Uma trajetória difícil, superada pelas conquistas. É desta forma que podemos definir a história da cearense Iasmin Lucindo, de 21 anos, que estará hoje no ringue do UFC Apex, em Las Vegas, para lutar contra a paraense Polyana Viana, a partir das 20 horas (de Brasília), no card principal, visando conquistar sua segunda vitória na categoria. O evento terá transmissão da Band.
A história da cearense com as artes marciais iniciou há quase 10 anos. A violência doméstica sofrida pela mãe, Vaneide Lucindo, e a busca pela autodefesa foram os pontos de partida para Iasmin dedicar uma parte da sua infância à luta. A primeira experiência foi no kickboxing, mas a conexão definitiva foi com o MMA, em 2017. E o sonho distante de se tornar profissional virou realidade — e uma forma de se expressar para a vida.
“A minha realidade me colocou a isso. Me obrigou a seguir esse caminho. Foi a realidade que tive. Quando era mais nova, minha mãe sofreu agressões do meu pai, minha família teve muito isso, e isso me ajudou mais ainda a lutar. Entrei na luta não com a intenção de lutar, porque eu era muito nova, eu imaginava que isso seria um sonho, mas bastante distante. E a luta foi onde me encontrei. Entrei mais por defesa, depois que entrei por defesa, meu professor me perguntou se eu queria lutar. Eu aceitei, para mim era um sonho", relembrou ao O POVO.
A ausência de Vaneide no dia a dia quase fez Iasmin desistir da luta. Treinando na Fight House, em Feira de Santana (BA), precisou lidar com a saudade de casa. Apesar disso, retornar para Fortaleza seria sinal de regressão na trajetória ambiciosa da lutadora cearense, que colocou como objetivo a mudança de vida da família.
“De início, senti bastante saudade. Deu muita vontade de voltar para casa, abandonar tudo. Pensei: 'Vou arranjar qualquer trabalho, vou sair disso. Só luta, guerra…', mas eu botava na minha cabeça que se voltasse para Fortaleza, estaria regredindo e nunca iria chegar onde queria. E nós nunca queremos regredir, queremos sempre avançar. Se desistisse, iria regredir. Sou muito ambiciosa, quero sempre mais. No começo, minha mãe sentia bastante saudade, mas ela falava: 'Fique aí que vai dar certo'. Fomos sempre nos virando, apesar das dificuldades, nunca me deixou só", recordou Iasmin.
"Até hoje minha mãe não assiste minha luta. Ela está mais ansiosa que eu. Um mês antes, ela falou: 'Eu estou tomando remédio, não estou conseguindo dormir'. Digo para ela relaxar, que vai dar tudo certo. Ela está bastante feliz, orgulhosa. Quando conversamos, falamos sobre a vida, que há um ano, antes de entrar no UFC, eu fiz uma promessa para ela, que iria entrar num evento grande, ia tentar mudar nossa vida. E quando você tem fé em Deus, tudo conspira a favor. Duas semanas depois, veio o contato do UFC. Foi muito gratificante. Quando chego lá em cima (do ringue), tenho que lutar pela minha mãe, pela minha família, porque é o nosso futuro e eu fiz uma promessa de mudar nossa vida”, disse.
Para superar a saudade de casa, a lutadora contou com o apoio da Academia Fight House e do mestre Renato Velame. A preparação para enfrentar Polyana Viana foi realizada em três etapas: trocação e estratégia na Fight House, preparação física com Gabriel Ledo, em São Gonçalo dos Campos (BA), e mental com a psicóloga Camila Domingos.
“Já estou há três anos na Fight House, somos uma família, me sinto bastante acolhida. Saí de Fortaleza sem conhecer quase ninguém, só o (Renato) Velame, que me deu total apoio, e hoje estamos aqui. Família de sangue, zero. De coração, é grande. E me apoiaram bastante”, reconheceu. “Agora estou mais tranquila. Desde o começo do camp, tentei bastante trabalhar o meu psicológico. A gente buscar vivenciar antes de estar aqui”, completou.
“A profissão coloca a gente nisso, estamos acostumados. Em relação a Polyana, admiro muito ela, o trabalho dela, a trajetória dela. A gente sabe que nós, mulheres, que somos brasileiras, sofremos muito para chegar no UFC. Aqui fora, respeito e admiro Polyana. A questão é que vai estar lá dentro. Lá está meu nome, minha família, minha equipe e, com certeza, eu quero demais essa vitória, para mostrar que o trabalho está sendo bem aplicado”, completou Iasmin Lucindo.
As artes marciais trouxeram benefícios para a trajetória de vida de Iasmin Lucindo. E a cearense deixa claro o seu objetivo com a luta: inspirar pessoas.
“A luta me ajudou a amadurecer mais. Me ajudou a ter mais discernimento, a saber que sou um ser humano também. Temos várias formas de nos expressarmos, a luta me trouxe muito amadurecimento pessoal, a ter disciplina, procurar cada vez mais evoluir e ter a mente aberta. Cada pessoa tem o que ensinar, não apenas na luta, mas na vida. A luta me acrescentou muito. Desde o início, meu foco sempre foi inspirar pessoas que vieram debaixo, da favela, mulheres ou homens, mas que eles conseguem. No início, pensei que não fosse real, que seria distante. Hoje estou aqui, só basta acreditar que você consegue”, explicou.
Diante de Polyana Viana, Iasmin Lucindo visa elevar o seu cartel na modalidade. Atualmente a cearense tem 14 vitórias e 5 derrotas, com oito triunfos por nocaute e duas por finalização, e soma alguns títulos: Pan-Americano e Baiano de Jiu-jítsu, cinturão do Action Fight e do Samurai Figth House, por exemplo.
“Meu estilo de luta é o MMA. A gente tenta se adaptar de acordo com a adversária. Às vezes, ela é striker (luta em pé). Gosto muito de porrada, mas no MMA precisamos ter inteligência. Vamos nos adaptando a cada adversária. O que gosto mesmo é da porrada, mas se for para o chão, sabendo que terei mais vantagem, óbvio que usarei mais as quedas, usarei o que tenho de melhor. A gente tenta ser, acima de tudo, inteligente. No meu pessoal, o que a Iasmin gosta, é da porrada, gosta do striker”, contou.