Um panorama da filantropia no Brasil foi realizado na edição do Censo Gife (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas) 2022-2023 e, segundo o balanço, foi investido um valor total de R$ 4,8 bilhões entre as organizações que participaram da pesquisa.
Os dados relativos ao ano de 2022 e publicados em 2023 foram apresentados em encontro realizado na sede do Grupo O POVO na manhã de quinta-feira, 16.
O evento, com a temática “(re)Pensar o papel da filantropia e do Investimento Social Privado à luz do Censo Gife”, contou com representantes de empresas e organizações e reuniu integrantes do Grupo. A realização deste momento se dá depois do lançamento da Rede de Investidores Sociais (RIS) do Ceará no fim do ano passado.
Ao todo, 137 organizações associadas ao Gife, incluindo a Fundação Demócrito Rocha (FDR), responderam o Censo, coletado entre abril e maio de 2023, equivalente a 82% do número total de membros da entidade.
Entre os tipos de organização, estão as empresariais, independentes, familiares e empresas.
O valor total investido entre as organizações em 2022 foi de R$ 4,8 bilhões, configurando um aumento de 20% em relação ao número registrado na edição anterior.
Patricia Kunrath, coordenadora de Comunicação do Gife, considerou o valor como positivo por estar acima da média histórica.
“A gente celebrou esse valor, que é um valor que não caiu a patamares anteriores à Covid. A gente vinha ficando em uma média histórica de R$ 3,3, R$ 3,5 bilhões. Na Covid, isso excedeu e foi a R$ 6,1 bilhões, mas a gente sabe que muito era de recurso emergencial. Embora a gente saiba que tem muito espaço para crescer e que a gente gostaria de ver esse número muito mais expressivo, ainda assim ele foi considerado um bom número por estar acima da média histórica”, analisou.
Para Bia Fiuza, cofundadora do Instituto de Música Jacques Klein e conselheira no Gife, o valor é preocupante, principalmente em um contexto de maior desigualdade social e de concentração de recursos em grandes famílias e empresas.
“O que a gente vê a partir dessa pesquisa é que o volume de recursos privados alocados estagnou. Em dez anos, a gente se manteve no mesmo patamar. Houve um aumento no período da pandemia, que foi pontual, mas a gente volta para um patamar de dez anos atrás. Isso é preocupante, considerando que a gente tem uma maior desigualdade social hoje, existe um maior volume de recursos concentrado nas grandes famílias e nas grandes empresas e a gente não está vendo um maior volume de doações acompanhar esse movimento”, explicou.
Ainda em relação aos investimentos, o Censo sugere um aumento de recursos para 2023, estimando um valor total de R$ 5,6 bilhões.
O Censo Gife analisou os focos de atuação dos investidores sociais, analisando os temas prioritários das organizações.
A educação continua como o maior foco de atuação das organizações, assim como apresentado na edição anterior do levantamento. A área foi apontada por 71% dos respondentes do Censo 2022-2023, valor equivalente à soma das áreas de educação não formal, desenvolvimento local, territorial e/ou comunitário e educação formal)
Sobre o valor investido, os números também se concentram na área da educação, com R$ 2 bilhões investidos (42% de todo o recurso investido em 2022), seguido pela área de cultura e artes, com R$ 420 milhões de reais.
Segundo o Gife, a região Sudeste concentra a maior atuação das organizações. Entre as 137 respondentes, apenas quatro têm sede no Nordeste: duas na Bahia e duas no Ceará (Fundação Demócrito Rocha e Instituto de Música Jacques Klein).
“Ainda existe um universo muito grande de formatos para serem explorados [...] Existem espaços e lacunas a serem ocupados em direitos humanos, equidade racial, equidade de gênero, conservação do meio ambiente. O que a gente sente é que nós temos um campo aberto ainda no Ceará a ser trabalhado, seja pelo aumento no investimento alocado nesses temas, seja pela diversificação maior de estratégia e de ferramentas que a gente trabalha aqui”, analisou Bia Fiuza.
A publicação também apresenta uma seção sobre governança e diversidade, apontando dados sobre a composição dos conselhos deliberativos das organizações a partir de um recorte sobre gênero e raça.
Segundo o Censo, o percentual de mulheres que ocupam espaço nos conselhos chegou a 34%, um aumento se comparado aos 27% observados em 2014. No entanto, levando em conta números absolutos, foi registrada uma redução de 311 para 307 mulheres.
A última edição do Censo também aponta que 66% dos conselheiros são homens e 1% pessoas não-binárias.
O balanço ainda aponta que, considerando o ritmo de variação na composição dos conselhos deliberativos observados nos últimos anos, será preciso cerca de 20 anos para que exista uma igualdade no número de homens e mulheres como conselheiros.
Considerando as 103 organizações que têm conselho deliberativo e informaram cor/raça dos conselheiros no Censo, 92% são pessoas brancas, 7% negros, 1% amarelos/orientais e apenas 1 pessoa indígena.
A partir dos números observados de 2016 a 2022, o levantamento apontou que poderá levar mais de 60 anos para que todas as organizações declarem ao menos uma pessoa negra na composição de seus conselhos deliberativos.
Mais detalhes sobre os dados e conclusões do Censo podem ser acessados no site do Gife. Além do levantamento, a coordenadora Patricia Kunrath afirmou que o Grupo também está produzindo uma pesquisa qualitativa sobre a temática.
“A gente já está fazendo essa pesquisa, em parceria com o Instituto Cíclica, do Rio Grande do Sul. Eles estão conduzindo grupos focais com representantes do investimento social privado da filantropia associados à rede do Gife. É uma pesquisa com associados, novamente. Vão realizar cerca de 20 entrevistas em profundidade para a gente entender como se comporta o campo do investimento social privado, quais são as principais barreiras, os desafios, onde se vê potencial de crescimento”, detalhou.
Gênero
O percentual de mulheres que ocupam espaço nos conselhos deliberativos das organizações chegou a 34%, um aumento se comparado aos 27% observados em 2014, segundo o Censo Gife