conseguir uma boa economia", afirma.

Ele reforça, no entanto, que o contexto de incertezas também exige uma atenção maior a reservas de emergências. "Está tudo meio que em suspenso, ninguém sabe realmente até que ponto a sua atividade pode ser impactada por novos picos da Covid e como isso pode rebater na questão do emprego mais na frente. Mais do que nunca é preciso ter cautela nos gastos".

Além disso, há também o já tradicional peso que o primeiro trimestre do ano tem sob os orçamentos, alerta o educador financeiro, Marcelo Leite. "O início de ano costuma ser o mais pesado, porque tem os gastos com matrículas e material escolar, impostos a pagar como IPTU, IPVA, por isso, é sempre bom guardar uma parte do 13º para esse momento".

Impacto do progrma beneficio emergencial
Foto: luciana pimenta
Impacto do progrma beneficio emergencial

 

As diferentes contas para quem teve a jornada modificada

O cálculo do 13º salário funciona da seguinte forma: o salário do trabalhador dividido por 12, multiplicado ao número de meses trabalhados por ele ao longo do ano. Ou seja, o trabalhador vai receber 1/12 avos por cada mês trabalhado. Mas como na lei que institucionalizou o Programa de Benefício Emergencial (BEm) não há referência sobre como as medidas vão rebater no recebimento, abre-se margem para diferentes interpretações.

No caso da suspensão do contrato de trabalho, a conta é simples. Se, por exemplo, a pessoa recebe R$ 2.090 (dois salários mínimos), mas teve o contrato suspenso por oito meses. Nesta situação, ela vai receber de 13º apenas R$ 696,6 (que é o resultado dos R$ 2.090 divididos por 12 e depois multiplicados pelos quatro meses efetivamente trabalhados). Uma redução de 66%. 

Por outro lado, a situação de quem teve jornada de trabalho reduzida é mais complexa, porque a pessoa não deixou de trabalhar no período.

Se prevalecer, por exemplo, o entendimento da Confederação Nacional do Comércio (CNC) em relação à legislação vigente, o cumprimento de 50% ou mais da carga horária mensal não implica desconto no valor da gratificação. Mas quem teve redução de 70% da carga horária, as horas trabalhadas ao longo do período não contarão para efeito do cálculo.

Assim, por exemplo, a pessoa que teve redução de jornada de 70% por dois meses, deverá receber o equivalente a 10/12 avos da gratificação. Ou seja, na prática, por essa lógica, uma pessoa cujo salário integral era de R$ 2.090, deveria receber R$ 1.741,67.

Para o MPT do Ceará, no entanto, a conta não é essa. O entendimento é que, como a pessoa continuou trabalhando todos os meses, ainda que por menos tempo, a base de cálculo é o salário integral. Ou seja, naquele exemplo, o 13º deveria ser de R$ 2.090.

 

Dicas para um bom uso do 13º salário

Faça um diagnóstico do seu orçamento. Ter a real noção de quanto entra de receita e sai de despesas e o levantamento de todas as dívidas existentes ajuda a olhar com maior clareza onde o dinheiro do 13º salário poderia surtir melhor resultado.

No caso de dívidas em atraso, priorizar aquelas que têm maior impacto no dia a dia ou que têm maior potencial de ficarem mais caras. Os juros do cheque especial e do cartão de crédito costumam ser os mais altos do mercado.

Caso decida fazer compras, é importante já listar o que quer e realmente precisa. A partir daí, é importante fazer pesquisas de preços. Isso evita as compras por impulso.

Guarde uma parcela do 13º salário para as despesas de início de ano, como matrículas escolares e pagamento de impostos.

Aproveite o dinheiro extra para reforçar as reservas de emergência. Fazer essa poupança é importante para eventuais imprevistos, como perda do emprego ou problemas de saúde.

Outra alternativa é aplicar os recursos, assim conseguirá somar uma quantia maior mais na frente. No atual contexto de juros baixos, é importante garantir que o investimento tenha boa rentabilidade.

 

Fábio Castelo, economista e membro do Corecon
Fábio Castelo, economista e membro do Corecon

Recomendações de melhor utilização do décimo terceiro salário

Quanto às recomendações de melhor utilização do décimo terceiro salário, que começa a ser pago agora em novembro, inicialmente, a família deve fazer em conjunto o levantamento de quanto será recebido líquido pelo casal, por exemplo. A partir daí, sabendo do valor exato, deve planejar o que fazer.

Em caso de existir dívidas, a família deve dar preferência a dívidas com juros maiores, como por exemplo cartões de crédito e cheque especial. Sempre buscando a negociação junto aos bancos/instituições financeiras, para assim reduzir os juros cobrados sobre o saldo devedor do período em aberto.

O valor economizado nestas negociações poderá ser utilizado para o pagamento ou amortização de outras dívidas, como a escola dos filhos, a prestação do carro ou do imóvel. Também para essas, deve-se tentar a negociação do que estiver em atraso.

Já em caso de família que não possui dívidas, essas podem negociar com alguns prestadores de serviço, como o próprio colégio dos filhos, desconto para pagamento das mensalidades de forma antecipada, ou seja, pagar o ano inteiro tendo uma taxa de desconto que seja maior do que a família ganharia caso aplicasse o valor recebido do décimo terceiro salário no banco, onde, por sinal, os rendimentos em renda fixa estão baixíssimos atualmente.

Fábio Castelo

economista e membro do Corecon

 

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