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Mercado e especialistas veem riscos em mudança na fórmula do teto de gastos
Economia

Mercado e especialistas veem riscos em mudança na fórmula do teto de gastos

Texto-base da PEC dos Precatórios aprovado por comissão prevê ainda limitação no pagamento das dívidas judiciais da União, o que foi interpretado por analistas como ‘pedalada fiscal’
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As mudanças feitas na PEC dos Precatórios são postas como garantia para pagamento do Auxílio Brasil a quase 17 milhões de brasileiros (Foto: Thais Mesquita)
Foto: Thais Mesquita As mudanças feitas na PEC dos Precatórios são postas como garantia para pagamento do Auxílio Brasil a quase 17 milhões de brasileiros

O acordo fechado ontem pela manhã com o intuito de viabilizar o novo programa de transferência de renda do governo Jair Bolsonaro, o ‘Auxílio Brasil’, que culminou com a aprovação do texto-base da chamada PEC dos Precatórios em Comissão Especial na Câmara dos Deputados à noite, gerou forte reação negativa nos mercados. O documento aprovado prevê ainda limitação no pagamento de precatórios, permitindo descontos e reajuste pela taxa Selic.

O dólar teve forte alta e chegou a R$ 5,66, também impactado pela alta da moeda estrangeiro no mercado Externo, e a Bolsa despencou 2,75%. As reações negativas no mercado já vinham se desenhando desde o dia anterior, após declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que o governo poderia pedir um ‘waiver’, espécie de ‘licença para gastar’ estimado em R$ 30 bilhões, e se acentuaram com a confirmação de que a nova versão da PEC dos precatórios traria uma mudança no cálculo do teto de gastos. Pela nova fórmula, seria aberto um espaço de R$ 83,6 bilhões para despesas adicionais em 2022.

O montante cobriria a necessidade de R$ 51,1 bilhões para o novo programa social que prevê reajuste permanente de 20% (mais a parcela temporária) para chegar aos R$ 400 prometidos pelo presidente da República em visita ao Ceará, na quarta-feira, 20. Em um ano eleitoral, os outros R$ 32,5 bilhões ainda possibilitariam ao governo aumentar os gastos com emendas parlamentares, entre outras medidas que geram temor de descontrole nas finanças públicas e aumento no risco para os investidores.

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A polêmica proposta altera a fórmula do teto, que hoje é corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulado em 12 meses até junho do ano anterior ao de sua vigência, e passa a considerar a inflação de janeiro a dezembro. Essa mudança, por si só, proporcionaria uma folga extra de R$ 40 bilhões. Os outros R$ 43,6 bilhões viriam quase integralmente da previsão de uma limitação do pagamento de precatórios (dívidas judiciais).

Em 2016, quando foi votada a criação do teto de gastos, chegou-se a cogitar que a correção do limite se desse pela inflação fechada do ano. Mas o formato final acabou privilegiando a inflação acumulada em 12 meses até junho porque a proposta de Orçamento é entregue até 31 de agosto do ano anterior ao de sua vigência. Saber de antemão a variação do teto facilita o processo de elaboração da peça.

A manobra costurada ontem também é vista de forma negativa por analistas. Para o executivo Alexandre Netto, da Acqua Vero Investimentos, "Guedes perdeu a credibilidade com uma série de decisões, como a taxação de dividendos, o aumento do IOF, a questão dos precatórios, que representa um calote, e agora o rompimento do teto. Ele já não tem mais condições de ancorar as expectativas do mercado”.

Confira o Economia na Real sobre a PEC dos Precatórios

Para Gabriel Quintanilha, professor convidado da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito, do Rio de Janeiro, em participação no programa Economia na Real de O POVO, “o conceito mais importante a se compreender é que o precatório é uma dívida judicial. Pagá-lo não é um favor. O que está sendo feito agora é ainda pior que a pedalada fiscal que resultou no impeachment da ex-presidente Dilma”.

Juliana Damasceno, pesquisadora em finanças públicas do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV), destacou, também durante o programa, que com a manobra “o governo reconhece que não está com o controle das contas públicas. Por isso, que essa alteração foi recebida pelo mercado como um calote.”

Ela lembra, contudo, que “quando o teto foi criado a ideia era controlar a dinâmica dos gastos e se dizia que com esse limite se gastaria melhor, mas o que vimos é que isso não é verdade. Basta ver que estamos com um censo adiado e universidades sucateadas”;

O Economia na Real acontece todas as quintas-feiras, às 17h30, nas principais plataformas do O POVO. No comando do programa a editora-chefe de Economia do O POVO, Adailma Mendes. (Com agências)

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