Leonardo Ierardi Goulart, neurologista, especialista em transtorno do sono da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, explica o que vem acontecendo com todos nós quando o assunto é sono.
O POVO - Qual é a avaliação dos especialistas sobre o sono do brasileiro?
Leonardo Ierardi Goulart - Estudos mostram que o distúrbio do sono mais prevalente no Brasil e na sociedade moderna é a privação de sono, ou seja, a pessoa dormir menos do que precisa. Isso pode causar alguns problemas, como sonolência excessiva, irritabilidade, ansiedade, fadiga, dor crônica, falta de concentração e falta de atenção.
Outros transtornos do sono frequentes são: a apneia do sono, que atinge cerca de 20% da população. A insônia crônica, que é a dificuldade para iniciar ou manter o sono, despertar precoce, ou combinações entre esses três sintomas, causando um impacto na qualidade de vida no dia seguinte, quando acontecem mais de três dias na semana por mais de três meses.
Além da insônia aguda, mais frequente e considerada uma reação normal ao estresse (seja ele bom ou ruim). Ela acontece quando o indivíduo tem dificuldade para iniciar ou manter o sono, despertar precoce, ou combinações entre esses três sintomas, causando um impacto na qualidade de vida no dia seguinte, porém tem uma duração mais curta do que a insônia crônica e, geralmente, melhora quando passa a situação de estresse.
OP - Após a pandemia do novo coronavírus e do isolamento social, é possível que a forma como dormimos sofra alterações?
Goulart - Após a quarentena é possível, sim, que haja uma mudança no padrão de sono, porém, dependendo da pessoa, essa mudança pode ser para melhor ou pior. Quando falamos de transtorno e alterações de sono, pode ser excesso ou falta de sono. Por exemplo, quem dormia menos do que precisa porque era sobrecarregado pelo trabalho e tinham oportunidade reduzida de sono, com a flexibilização da rotina, pode dormir mais durante a quarentena e melhorar os problemas decorrentes da privação do sono.
Por outro lado, a falta de rotina pode levar as pessoas a alteração de horários do sono. Algumas têm tendência a dormir e acordar tarde e que, em sua rotina normal, são obrigadas a acordar cedo para trabalhar, acabam acordando e dormindo cedo normalmente. Porém, esses indivíduos quando ficam sem horários regulares e rotina para seguir, podem se acomodar em seu ritmo biológico: dormir e acordar cada vez mais tarde. Essas pessoas, quando tiverem que voltar à rotina normal, poderão ter dificuldades para se readaptar.
Existe um terceiro padrão que são as pessoas que podem passar por sofrimento psicológico intenso com essa mudança de contexto de vida, social, econômico e político. Têm indivíduos que não conseguem se desligar e ficam com o nível de alerta inadequado/disfuncional, podendo desenvolver insônia crônica. Mas isso depende do traço de personalidade de cada um.
OP - Como dormir melhor?
Goulart - A principal dica é manter horários regulares para acordar, em resumo, quanto mais cedo a gente acorda, mais cedo a gente tem sono no dia seguinte e mais profundo será esse sono. É importante permitir que o seu organismo desacelere no final do dia. Pode-se perceber que, ao chegar no final do dia, a gente já não desempenha as atividades tão bem, essa é a hora de reduzir a intensidade do processamento de informação no cérebro. Além disso, reservar o lugar do sono apenas para o sono, relaxar na sala e ir para a cama apenas quando estiver com sono - nada de ficar esperando o sono chegar na cama.
Também é importante ter um hobby. Praticar atividade física, por exemplo, tem um impacto considerável na qualidade do sono. Dê preferência a praticar esportes pela manhã com exposição a luminosidade. Deve-se evitar álcool próximo ao horário do sono, o consumo de bebida alcoólica prejudica em muito a atividade cerebral do sono. O jantar próximo ao horário do sono também pode atrapalhar, recomenda-se não comer cerca de duas a uma hora antes de ir dormir. Deve-se evitar também o uso de estimulante após as três ou quatro horas da tarde. O excesso de luminosidade e tecnologia também está associado a uma piora na qualidade do sono (isso não significa apagar todas as luzes no final do dia, essa informação deve ser usada com bom senso.
Acima de tudo, é necessário respeitar a demanda do nosso corpo e da nossa mente por relaxamento no final do dia. Ler, assistir um programa ameno na TV, uma conversa tranquila, uma curta sessão de alongamento, yoga ou meditação na sala são atividades compatíveis com um padrão de sono normal.