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Carta em Defesa da Democracia reúne mais de 165 mil assinaturas
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Carta em Defesa da Democracia reúne mais de 165 mil assinaturas

Manifesto organizado pela USP expõe ataques ao TSE e à lisura do processo eleitoral. Os signatários são juristas, economistas, empresários, artistas e políticos de esquerda e de direita. Bolsonaro criticou o documento, que chamou de "cartinha"
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SIMULAÇÃO pode ser testada no site do TSE (Foto: Aurélio Alves)
Foto: Aurélio Alves SIMULAÇÃO pode ser testada no site do TSE

Às vésperas do início do período eleitoral, a reação a ataques ao sistema de votação avança com a adesão de entidades representativas de setores econômicos e a participação da sociedade civil à carta pela democracia. O número de signatários do manifesto saltou de 3 mil para em torno de 165 mil assinaturas, conforme contagem apurada pelo jornal Estadão. O documento "Carta aos Brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito" foi publicado no site da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) na última terça-feira, 26. 

A carta expõe recentes "ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito". Além disso, defende as urnas eletrônicas e, mesmo não citando o nome de qualquer político ou partido específico, afirma que o País está passando por um momento de imenso perigo para a normalidade democrática”, declaração referente às falas golpistas e aos ataques de Jair Bolsonaro (PL) contra o sistema eleitoral.

Inicialmente, o texto reunia o endossamento de juristas e teve também adesão de banqueiros, empresários e políticos petistas e tucanos. Aberta para assinaturas, o movimento pró-democracia e em defesa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), abrange diversos nomes da sociedade civil. Dentre os cearenses que subscrevem o documento, está o conselheiro de empresas, Geraldo Luciano, e a secretária da Fazenda do Ceará (Sefaz), Fernanda Pacobahyba, e docentes como a vice-presidente da Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Ceará (ADUFC), Irenísia Oliveira Graúna.

Um dos novos signatários foi o ex-presidente do STF Joaquim Barbosa - nove ex-ministros já haviam assinado o texto. Na virada da noite de anteontem para ontem, a adesão já chegava a 30 mil. No manifesto disponível ao público em geral estão nomes Roberto Setubal, Candido Bracher e Pedro Moreira Salles (Itaú Unibanco), Pedro Passos e Guilherme Leal (Natura), Walter Schalka (Suzano) e Horácio Lafer Piva (Klabin).

Em entrevista, Schalka disse que nunca viu uma mobilização como a atual no meio empresarial. Também signatário, Piva disse que a democracia é "uma fênix que renasce exatamente por ser o único sistema político que tem no seu cerne a liberdade". "Mas nossa história já provou que ela pode ser nocauteada", disse.

O presidente Jair Bolsonaro criticou a elaboração do manifesto organizado. "Vivemos num País democrático, defendemos a democracia, não precisamos de nenhuma cartinha para dizer que defendemos a democracia", afirmou o chefe do Executivo na convenção do PP que selou o apoio do partido à sua candidatura à reeleição. 

Nessa quarta-feira, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que representa 119 instituições bancárias do País, decidiu endossar um outro manifesto também em defesa da democracia que está sendo elaborado pela pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).  A Caixa e o Banco do Brasil não endossaram apoio ao documento intitulado "Em Defesa da Democracia e da Justiça".

Em tom mais moderado que o texto já assinado por juristas, empresários, banqueiros e artistas, o manifesto das entidades será publicado em jornais no dia 11 de agosto. No mesmo dia, dois atos serão realizados na unidade da USP - uma homenagem a ministros de Cortes Superiores, no salão nobre, e a leitura da carta, nas arcadas.

Quem assina

No manifesto disponível para assinatura do público em geral estão petistas, tucanos, procuradores que trabalharam na Lava Jato, o advogado que ajudava a campanha do ex-juiz Sérgio Moro, ex-ministros de FHC, Lula, Dilma e Temer, empresários, economistas liberais, subprocuradores-gerais da República, membros do Ministério Público Federal, uma ex-assessora de Paulo Guedes e João Doria, a coordenadora de programa de Simone Tebet (MDB) e uma série de outras personalidades. O manifesto foi criado na Faculdade de Direito da USP.

Entre banqueiros e empresários estão Roberto Setubal, Candido Bracher e Pedro Moreira Salles, do Itaú Unibanco, Pedro Passos e Guilherme Leal, da Natura, Walter Schalka, da Suzano, Eduardo Vassimon (Votorantim) e Horácio Lafer Piva (Klabin).

O deputado Rui Falcão (PT), coordenador de comunicação da campanha de Lula, assina a carta junto com Joaquim Falcão, que cuidava da parte jurídica da campanha de Moro. Vanessa Canado, advogada e professora do Insper, ex-integrante da equipe de Guedes e ex-articuladora do plano econômico de João Doria (PSDB), também subscreve. Elena Landau, economista à frente do programa de Simone Tebet (PMDB), se une ao grupo.

A lista de economistas inclui ainda Edmar Bacha, que participou da formulação do Plano Real, Samuel Pessoa, Demosthenes Madureira de Pinho Neto, José Marcio Rêgo, Luiz Gonzaga Beluzzo e outros.

Há ex-ministros do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), como José Carlos Dias, José Gregori, Pedro Malan e Miguel Reale Júnior e o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga.

Dos ex-ministros dos governos petistas Lula e Dilma, estão José Eduardo Cardozo, Tarso Genro e Renato Janine Ribeiro. Aloysio Nunes (PSDB), foi ministro nos governos FHC e Michel Temer e também subscreve o texto, assim como Raquel Dodge, que foi procuradora-geral da República na gestão do emedebista.

No Ministério Público, há diferentes correntes no apoio ao texto Procuradores que fizeram parte da gestão do ex-procurador geral da República Rodrigo Janot (governo Dilma) assinam a lista ao lado de colegas que foram do núcleo duro de Dodge (governo Temer). Há aqueles que estiveram à frente de casos da Lava Jato, como o procurador da república Vladimir Aras, e subprocuradores da República atualmente no cargo, caso de Mario Bonsaglia e Nicolau Dino, por exemplo.

O documento já foi assinado também por personalidades da música como Chico Buarque, Maria Bethânia, Gal Costa, Zélia Duncan, Frejat; pelos atores Fernanda Montenegro, Antonio Calloni e Bruno Gagliasso; escritores Luís Fernando Veríssimo, Martha Medeiros e Djamila Ribeiro, e historiadores Eduardo Bueno e Lilia Schwarcz, entre outros.

Como assinar

Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito

Organização: Faculdade de Direito da USP

Link para assinatura: Estado de Direito Sempre

Confira a íntegra da carta pela democracia abaixo

Carta aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito

"Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o Estado Democrático de Direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os Poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição: "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em um país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do `largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado democrático de Direito Sempre!"

(Colaboraram Adriano Queiroz e Beatriz Cavalcante)

USP

Ontem, o site da Faculdade de Direito da USP registrou 11 mil acessos por hora, um recorde. A carta foi lançada com 3 mil assinaturas. Na virada da noite de anteontem para ontem, a adesão já chegava a 30 mil

Febraban

No ano passado, antes do 7 de Setembro, a possibilidade de assinar um manifesto semelhante diante das investidas de Bolsonaro contra o STF dividiu a Febraban. Houve crise interna, e Caixa e BB ameaçaram deixar a entidade

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