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Meu filho reprovou. O que fazer?
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Meu filho reprovou. O que fazer?

Professores avaliam que a grade curricular do Ensino Médio é bastante carregada e que algumas disciplinas "podem ser desinteressantes para o aluno"
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A reprovação escolar costuma ser encarada de forma difícil pelas famílias de crianças ou jovens que não atingiram uma pontuação mínima no ano letivo para seguir para a série seguinte. Nesse cenário, especialistas de educação ouvidos pelo O POVO alertam que o mau desempenho na escola deve ser entendido dentro de um contexto amplo. É preciso olhar para o aluno, para o professor, para a escola e para a sociedade. O acompanhamento de perto da família é uma recomendação para lidar com o fato de "não passar de ano".

Aos 15 anos de idade é a terceira vez que Leonardo Macena, filho da cabeleireira Maria Regina Oliveira, 37, está cursando o 9º ano do Ensino Fundamental em uma escola de Fortaleza. A mãe relata que até o 7º ano, o filho apresentava um bom desempenho, recebendo inclusive elogios dos professores. "Ele mudou depois que trocou de colégio e entrou na fase de adolescência. Recentemente fui chamada na escola porque ele não estava levando as tarefas prontas. Ele diz para mim que nunca tem tarefa", comenta.

Apesar das conversas de incentivo diárias, Maria conta que o filho costuma dizer que "não gosta de estudar" e passa a maior parte do dia concentrado em jogos da internet. As disciplinas nas quais ele precisa alcançar a média são Geografia e Artes. Mas a mãe tem a esperança de que ele consiga recuperar as notas e ingressar no Ensino Médio em 2020.

Pela sua experiência em sala de aula desde 1998, o professor Jorge Luiz Costa, atual coordenador pedagógico da Escola de Ensino Médio em Tempo Integral José Maria Pontes da Rocha, garante que a reprovação tem origens diversas. "Muitos abandonam para poder trabalhar e ajudar a família. E, muitas vezes, o próprio conteúdo não acompanha a realidade do aluno", destaca.

Além disso, o professor considera que o Ensino Médio tem uma grade curricular bastante carregada e algumas disciplinas "podem ser desinteressantes para o aluno". Isso acabaria contribuindo para levar à reprovação. Ele acrescenta que, por meio das reuniões de acompanhamento bimestral, muitos pais e responsáveis já estão cientes do resultado dos filhos ao término do ano letivo.

O coordenador ressalta que, ao longo de todo o período de aulas, a escola procura estabelecer um contato próximo com a família do aluno que apresenta dificuldades em alcançar a média. Na escola onde trabalha, cada turma tem um professor responsável, chamado de Professor Diretor de Turma. "Eles entram em contato direto com a família, ligam para os alunos e falam diretamente com responsáveis", explica.

Se mesmo com as recuperações paralelas a cada bimestre e com a recuperação final, o aluno acabar reprovado, é iniciado um acompanhamento com reforço. No Ensino Médio, se um estudante reprovar dois anos seguidos e completar a maioridade, ele é remanejado para o período da noite ou para algum Centro de Educação de Jovens e Adultos (Ceja).

Olho no aluno e no entorno

A reprovação tende a ser atribuída em muitos casos somente ao desinteresse do aluno. No entanto, Erika Atem, professora de psicologia educacional na Universidade Federal do Ceará (UFC), alerta que esse processo tem uma relação direta com vários aspectos da vida escolar do aluno. "O desempenho é um indicativo, entre outros, das relações que o aluno estabelece com a escola, com o professor, com o tipo de avaliação ao qual ele é submetido, com o tipo de vinculação que ele teve com o contexto em que está
inserido e com a relação entre os pais", analisa.

Para a especialista, um diagnóstico individualizado pode resultar em equívocos sérios no modo como a família e a escola vão buscar soluções para auxiliar o estudante reprovado a reverter a situação. "Para orientar a família que vai receber esse resultado da reprovação, isso precisa ser levado em conta porque muda completamente a forma como essa orientação vai ser dada", ressalta.

O professor Wagner Andriola, da Faculdade de Educação da UFC, a família exerce uma função fundamental na consolidação do que os estudantes veem em sala de aula. O docente ressalta, porém, que é importante que a escola seja um ambiente agradável para o aluno. "Tem o grande desafio da própria escola de se mostrar útil e atraente de maneira que os alunos estejam buscando sua formação e vendo a utilidade dessa formação para exercer no futuro uma profissão e exercer sua cidadania", destaca.

Entre 2007 e 2018, a taxa de reprovação nas escolas do Estado caiu de 8,9% para 4,9%. O Programa de Aprendizagem na Idade Certa (Mais Paic), destinado à melhoria dos resultados da alfabetização ao 9º do ensino fundamental da rede pública, atua em colaboração com os 184 municípios do Estado. Além disso, a Prefeitura de Fortaleza mantém o Projeto Integração. Em 2018, pelo menos 1.100 alunos do 9º ano de 22 escolas municipais foram beneficiados com atividades esportivas e culturais no contraturno escolar, além de com aulas de português, matemática e do Projeto de Vida.

O projeto mudou a realidade de Glória Mesquita, 50, mãe de Leon Mesquita, 14, estudante do 9° ano do Ensino Fundamental na escola municipal Tais Maria Bezerra Nogueira, no Jangurussu. Diagnosticado os cinco anos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Leon tinha dificuldade em acompanhar os conteúdos na escola e sempre ficava de recuperação. "Ele não fazia amizades porque ele estava sempre estressado e as notas dele eram muito baixas. Depois que começou no projeto, ele teve uma melhora grande. Ele faz (por conta do Integração) natação, capoeira, karatê e tudo isso ajuda", conta a mãe.

Para entender a reprovação escolar

Especialistas em psicologia educacional e gestão educacional ouvidos pelo O POVO orientam a pensar o processo de reprovação a partir de uma rede de fatores relacionados ao aluno, ao professor e à escola. Veja o que entender melhor em cada um desses pontos:

Aluno 

É preciso compreender a aprendizagem como um processo em que o aluno tem motivação para aprender, considerando sua bagagem cultural, seu desenvolvimento cognitivo e emocional, além da qualidade dos estímulos sociais na família, bairro, comunidade e escola.

Deve-se considerar também se o aluno tem algum tipo de necessidade especial e quanto a escola consegue executar de demanda de inclusão.

O professor

Como está se dando a abordagem dos conteúdos curriculares.

Que estratégias de ensino e de motivação dos alunos estão sendo utilizadas e qual didática está sendo adotada.

De que forma as avaliações são conduzidas.

Gestão escolar

De que modo a escola é gerida, se o corpo docente tem sido qualificado.

Em qual realidade socioeconômica os alunos da escola estão inseridos e se as estratégias adotadas são coerentes com essa realidade. 

Quais atividades extraclasse são desenvolvidas no sentido de oferecer ao estudante um espaço para se expressar e ser ouvido, criando um ambiente atrativo (gincanas culturais, grêmios estudantis etc.).

 

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