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Gabriel Believe: "Podemos praticar exercícios físicos mesmo numa cadeira de rodas"
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Gabriel Believe: "Podemos praticar exercícios físicos mesmo numa cadeira de rodas"

Vítima de violência urbana, Gabriel Believe ficou paraplégico, mas não se deu por vencido e nunca deixou de acreditar. Ele abraçou os esportes para superar as dificuldades e hoje é exemplo de inspiração para as pessoas
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Gabriel Believe, atleta de Crossfit, é o personagem dos Dois Dedos de Prosa (Foto: Roni Vasconcelos)
Foto: Roni Vasconcelos Gabriel Believe, atleta de Crossfit, é o personagem dos Dois Dedos de Prosa

Acreditar. Essa é a palavra que define Gabriel Araújo Pereira da Silva, 25, ou Gabriel Believe, como é conhecido. Vítima de violência urbana em Fortaleza há seis anos, ele foi confundido com um criminoso na rua de casa e sofreu quatro tiros, um deles acertou a coluna, o deixando paraplégico a dois dias de completar o 20º aniversário.

O jovem, que sonhava em ser jogador de futebol, perdeu a mobilidade nas pernas e contou com o imenso apoio da família e amigos para poder seguir em frente. Mesmo tendo a oportunidade de "nascer de novo", ele virou um fantasma na escola onde estudava, que sumiu o histórico de notas dele após o acontecido e resultou no encerramento temporário dos estudos.

Apesar das dificuldades de acessibilidade que encara no dia a dia na capital cearense, foi na Believe Calistenia que Gabriel foi acolhido e lá encontrou um novo propósito e novos sonhos, se tornando o primeiro cadeirante da equipe e também um atleta profissional, colecionando conquistas no primeiro ano de competições.

A história de superação de Gabriel Believe inspirou muitas outras pessoas, não é à toa que ele possui mais de 60 mil seguidores no Instagram, onde compartilha a rotina de treinos e também trabalha como influenciador digital.

Em entrevista ao O POVO, Gabriel conta que não há dúvidas de que a vida dele se transformou para melhor. Apesar da lesão na coluna, o jovem não abandonou o futebol, a primeira paixão, e também é praticante de Crossfit e mergulhou no surfe. O novo sonho dele? Ser campeão mundial, mesmo depois de já ter vencido o mundo.

O POVO – Você se sentiu invisível pela sua escola quando eles sumiram com o seu histórico?

Gabriel - Com certeza. Querendo ou não você se sente um fantasma. Porque eu estava na escola e no primeiro bimestre ela devolve as provas e eles não dão nem as notas. Quando fui lá pegar o histórico, disseram não estava mais lá. É como se eu nunca estivesse estudado lá. Mas eu nunca deixei de sonhar e nunca abandonei o desejo de terminar meus estudos.

O POVO  – Você falou que jogava futebol e tinha esse sonho de ser jogador, pode se aprofundar nessa questão?

Gabriel - O futebol era um dos meus sonhos. Sempre me imaginei jogando um dia. Quem não deseja isso? Mas infelizmente eu não vou poder ser um jogador de futebol, mas isso não quer dizer que eu nunca vou poder jogar bola, né? E se Deus quiser posso voltar a andar e retornar a jogar bola, já joguei até na cadeira de rodas. Então, eu andando ou não, vou continuar jogando bola porque eu amo futebol. Apesar dessa fatalidade, o futebol jamais saiu de dentro de mim.

O POVO – Existe algum jogador de futebol que você se inspirava e continua se inspirando mesmo depois do drama que você viveu? Se sim, por que esse jogador?

Gabriel - Cristiano Ronaldo. Por sua determinação e disciplina!

O POVO – É normal que sonhos mudem na vida das pessoas. No seu caso, sua vida mudou da noite para o dia. Qual o seu maior sonho hoje?

Gabriel - Atualmente, um dos meus maiores sonhos é ser campeão mundial pelo Crossfit.

O POVO – Como foi sua introdução na Calistenia?

Gabriel - Quatro anos atrás eu conheci a Believe Calistenia, na Praça Portugal, que hoje eu faço parte e sou atleta deles. Eu cheguei até perguntar para eles se eles tinham cadeirantes na equipe deles, aí eles falaram que não, mas eu poderia ser o primeiro, então eu abracei aquela ideia. E o Ruan Noa, que é meu professor, conversou bastante comigo e ele quem adapta meus treinos. Eles até colocaram um espaço na Praça das Flores para ficarem mais perto de mim. O Ruan sempre se dedicou para incluir o Biel dentro da Calistenia, dentro do esporte, e mostrar para o Biel e para uma pessoa cadeirante que estamos inclusos, sim, nos esportes, que estamos inclusos na Calistenia e que podemos praticar exercícios físicos mesmo numa cadeira de rodas.

O POVO – Como essas atividades melhoraram sua vida?

Gabriel - Isso melhorou muito meu alto-astral, me deu mais ânimo, me ajudou a sonhar, a superar a mim mesmo e atuar como profissional, além de trazer um pouco de conforto pra minha família, tanto no físico quanto no emocional, né? Porque uma tragédia como essa não atinge só o Biel, mas a minha família também sente. Então a minha família me vendo dentro do esporte, superando a mim mesmo, eles ficam um pouco confortáveis. Nenhuma mãe, nenhuma família quer ver um filho em uma cadeira de rodas. Mas a cadeira de rodas não é o fim do mundo, só é o começo de uma nova história. E minha família vendo que eu estou bem, que eu estou feliz onde eu estou, eles ficam bem também, eles ficam felizes.

O POVO – Desde que começou a praticar Crossfit e Calistenia, quais as maiores dificuldades que você já teve? E como as superou?

Gabriel - Ainda lido com essas dificuldades todos os dias. A acessibilidade em Fortaleza não é 100% para um cadeirante, mas em meio às dificuldades eu tento transformá-las em combustível para avançar. Quando eu vou para o treino não pego ônibus e nem Uber, sempre vou no braço mesmo.

O POVO – Você recebeu algumas premiações ano passado. Pode falar mais sobre as competições que disputou no ano passado?

Gabriel - Em 2022 foi meu primeiro ano de competição. Eu fiquei em sétimo lugar do Open Crossfit Games, sendo o terceiro colocado do Brasil. Depois eu fui para o Monstar Games, em Goiânia, e lá eu fiquei em primeiro lugar. No Rio de Janeiro disputei o Carioca Games e fiquei em segundo.

O POVO – Quais torneios disputará em 2023? Quais suas expectativas?

Gabriel - Por enquanto, o Open 2023 da Crossfit Games. Uma das expectativas que eu priorizo é ser melhor que no ano passado.

O POVO – No surfe, você pratica como hobby ou também profissionalmente?

Gabriel - No surfe eu não atuo como profissional ainda. Sou amador, mas eu já competi ano passado e fiquei em terceiro lugar. Se Deus quiser, quero participar do Mundial um dia.

O POVO – O surfe foi incluído como esporte olímpico em 2020, mas ainda não é esporte paralímpico. No entanto, existe o desejo da modalidade ser incluída como esporte paralímpico para o ano de 2028. Você já sonhou em disputar, além do mundial, as Paralimpíadas?

Gabriel - Com certeza quero participar! Eu fiquei sabendo e vejo sim as possibilidades.

O POVO – Você possui mais de 60 mil seguidores no Instagram. Como você lida com essa vida nas redes sociais?

Gabriel - Eu tento lidar da melhor forma possível, com mais simplicidade possível. Sempre mostrando o meu dia a dia, meus treinos, sempre ganhando o coração das pessoas. Com a intenção de mostrar para elas que podem, sim, superarem a si mesmo, e que elas podem conseguir darem reviravoltas na vida.

O POVO – Você se vê como uma inspiração para as outras pessoas? Você de certa forma acredita que tem uma responsabilidade com seu público nas redes sociais?

Gabriel - Com certeza. Muitas pessoas chegam pra mim e falam isso, né? E com certeza eu tenho responsabilidade com meu público, que me acompanha, que quer ver o meu dia a dia. E até Jesus já falou isso comigo, que eu não só treino por mim, mas também para outras pessoas.

O POVO – No mundo existem pessoas que têm histórias semelhantes a sua. Como um influenciador e um exemplo de superação, que recado você dá para elas?

Gabriel - Que essas pessoas nunca desistam, mesmo que os momentos sejam bem difíceis. Que nunca deixem de acreditarem em si, que nunca deixem de acreditar em Deus e que nunca deixem de acreditarem no seu potencial. Eu passei por momento difíceis. Momentos que estava tudo a favor para eu desistir, mas eu acreditei, continuei acreditando e confiando que Deus sempre tem planos muito maiores que os nossos. A vida é feita de altos e baixos, mas independente do lugar onde esteja, enquanto há vida, há esperança.

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