Os cerca de 3,5 milhões de cearenses que receberam o auxílio emergencial em 2020, tiveram queda em suas respectivas rendas de 32% em média durante a interrupção do pagamento do benefício entre janeiro e março deste ano. O resultado é o pior do Nordeste e o quinto mais negativo do Brasil, empatado com o desempenho da Paraíba.
Esses números constam da pesquisa do Centro de Estudos de Microfinanças e Inclusão Financeira da Fundação Getúlio Vargas (FGVcemif), com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid-19. O estudo comparou a renda que os beneficiários do programa tinham antes da pandemia de Covid-19 com outros dois cenários.
O primeiro deles foi o primeiro trimestre de 2021, período em que não houve pagamento de auxílio emergencial. Já o segundo é o do retorno dos pagamentos, iniciados na última terça-feira, 6. Nesse último cenário, o estado cujos beneficiários devem ter maior ganho de renda é a Bahia (41%). O Ceará ocupa a 9ª posição, ao lado de Mato Grosso, nesse quesito (21%).
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No total, cerca de 20 milhões de famílias brasileiras vão receber quatro parcelas de R$ 150. Outras 16,3 milhões vão receber R$ 250 e cerca de 9,5 milhões receberão R$ 375, em ambos os casos também em quatro pagamentos, totalizando pouco mais de 45,8 milhões de beneficiários, sendo pouco mais de 2 milhões de cearenses. Para efeitos comparativos, em 2020, foram pagas nove parcelas, sendo cinco com valores de R$ 600 a R$ 1.200 e quatro com valores de R$ 300 a R$ 600. O número máximo de beneficiários chegou a 68 milhões.
Segundo Lauro Gonzalez, autor da pesquisa, embora se constituam como ajuda fundamental no período de agravamento da crise sanitária e econômica, os novos valores pagos não vão conseguir repor as perdas de renda média dos beneficiários em todos os estados brasileiros. São os casos do Rio de Janeiro, do Amapá e de São Paulo, que mesmo com a volta do auxílio emergencial terão queda nos rendimentos das famílias que recebem esse benefício da ordem de 6%, 3% e 1%, respectivamente.
A única faixa do auxílio em que todos os estados apresentam ganho de renda para seus beneficiários é a de R$ 375. Ainda assim, lembra González, “esse valor representa um acréscimo onde a renda pré-pandemia era menor, mas não dá para falar em um valor ideal para todo o País. Quando o auxílio era de R$ 600, por exemplo, um beneficiário da capital paulista cobria algumas despesas essenciais, mas no interior essa mesma quantia possibilitava até pequenas reformas”.
Para o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Ceará, Reginaldo Aguiar, é preciso levar em conta também o agravamento da crise sanitária e a atual pressão inflacionária. “Na época da primeira rodada de auxílio, o quadro da pandemia era outro, com menos mortes e custo de vida menor. Esses novos valores que estão sendo pagos são absolutamente insuficientes para fazer frente às necessidades atuais”, critica.
Ele ilustra o impacto do valor da chamada cota média, de R$ 250, sobre uma família de quatro pessoas. “Trazendo isso para os itens da cesta básica, essa família hipotética teria de dividir diariamente: menos de 100 gramas de carne, um copo de leite, uma concha de feijão, três colheres de sopa de arroz, um quarto de xícara de farinha, duas batatas e meia, um tomate, dois pães, uma xícara de café, uma banana e meia, uma colher de açúcar e três colherinhas de óleo”, exemplifica.
Novo auxílio injeta no varejo oito vezes menos que valor de 2020, diz CNC
A reedição do auxílio emergencial ajudará menos as vendas do comércio varejista em 2021. Dos R$ 44,86 bilhões previstos para serem liberados à população mais vulnerável este ano, R$ 12,75 bilhões serão gastos pelas famílias no varejo, calcula a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). No ano passado, os valores disponibilizados pelo governo para pagamento do auxílio somaram R$ 322 bilhões, sendo que R$ 103,8 bilhões foram gastos no comércio varejista.
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"Ou seja, o impacto mensal sobre o varejo em 2021, embora positivo, deverá ser cerca de 8 vezes menor do que em 2020", ressaltou o economista Fabio Bentes no relatório da CNC.
O levantamento da CNC considera que 9% dos recursos disponibilizados pelo governo não sejam sacados neste ano, assim como no ano passado. A população também destinará uma fatia menor dos recursos recebidos para a aquisição de bens.
Em 2020, 35,4% dos recursos sacados chegaram ao varejo, enquanto o restante foi destinado ao consumo de serviços, pagamento de dívidas ou poupança.
Em 2021, a previsão da entidade é que as famílias destinem 31,2% dos recursos sacados para o consumo no comércio varejista, sobrando mais economias para pagamento de dívidas e poupança, por exemplo.
"Estatísticas do Banco Central mostram que o comprometimento da renda das famílias, que já se situava em nível recorde em dezembro de 2020 (28,4% da renda das famílias), aumentou ao longo do primeiro trimestre de 2021, período no qual o auxílio não estava mais disponível para a população. A CNC estima que essa proporção tenha atingido 30,3% da renda familiar em março de 2021. Assim, a tendência é que, mesmo proporcionalmente, mais recursos tenham outra destinação que não o consumo de bens", justificou Fabio Bentes.