A briga dos 19 clubes da primeira divisão do Campeonato Brasileiro com o Flamengo-RJ ainda não acabou. Há uma possibilidade de haver outros capítulos sobre a presença de torcida nos estádios que podem paralisar a competição. A chance é remota, mas existe. E não é uma decisão simples. Ela precisa estar alinhada com patrocinadores, TVs e, principalmente, Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Há indicações de que a entidade estaria de braços dados com os clubes reclamantes desta vez e em pé de guerra com o time carioca, que abraçou uma liminar para conseguir o direito de vender ingressos para suas partidas — o primeiro foi ontem contra o Grêmio, na Copa do Brasil. São três jogos seguidos, um deles ainda pela Copa Libertadores e outro pelo Campeonato Brasileiro.
Em reunião na sede da CBF para discutir o assunto semana passada, somente o Flamengo não mandou representante. Na ocasião, ficou decidido que os times da Série A não abririam os portões de seus estádios nesse momento da pandemia. Todos eles acordaram de esperar o avanço da vacinação contra a Covid-19 pelo menos por mais 30 dias, quando o assunto será novamente tratado. De posse de uma liminar, o rubro-negro carioca não vai seguir a regra e terá torcida, por exemplo, no jogo desta quarta no Maracanã pela Copa do Brasil.
"Desde que as autoridades públicas permitiram o retorno do futebol sem público (sic), o Flamengo sustenta, de forma clara e inequívoca, que não cabe à CBF ou aos clubes deliberar acerca da existência ou não de público nos estádios, por não se tratar de matéria de sua competência desportiva", informou o Flamengo.
Os demais clubes ensaiam parar o Campeonato Brasileiro se isso acontecer nas partidas da competição nacional. Há dois caminhos. O primeiro, e mais radical, é forçar a CBF a desmarcar a rodada se isso acontecer. O segundo é jogar para frente apenas as partidas de quem quer vender ingresso agora, no caso, o Flamengo. Por enquanto apenas o time carioca assumiu essa postura deliberadamente. Há outros times que vão se valer do torcedor em torneios da Libertadores, mas estes pretendem respeitar a decisão em bloco de estádios vazios no Brasileirão, caso, por exemplo, do Atlético-MG.
A Prefeitura de Belo Horizonte decidiu pela liberação de até 30% da capacidade do Mineirão após evento-teste desastroso. Os clubes do Rio Grande do Sul também estão na iminência de abrir seus portões, mas ainda não o fizeram. Estão com os 19.
O assunto da liberação do torcedor está na pauta da CBF e das secretarias estaduais de saúde, assim como dos governadores de Estados. O tema será tratado novamente em outubro. Em São Paulo, ficou estipulado pelo governador João Doria que as arenas terão a volta do torcedor em novembro, mesmo mês da realização do GP de São Paulo de Fórmula 1, cujos ingressos já estão sendo vendidos. Os clubes paulistas tendem a seguir a orientação respeitando os perigos da contaminação da doença.
Ocorre que há um problema nisso que desrespeita as orientações de isolamento da pandemia. Trata-se das aglomerações nas imediações das praças esportivas. No jogo desta terça na Vila Belmiro, do Santos contra o Athletico-PR, não havia torcedor dentro do estádio, mas todos eles estavam nas ruas, em frente ao portão principal e nos bares das imediações.
A CBF tem, em sua mesa, um pedido para desmarcar a rodada. O Flamengo enfrenta o Grêmio no fim de semana, domingo, às 20h30min. Há mais nove jogos. As bravatas desse tipo no futebol, no entanto, nunca dão em nada. A CBF jamais tomou decisões desse tipo, nem perto disso. O calendário não comporta mais datas. Se desmarcar, terá problemas para remarcar.
O problema, por enquanto, diz respeito somente ao Flamengo, de modo que Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) não teve forças para impedir que um time do Rio de Janeiro nadasse contra a corrente. A CBF vai aceitar, principalmente também pela falta de comando desde o afastamento do presidente Rogério Caboclo pela denúncia de assédio moral e sexual.
O presidente do STJD, Otávio Noronha, deferiu o pedido de intervenção dos clubes para atuarem como terceiros interessados na Medida Inominada do Flamengo, mas negou reconsideração para revogar a liminar que liberou a presença de público nos jogos do clube carioca em competições nacionais. A decisão foi tomada na noite desta terça. Isso só prova que o Rubro-Negro é forte dentro de campo e também nos bastidores.
Neste momento da discussão, a briga já nem diz tanto respeito à pandemia, aos perigos de contaminação com a Covid-19 dentro dos estádios e possível morte de pacientes, mas sim ao fato de um time de futebol ter mais regalias do que outros na mesma competição — como a presença de sua torcida na arquibancada. A CBF tem até sexta-feira para se manifestar, mas poucos acreditam que não haverá futebol no Brasil no fim de semana.