O plano do Governo do Ceará para remediar os efeitos da taxação de 50% sobre a maioria dos produtos mais relevantes na pauta de exportação cearense aos Estados Unidos envolve compras públicas e estreitamento de laços comerciais com a China. O anúncio foi feito nessa quinta-feira, 31, pelo governador do Estado, Elmano de Freitas (PT).
Elmano ainda confirmou que o Governo Federal também adotará medidas para diminuir o impacto do endurecimento dos critérios para entrada no mercado americano, principal parceiro comercial do Ceará, respondendo por mais de 50% da balança comercial.
Nesta sexta-feira, 1º, o governador deve estar reunido, em Brasília, com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Outra frente prioritária para Elmano envolve o diálogo com órgãos federais para dar maior agilidade no desembaraço de mercadorias nos portos cearenses antes do início da taxação.
Em pronunciamento divulgado nas redes sociais, o chefe do Executivo estadual afirmou que a taxa de 50% imposta pela Casa Branca é absurda e injustificável. Apesar da confirmação de quase 700 exceções, grande parte dos produtos cearenses exportados ao país ficaram de fora.
Elmano também confirmou apuração do O POVO e destacou que estuda a realização de compras públicas de produtos de empresas exportadoras prejudicadas pelo tarifaço de Trump, principalmente os perecíveis, para serem utilizados em programas sociais e equipamentos públicos do Estado, como o Ceará Sem Fome e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Medidas econômicas também estão na pauta, mas, segundo enfatiza o governador, nenhuma ação colocará em risco o equilíbrio fiscal do Estado, considerado "prioridade absoluta". Para isso, estão realizando os estudos as secretarias estaduais da Casa Civil, Fazenda (Sefaz) e Procuradoria-Geral do Estado (PGE).
Ontem, por volta de 18 horas, foi realizada reunião com os setores mais atingidos, na sede do Governo. Foram convocados os representantes dos setores de pescados, castanha de caju, água de coco, cera de carnaúba, couros e calçados.
"Neste momento difícil, estou ao lado das nossas empresas e nossos produtores, do maior ao mais humilde, para minimizar os impactos em seus negócios e para que os empregos dos cearenses sejam preservados. Estamos preparando uma série de medidas de apoio em parceria com o Governo Federal e em permanente diálogo com os setores", afirma.
Sobre a ampliação da parceria com o mercado chinês, Elmano confirmou que terá agenda no Consulado da China. "Temos reunião marcada (com o consulado chinês) na busca pelo fortalecimento de novos mercados."
Já em relação às compras públicas, há dias o governador sinalizava a intenção de comprar os pescados que não fossem exportados aos Estados Unidos por conta da tarifação. A ideia de Elmano é ter peixe nas refeições de escolas, universidades e outros equipamentos públicos, além de servir o item nas 130 mil refeições diárias servidas pelo Ceará Sem Fome.
Além dos pescados, outro produto pode entrar nesta mesma estratégia do governo: a castanha de caju. Sem possibilidade de escoamento por conta da tarifa, a equipe palaciana vê a possibilidade de também incluir o produto na cesta de alimentação das compras públicas do Estado. Há também a perspectiva de buscar a parceria do Governo Federal para que promova o mesmo movimento.
Esse é um dos motivos da agenda com Haddad. O governador também quer conversar com o vice-presidente Geraldo Alckmin para definir plano de ação. "No que diz respeito à relação comercial com países, você não faz negociação com estados isoladamente. Vamos saber que medidas o governo brasileiro vai adotar e vamos ter garantias de que a economia cearense esteja incluída".
Indústria de castanha despacha em um dia metade da produção do mês
Após a confirmação pela Casa Branca de que cargas em trânsito aos Estados Unidos permanecerão com taxação sem o acréscimo de 40% caso tenham sido embarcadas antes de 6 de agosto, os setores aceleraram o envio marítimo de cargas ao país.
Um das empresas que fez isso foi a Usibras, indústria de castanha de caju com sede no Ceará. A diretora Comercial, Cinthya Assis, revela que somente ontem dez contêineres da companhia foram despachados.
O número equivale à metade das cargas enviadas aos EUA durante um mês inteiro. Essa força tarefa foi necessária para aproveitar a janela de oportunidade antes da taxação - ainda que existam riscos pelo prazo apertado. "Se o navio atrasar, estamos no risco de sermos taxados em 50%. Daí teremos de trazer o navio de volta, pois eu não consigo arcar com a taxa".
Sobre a ideia do governo de abrir o mercado chinês, destaca que, para o seu segmento, é difícil exportar para a Ásia por questões competitivas, já que a maioria dos concorrentes internacionais são asiáticos, como Índia e Vietnã.
Outro setor que segue apreensivo com a taxação de 50% é o da cera de carnaúba. Conforme o Sindicato das Indústrias Refinadoras de Cera de Carnaúba no Estado do Ceará (Sindcarnaúba), há risco de perder cerca de 1/4 da produção na próxima safra caso o item não seja incluído na lista de exceções.
"A gente entende que foi uma decisão apressada. Parece que não houve uma análise detalhada sobre quais produtos manter ou tirar dessa lista", comentou Edgar Gadelha, presidente do Sindcarnaúba.
Exportada há mais de 150 anos, a cera é considerada uma das matérias-primas mais tradicionais da região e tem os Estados Unidos como um de seus principais mercados.
Edgar explica que a taxação ocorre justamente no início da safra 2025 — período que costuma durar de quatro a cinco meses e costuma movimentar cerca de 70 mil trabalhadores diretamente no campo.
A produção da cera de carnaúba é amplamente distribuída em diversas regiões do Ceará, como o Vale do Jaguaribe, Vale do Coreaú, Chapada da Ibiapaba e Sertão Central. Municípios como Eusébio, Itarema, Fortaleza, Russas e Maracanaú estão entre os principais exportadores do Estado. (Colaborou Mariah Salvatore/Especial para O POVO)