Mesmo com cada vez menos espaços para se estacionar gratuitamente na cidade de Fortaleza, a notícia divulgada pela Fraport, concessionária do Aeroporto Internacional Pinto Martins, na última terça-feira, 19, de que cobraria R$ 20 a cada 10 minutos (ou R$ 120 por hora) que um veículo permanecer parado na área de embarque e desembarque do equipamento desencadeou uma onda de manifestações contrárias à iniciativa.
E não se trata apenas de uma reação a mais um aumento, mas também à desproporção da cobrança em relação aos preços praticados pelo mercado, inclusive pelo próprio setor aeroportuário. Para se ter uma ideia, entre as modalidades mais baratas de estacionamento pago em Fortaleza está o rotativo Zona Azul, de cobrança municipal. Cada cartão custa R$ 2, ou 60 vezes menos que o pretendido pela Fraport.
Nos shoppings da cidade, há quem cobre R$ 5 pelas primeiras 3 horas e um adicional de R$ 1 a cada hora em que esse tempo seja ultrapassado. Isso significa que a cada 4 horas, o cliente paga R$ 6, enquanto pagaria R$ 480 no aeroporto de Fortaleza. Mesmo no shopping que cobra mais caro por um período equivalente, que chega a R$ 10,50 somando R$ 9 pelas primeiras 3 horas mais R$ 1,50 por uma hora adicional, essa proporção é 45 vezes menor.
Já nos estacionamentos do Centro da Capital, segundo apurou O POVO, esses valores variam de R$ 4 a R$ 8 por hora, a depender da localização e do porte do veículo. Ou seja, mesmo que você tenha um automóvel grande e escolha o estabelecimento com maior valor cobrado, ainda assim pagará 15 vezes menos que se ficar 60 minutos parado no meio fio do aeroporto de Fortaleza.
Em outro registro de comparação, a tarifa de estacionamento do próprio aeroporto sai mais em conta que a cobrança anunciada pela Fraport, pois custa R$ 18 para a primeira hora de permanência, sendo cobrado um adicional de R$ 3,50 para cada 15 minutos após esse período (ou R$ 14 a hora extra). Assim, em duas horas o cliente pagaria R$ 32, contra R$ 240 se parar no meio fio.
Na comparação com alguns dos principais aeroportos do País, o valor mais caro pode ser pago em uma área especial em Guarulhos, no estado de São Paulo, onde o consumidor pagaria R$ 32 por uma hora e mais R$ 26 pela hora adicional, totalizando R$ 58. Ainda assim, quatro vezes menos que o anunciado pela concessionária do aeroporto de Fortaleza.
Embora tenha divulgado também que algumas categorias ou modalidades de veículos ficariam isentos da cobrança ao passar pelas cancelas que dão acesso ao espaço, desde que utilizando um ticket e parando em locais pré-determinados, tais como os taxistas credenciados, a medida despertou críticas também de quem trabalha com transporte de passageiros.
Para o presidente do Sindicato dos Taxistas do Ceará (Sinditáxi-CE), Francisco Moura, para a categoria "é impossível desembarcar um cidadão em 10 minutos, que vai pagar a corrida no cartão ou pix e tirar a bagagem. A Fraport já fatura um absurdo com estacionamento. Isso é absurdo e mais um golpe da multinacional que agora resolveu privatizar uma via pública".
Procurada para se manifestar sobre o projeto e sobre os questionamentos de órgãos de defesa do consumidor, a concessionária tem se limitado a informar que “prestará todos os esclarecimentos necessários”. (Colaborou Beatriz Cavalcante)
Entidades estudam ação contra Fraport Brasil
"Não se pode cobrar para organizar trânsito". Essa é a posição de Claudia Santos, presidente da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados Secção Ceará (OAB-CE), em relação à cobrança de R$ 20 a cada 10 minutos aos motoristas na área de embarque e desembarque do Aeroporto de Fortaleza.
Ela frisa que a medida pode ser feita sem levar o ônus a quem vai deixar ou levar passageiros, precisando parar no meio-fio da entrada do terminal aeroportuário. A crítica de Claudia foi detalhada na rádio O POVO CBN, ontem, em entrevista aos apresentadores do O POVO no Rádio, Jocélio Leal e Rachel Gomes.
Questionada se a empresa alemã administradora do Aeroporto pode cobrar, já que tem a concessão do espaço, ela frisa que mesmo assim a Fraport tem de respeitar o Código de Defesa do Consumidor, que é uma lei federal.
O presidente da Associação Cearense de Defesa do Consumidor (Acedecon), Thiago Fujita, também contesta o argumento da Fraport sobre a intenção de organizar o trânsito na área.
"Caso estejam demorando os carros naquela área a competência para punir é dos órgãos de trânsito. Você não pode restringir o direito da pessoa deixar um passageiro, criando uma tarifa abusiva. A criação de tarifas, além de desproporcional, não tem previsão legal para acontecer na forma como apresentada", argumenta.
Além de OAB-CE, o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon), do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), instaurou, na quarta-feira, 20, Procedimento Administrativo para investigar possíveis infrações ao CDC e normas de trânsito vigentes pela Fraport Brasil S.A.
O Departamento Municipal de Proteção e Defesa dos Direitos do Consumidor (Procon Fortaleza) também busca investigar se a taxa adotada fere o Código de Defesa do Consumidor.
Caso seja constatada a violação do código do direito do consumidor a empresa responderá a processo administrativo. A depender do andamento do caso, as penalidades variam entre termo de ajustamento de conduta, aplicação de multas de até R$ 15 milhões e mesmo a interdição do local. (Colaboraram Adriano Queiroz, Alan Magno, Armando de Oliveira Lima e Samuel Pimentel)