A partir de um problema, nasce uma solução. Em meio à pandemia e com o retorno às aulas presenciais, o professor Guilherme Barroso, de 32 anos, notou o peso dos meses de isolamento social e das perdas familiares — tanto as de entes queridos quanto as de luxos de uma antiga "vida normal" — nos estudantes da rede pública de Carnaubal, município a 336,9 km de Fortaleza.
Guilherme, então, idealizou o projeto “Adote um estudante”, que proporciona atendimento psicológico gratuito para alunos da rede pública local. Em parceria com os docentes Renan Medeiros e Jordânia Sousa, o professor percebeu a necessidade de um acompanhamento especial para os alunos das duas escolas onde trabalha no retorno ao ensino presencial, no final do ano passado. Desde então, a ideia de oferecer e intermediar atendimento voluntário aos estudantes já angariou 20 psicólogos cadastrados, disponíveis para consultas online, uma vez por semana, em contraturno ao horário letivo.
A ideia e o sucesso do projeto chamaram a atenção das autoridades públicas de Carnaubal, que apoiaram os gestores e já pensam em expandir para as outras escolas do município.
O POVO - Como surgiu a ideia de criar o projeto Adote um estudante?
Guilherme Barroso - No retorno das aulas presenciais no segundo semestre de 2021, nós (professores) percebemos uma grande quantidade de alunos com problemas de ansiedade, pedindo para sair da sala de aula, perdendo o foco nos estudos. Por Carnaubal ser um município pobre, ele não tem condição de ter tantos profissionais de saúde, aí criamos uma forma de atendê-los. O projeto trabalha com atendimentos de psicólogos de todo o Brasil, onde cada um vai “adotar” um aluno. Já temos profissionais do Rio de Janeiro, São Paulo, Fortaleza, Pará, Minas Gerais e outros. Graças a Deus já temos psicólogos se oferecendo para atuar no projeto.
O POVO - A recepção dos alunos e familiares ao projeto foi positiva?
Guilherme - Nós recebemos mensagem de alunos elogiando. Fazemos questionários para saber como está o andamento do projeto, perguntando uma nota ao profissional. E sempre são notas boas, a maioria dá 10. Pelos pais, nós achávamos que o preconceito com acompanhamento terapêutico seria maior, mas não foi. Esses dias estávamos na reunião de pais, lá explicamos o projeto e vários se interessaram, pais da comunidade vieram atrás. Uma mãe me procurou, parabenizou pela ideia e falou da vontade dela de que o seu filho participasse. A nossa preocupação é a de criar responsabilidade nos pais e alunos para que sigam o projeto com seriedade. Os profissionais estão atuando de forma voluntária, temos que respeitar o tempo de trabalho deles.
O POVO - A participação dos alunos no projeto é determinada pelos professores?
Guilherme - Não. O professor que está em sala de aula apresenta o projeto, explica o funcionamento. Aí esperamos os alunos virem atrás. Se ele está vindo atrás é porque está precisando de ajuda, interessado em participar. Se formos atrás, todos dizem que querem, mas já tivemos casos de desistências em cima da hora, alegando falta de coragem e vergonha, após passar por todo o processo. Às vezes ainda não é o momento do aluno. Na apresentação estão o professor, o psicólogo, aluno e família. Lá o profissional vai dar as datas e horários disponíveis e combinar com o aluno.
O POVO - Os alunos devem ter acompanhamento psicológico a longo prazo?
Guilherme - Nós vemos a necessidade de ter um profissional psicólogo educacional para auxiliar com um diagnóstico de interferência no processo de aprendizagem do aluno, fornecendo diversas ferramentas para tratamento, ajudando a lidar com comportamentos e desvios. Percebendo comportamentos inadequados, perdendo a autoestima e o foco. Para isso, o profissional ajuda a observar se o aluno está com algum problema, começando ainda na infância. Pelo diálogo, é possível superar os problemas existentes na família, bullying, timidez, etc.