[SAIBAMAIS]
Há quase um mês no ar, o site foi idealizado e desenvolvido pela designer Carolina Tod, a redatora Lilian Oliveira, a diretora de arte Nath Ehl e a também diretora de arte e ilustradora Rossi Antúnez (ver entrevista ao lado). De diferentes épocas, do samba de Noel Rosa ao pop de Claudia Leitte, passando por Zeca Pagodinho, Roberto Carlos e Ludmilla, o site reúne músicas, grifa onde há frases com conteúdo machista, explícitos ou sutis, e explica porque compreende os versos como machistas.
São 100 músicas, e, com a possibilidade de que músicas sejam sugeridas pelos leitores, a perspectiva é de dobrar o número de obras catalogadas. Tem música que naturaliza o ciúme (“Ciúmes de você”, de Roberto Carlos); canções que reforçam a rivalidade entre mulheres (“Beijinho no Ombro”, de Valesca Popozuda, e “Lacradora”, de Claudia Leitte); trechos que falam de dominação e imposição de vontades masculinas dentro de relacionamentos (“Vidinha de Balada”, de Henrique e Juliano); e chegam à incitação de estupro e de violência contra mulheres (“Vai Tomar Dormindo”, de MC Roba Cena, e “Vai, Faz a Fila”, de MC Denny).
Apontar machismos em letras de canções, algumas inclusive consagradas, é importante ferramenta de desnaturalização de misoginias, para a cantora e professora do curso de licenciatura em Música da Universidade Federal do Ceará (UFC) Maria Juliana Linhares.
“Quando (situações machistas imputadas às mulheres) estão amenizadas por um veículo chamado ‘música’, a gente deglute tranquilamente sem maiores pesos na consciência. A música reforça a cultura do estupro, justamente porque naturaliza o sexo não consentido, o sexo à custa de violência. E ainda pior: há músicas que falam de situações bem mais sinuosas nas relações humanas, onde o jogo afetivo pareceria bastante inocente, mas são todavia narrações de como ‘forçar a barra’ para conseguir dormir com alguém”, infere. A professora acredita que a iniciativa do MMPB é uma forma de “nos obrigar a refletir sobre obras que até gostávamos, mas que carregam em si o mundo machista onde todos vivemos”.
“Merece um tijolo na testa” é um verso de “Mulher Indigesta”, de Noel Rosa. A música foi composta em 1932 por um dos baluartes do samba, quando não havia discussões tão latentes sobre machismo. Ainda assim, para a cantora e compositora Lorena Nunes, é preciso refletir sobre esta e outras canções. “Acho que não tem como apagar, mas a gente aprende com o passado. São clássicos, vieram de outro tempo, de uma outra construção social que a gente está mudando. (É preciso) que se faça um debate, que se chame atenção a isso, e que cada artista tenha a postura de ou não cantar ou ressignificar de alguma forma”, opina.
A cantora, compositora e educadora musical em formação Di Ferreira conta que recentemente retirou do repertório a música “Cheguei”, da cantora Ludmilla, porque “incita a competição entre mulheres”. Para Di, é preciso combater o machismo nas pequenas coisas, porque elas fazem parte de um todo. “Se ouve muito o argumento de que ‘Ah! Mas é só uma música. Acho perigoso lidar com isso tratando como algo pequeno, porque isso é a base do macro”, aponta.
Outras iniciativas
Há um ano, no Facebook, a página Arrumando Letras, reescreve trechos de músicas consideradas machistas.
Em janeiro, Spotify, YouTube e Seezer retiraram a música “Só Surubinha de Leve” depois de denúncias de apologia ao estupro.
A cantora Valesca Popuzuda mudou letras de “Beijinho no Ombro”. Antes a canção falava de rivalidade e “recalque”, agora fala sobre a colaboração entre as mulheres.
O cantor Criolo também modificou letras de músicas suas e retirou conteúdo transfóbico e machista.
Multimídia
Conheça o site http://mmpb.com.br/vid