Os planos de se tornar uma “empresa livre de carvão” da multinacional EDP devem significar mudanças significativas para a matriz energética do Ceará. A companhia opera usina termelétrica (UTE) Pecém I, empreendimento que contou com R$ 3 bilhões em investimentos e que gera, hoje, o equivalente a 45% da energia consumida no Estado. Instalada no Complexo Industrial e Portuário do Pecém (Cipp), o equipamento deve sofrer adaptações até 2025 para estar de acordo com os objetivos sustentáveis da companhia.
“De uma maneira muito objetiva, o nosso compromisso é ter uma matriz de geração energética 100% renovável, e tem o compromisso da empresa de até 2025 ser livre de carvão. Então, isso já implica uma decisão de negócio da nossa usina termelétrica. E isso também já está compromissado com o mercado”, afirmou Fernanda Pires, vice-presidente de pessoas e ESG da EDP Brasil, em entrevista ao CBN Sustentabilidade, conduzido pela jornalista Rosana Jatobá.
Construída entre 2008 e 2012, a UTE Pecém ou Porto do Pecém Geração de Energia SA “possui capacidade máxima de geração de energia na ordem de 5.500 gigawatts-hora, suficiente para abastecer uma cidade com aproximadamente 5,6 milhões de habitantes”, segundo a própria EDP. No entanto, para prestar este serviço, importa toneladas de carvão mineral da colômbia. O insumo está entre os de maior índice de poluição do planeta e, em alguns casos já vistos no Ceará, foi substituído por gás natural.
A mudança de combustível ou a venda do ativo não foi afirmada pela executiva.
Ao O POVO, a companhia assegurou: “A EDP nega que esteja planejando encerrar as atividades da UTE Pecém. A Companhia, em parceria com o Governo do Estado, buscará soluções técnicas para reduzir o efeito da carbonização e estender a vida útil da UTE Pecém que é um ativo altamente eficiente, que gera o equivalente a 45% da energia consumida no Ceará, e que irá continuar funcionando por seu papel essencial para o sistema elétrico do Nordeste”.
Reduzir o uso de combustíveis fósseis é uma meta que Fernanda Pires projetou para os próximos nove anos. “A gente tem um compromisso de até 2030 garantir que 100% da energia seja gerada proveniente de fontes renováveis. Este é um compromisso que a empresa já estabeleceu”, afirmou a executiva ainda ao CBN Sustentabilidade.
As declarações de Fernanda foram bem recebidas por representantes da gestão estadual, os quais apontaram a política de sustentabilidade da EDP como consoante à do Governo do Ceará, que foi pioneiro na geração de energia eólica no Brasil e lançou o projeto do hub de hidrogênio verde neste ano. Para Adão Linhares, secretário executivo de Energia e Telecomunicações da Secretaria da Infraestrutura do Ceará (Seinfra-CE), “ainda existe um ‘ranço’ na escolha do carvão como combustível das térmicas cearenses”.
Ele relembra o apagão de 2001, quando a geração de energia no País estava ameaçada de colapso e foi necessário fazer racionamento e investir em fontes cujo preço e o tempo de operação fossem os mais ágeis, para justificar a investida no carvão. Porém, atualmente, o Ceará e o Brasil vivem nova etapa e a disposição de uma empresa do porte da EDP em sinalizar uma mudança nos insumos para a produção animam o secretário executivo.
“Ter a posição de transformar a planta, de alguma forma, em sustentável, é notícia extraordinária para o Ceará e para o Brasil. Agora, a gente tem que respeitar a confidencialidade da companhia. É uma estratégia, é uma das maiores empresa de geração do mundo e com certeza tem alguma coisa”, declarou, sugerindo que deve haver planos mais consolidados para a UTE Pecém pela EDP, internamente.
Sobre a conversão dos insumos, de carvão para gás natural, Linhares afirma que deve ser o mais provável, seguindo tendência internacional do setor. Ele acrescenta ainda a possibilidade de incrementar hidrogênio verde na alimentação de usinas térmicas, uma vez que as turbinas mais modernas permitem até metade do combustível de hidrogênio verde ao mesmo tempo que gás natural na produção de energia.
Conversas sobre essa nova fonte de energia que o Ceará mira a produção já foram feitas com a EDP, segundo revela Roseane Medeiros, secretária executiva da Indústria da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet). Ela considera a mudança de combustível pela UTE Pecém como mais provável e sinaliza que a licença de operação da usina deve estar próxima de renovação, tornando estratégico a mudança de insumo. Mas descartou o incremento da nova tecnologia, por enquanto.
“Estamos apresentando a potencialidade do Estado do Ceará em hidrogênio verde a vários investidores. Além do mais, essa produção só para o mercado local não viabilizaria o investimento necessário”, afirmou, sinalizando que a participação de players como a EDP seriam mais pertinentes.