A demora nas negociações sobre um novo socorro financeiro bilionário pode gerar um colapso na cadeia de pagamentos do setor elétrico. Sem previsão para a captação dos recursos com os bancos, distribuidoras pediram à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) o adiamento do pagamento de encargos, que somam R$ 5 bilhões por mês, voltados a garantir a segurança do sistema, referentes a novembro e aos meses seguintes, até que o empréstimo seja concretizado.
A operação de crédito está prevista em uma medida provisória (MP) editada pelo Governo Federal, mas ainda é necessária a publicação de um decreto presidencial que detalhe as condições do financiamento. Depois disso, a agência reguladora terá de regulamentá-lo, um processo que envolve abertura de consulta pública e prazo para receber contribuições de agentes do setor elétrico e da sociedade.
A previsão é de que essa discussão seja finalizada apenas em março. Se a Aneel aceitar o pleito, as empresas ficariam sem pagar as taxas até abril.
O pedido diz respeito ao pagamento do Encargo de Serviços do Sistema (ESS), taxa para manter a estabilidade do sistema elétrico majoritariamente repassada para que usinas térmicas possam adquirir combustíveis fósseis para abastecê-las.
As concessionárias de distribuição funcionam como o caixa do setor: é por meio da conta de luz que elas arrecadam dinheiro para pagar toda a cadeia, que inclui geradoras e transmissoras, e repassar impostos federais, estaduais e taxas municipais.
Encaminhado pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) à diretoria da Aneel, o ofício, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso, expõe a situação financeira crítica em que as empresas do segmento têm operado.
O motivo são os altos custos decorrentes de medidas adotadas pelo governo para enfrentar a crise hídrica e evitar um racionamento, além de apagões. De acordo com a entidade, nem mesmo a cobrança de um patamar mais elevado da bandeira tarifária foi suficiente para fazer frente aos custos de compra de energia nos últimos meses. Desde setembro, as contas de luz trazem a bandeira "escassez hídrica", que acrescenta R$ 14,20 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos.
"A circunstância de grave déficit das concessionárias distribuidoras já configurada em setembro de 2021 se agravou e se encontra na iminência de inviabilizar o fluxo regular de pagamentos dos componentes da cadeia de setor elétrico, paralisando o pagamento de encargos setoriais, transmissores e geradores e a própria liquidação financeira da CCEE", diz a entidade, que pediu à Aneel uma medida cautelar para adiar os pagamentos.
Em nota à reportagem, a Abradee disse contar com a sensibilidade da Aneel, dado o momento do setor elétrico. A associação defende a adoção da medida até o fechamento da estruturação das operações de crédito voltadas a cobrir o descasamento de pagamentos ao longo dos elos do setor, "com o fortalecimento da liquidez nas distribuidoras e a suavização do repasse dos custos excepcionalmente incorridos ao consumidor."
"O segmento de distribuição é a principal fonte arrecadadora de recursos no setor, realizando pagamentos para os segmentos de geração, transmissão, além de encargos e tributos. A mais severa escassez hídrica observada nos últimos 91 anos, somada à restrição energética global com reflexo no preço dos combustíveis fósseis, aumentou sobremaneira os custos de geração de energia no Brasil. No mercado regulado, isso se traduz automaticamente em pressão insuportável no caixa das concessionárias de distribuição de energia elétrica", disse o presidente da Abradee, Marcos Madureira. (Agência Estado)