A carta aberta à sociedade País Exige Respeito; a vida necessita da ciência e do bom governo, referente a medidas de combate à pandemia, caiu como uma bomba no Brasil durante o fim de semana. Reunindo as opiniões e análise de cenários da mais alta classe de economistas, consultores, ex-membros da equipe econômica de governos passados, ex-presidentes do Banco Central, além de empresários e banqueiros, o manifesto trouxe série de preocupações e proposições de ações.
Em live no YouTube, o secretário executivo do Planejamento e Gestão do Ceará (Seplag) e signatário da carta, Flávio Ataliba, convidou outros cinco economistas que corroboram com o material manifesto. Lá, os convidados foram enfáticos em afirmar que a crise econômica na atual magnitude não foi causada somente pela pandemia, mas por falta de ações positivas de liderança, inação ou ineficiência, também entendem que a crise não será resolvida sem uma atuação de união nacional.
O pós-doutor em Economia pela Universidade de Princeton e professor do Insper, Marco Bonomo, avalia que a carta foi um movimento espontâneo, mas diagnóstica, com números, análises e propostas de soluções. "É muito mais comum que os economistas falem do contexto econômico, mas há uma tragédia humana. Todos os esforços devem ser colocados no combate à pandemia. Pois não haverá economia recuperada sem superar o problema da pandemia. As medidas de recuperação de setores, por exemplo, não terão efeito neste momento", analisa.
A carta ainda traz a posição dos economistas sobre o falso dilema entre a preocupação com a saúde da população versus o funcionamento da economia. A economista Sandra Rios, diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes), afirma que não existe possibilidade de recuperação econômica sem a contenção da pandemia. Ela acrescenta que esse falso dilema é preocupante, pois é endossado por autoridades e tem se tornado um discurso popular.
"É muito claro que somente as medidas de lockdown não vão resolver a pandemia, só mesmo a vacinação em massa. Mas também é claro que as medidas de isolamento é que são capazes de conter a propagação da doença. O custo político é muito alto, mas salvar vidas é a prioridade nacional, pois se não houver uma coordenação nacional e regional é muito difícil que o combate ao vírus seja bem-sucedido, principalmente quando o governo federal sabota ações tomadas por governadores e prefeitos", completa.
Produzido em duas semanas, o conteúdo divulgado no fim de semana e que agora conta com mais de mil assinaturas, surgiu de discussões num grupo de WhatsApp. Outro signatário, o economista e sócio gestor da Inter.B Consultoria Internacional, Cláudio Frischtak, destaca que o tom crítico e propositivo da carta foi medido e compartilhado no vigor correto. Na sua avaliação, o conteúdo da mensagem está em consonância com a insatisfação da sociedade.
"A carta é sóbria, sem hipérboles ou exageros. Com propostas alicerçadas em evidências. (Mesmo produzida um ano após o início da pandemia) Não chegamos atrasados, chegamos num momento crítico em que a sociedade está clamando e a carta catalisa o que muitas pessoas estão sentindo neste momento."
Frischtak ainda ressalta as opções equivocadas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), assim como a premissa de criticar ações emergenciais de governadores e prefeitos: "Houve uma primeira onda e que em novembro, havia a esperança de que a pandemia estava retrocedendo. Mas, quando a segunda onda começou, ela veio acentuada, e se juntou a outro fator, que é a combinação muito ruim de uma pandemia em fase aguda com um negacionismo, posição anticientífica do governo federal e uma crítica com os entes nacionais que estavam lidando com uma situação gravíssima".
O doutor em Economia, professor, consultor e pesquisador nas áreas de Economia, Análise Econômica do Direito e História, Thomas Conti, critica ainda a análise errônea da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o cenário difícil durante todo o período de crise. "O que há de mais robusto é que o governo subestimou a gravidade da pandemia, e isso é visto pelas posições do Ministério da Economia, de que com R$ 5 bilhões seriam resolvidos os problemas da pandemia, depois, em dezembro, de que não haveria segunda onda."
A redução do nível de atividade econômica em 2020 por causa da pandemia gerou perda de 6,8% na arrecadação tributária federal, o que corresponde a R$ 58 bilhões. E um atraso na vacinação deve gerar perdas de produto e renda na ordem de R$ 131 bilhões em 2021, supondo uma recuperação retardatária em dois trimestres. O fato, destaca o economista Paulo Ribeiro, se refere somente à União, mas ainda há o impacto de arrecadação dos estados e municípios. "Esses números deixam claro que a inação tem custos elevados para sociedade e são de difícil recuperação".
Segundo estimativas do grupo que assina a carta, R$ 22 bilhões exigiriam as fornecedoras para vacinar toda população brasileira com excedentes de doses. Esse custo se mostra muito menor do que os aportes em programas de transferência emergencial de renda, como o auxílio emergencial, e de socorro às empresas, para manutenção de empregos, que demandaram R$ 327 bilhões.