Com a porta entreaberta pelo medo da Covid-19 e também pela impossibilidade de abrir o salão de beleza, Michele Gomes, 42, enfrenta a segunda onda da pandemia com bem mais dificuldade do que em 2020. Cada vez mais sem clientes, ela resolveu mudar de ramo desde o último lockdown. Fechou as portas do salão que completaria dez anos em 2021 e passou a vender quentinhas.
A iniciativa não foi possível sem que tomasse um empréstimo com o irmão e a cunhada antes. Foi o dinheiro deles que serviu de capital de giro para ela começar a nova atividade e, assim, poder sustentar a si e ao filho, de 12 anos. No entanto, a renda não é a mesma conquistada por Michele em 2020 e muito menos do que antes da pandemia.
"Agora estamos assim: ou come ou 'luxa'. Primeiro, o essencial: alimentação, luz, água e internet, que é como me comunico com os clientes para fazer pedido e tudo. Mas estamos cortando gastos mesmo", lamenta, ao revelar que o faturamento mensal despencou 70%.
Os grupos com as clientes do salão são usados, hoje, para a divulgação do novo negócio. A principal renda dela, com a qual bancava a educação do filho e ainda empregava quatro pessoas - das quais restou apenas uma manicure até o fechamento obrigatório do negócio - ficou em segundo plano. Toda sexta, sábado e domingo, Michele vende quentinhas entre o Panamericano e a Bela Vista.
Dentro das atividades essenciais, ela se viu numa realidade tão dura quanto a do segmento anterior, vide a carestia dos itens necessários para as comidas. Não à toa, deixou de pagar a mensalidade do Microempreendedor individual em que está inscrita e ainda acumula dívidas no cartão de crédito. Questionada sobre o futuro, Michele não esconde o medo.
"Sinceramente, eu não vejo melhora. Vai ter um alívio porque você vai voltar a trabalhar não sei quando, mas não vai ganhar como antes. Todo mundo está se segurando, evitando gastar porque o futuro é incerto. Não dá para fazer uma compra, investir em algo porque você não sabe como vai ser o amanhã", desabafa.
Beneficiária do auxílio emergencial no ano passado, ela se refere às novas quantias como "piada" e dispara: "Queria que o governo (federal) me dissesse quem se sustenta com R$ 150. Ao invés de baixar o valor, as coisas estão é aumentando. R$ 100 só dá pro gás".
"Acredito que só vai normalizar quando tiver a vacina, em massa. Aí vai voltar a funcionar mesmo, com negócios girando, bares, festas que influenciam no meu ramo. Para ir ao trabalho ninguém quer fazer cabelo, unha... Pra quê?", indaga retoricamente.