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"A minha razão de viver", define administradora que resgatou 57 jumentos em Amontada
Farol

"A minha razão de viver", define administradora que resgatou 57 jumentos em Amontada

Foi alimentando uma jumenta arisca e com fome que Érica de Caria encontrou a paz que ela tanto procurava. Ali nasceu o Lar dos Pancinhas, em Amontada no Ceará
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A administradora, que vive no Ceará desde 2016, cria 57 jumentos no lar dos pancinhas (Foto: Arquivo Pessoal/ Erica de Caria)
Foto: Arquivo Pessoal/ Erica de Caria A administradora, que vive no Ceará desde 2016, cria 57 jumentos no lar dos pancinhas

Dividir a vida com um animalzinho traz inúmeros benefícios para a vida, incluindo uma rotina mais leve. Érica de Caria encontrou sua paz dando amor e carinho a 57 jumentos que chegaram a sua vida por acaso e fizeram morada em sua casa e em seu coração. A paulista, que se mudou em 2016 para o Ceará, é a prova de que o amor tudo muda.

A procura de uma jumenta arisca e esfomeada proporcionou que a administradora enxergasse a vida com outros olhos, lhe ensinando até a conviver melhor com a ausência de sua mãe que faleceu em decorrência de um câncer.

Hoje, o Lar dos Pancinhas, em Amontada, a 174km de Fortaleza, é a melhor parte de Érica, que conta ao O POVO como ela os resgatou e como eles mudaram a sua vida para melhor.

O POVO - Há quanto tempo você cria seus animais e porque o abrigo se chama “Lar dos Pancinhas”?

Érica de Caria - Desde março de 2021 eu crio meus animais, vai completar dois anos. Eu lembro oficialmente abril de 2021. Então, agora em abril, eu vou comemorar os dois anos. O nome "Lar dos Pancinhas" veio porque quando eu consegui finalmente alugar o espaço ideal para tirar eles das ruas, eu botei esse nome lá, porque o lar é onde definitivamente eles teriam a casa deles. "Pancinhas" foi porque eles chegaram muito magros, e aí conforme o tempo, eu fui percebendo o desenvolvimento da "pança". Então as panças são muito grandes, eles comem demais. Graças a Deus eles têm alimento, nunca faltou depois que eu comecei a cuidar deles e, para mim, é uma prioridade que nunca falte devido à fome que eu vi eles passarem. Então eu vi a pança crescer e aí eu coloquei meus pancinhas, e quando eu conquistei esse espaço, que foi em janeiro do ano passado, eu coloquei o nome de "Lar dos Pancinhas".

O POVO - Como os cuidados com eles começaram? Quem foram os primeiros a chegar até você?

Érica de Caria - Bom, a primeira jumenta foi a Dona Marta e o filhote dela, o Supla. Resumidamente, eu vi ela comendo papelão e eu fiquei indignada, questionei pra minha filha, que estuda veterinária em São Paulo, perguntei o porquê dela comer papelão desesperadamente. E aí o vizinho que estava junto falou "ah eles adoram papelão". E eu achei aquilo insano né? Como é que adora papelão? Aí eu perguntei pra minha filha porque de repente vai que tinha alguma ali no papelão que era comestível. E aí não, a Isabela falou pra mim que era o desespero da fome mesmo. Então aquilo me tomou de um jeito, me tocou e naquele momento eu passei a cuidar deles, dos dois.

O POVO - Quantos jumentos você acolhe atualmente?

Érica de Caria - Olha, cada semana é uma novidade. Até o dia que a matéria do jornal saiu acho que era 54. E na segunda-feira chegaram mais três jumentos, porque quando chegam aqui, eu não tenho coragem de virar as costas. Então, eu resgatei mais três. Eu estou com 57 jumentos e um cavalo, que quebrou a classe (deixou de poder ser competitivo), seria sacrificado porque ele não tem mais utilidade humana. Infelizmente, pra ele só servia como diversão, para competição, e aí ele veio parar aqui no abrigo.

O POVO - Você chegou a abrir uma pousada com o seu ex-companheiro quando se mudaram para o Ceará, mas ele não lidou muito bem com os animais convivendo no estabelecimento, o que levou a separação de vocês. Como foi essa história e como você lidou com esse processo?

Érica de Caria - Bom, eu morava em Fortaleza, mas me mudei para o Interior por conta da pandemia. Aí com pouco tempo, comecei a trabalhar como gerente de uma pousada, só que eu e meu ex-companheiro decidimos abrir a nossa própria pousada. E foi nela que conheci Dona Marta e o Supla. Só que chegou o momento em que tinha muito jumentos e atrapalhava ali no final de semana, porque eles (jumentos) não entendiam que de segunda a quinta eles podiam ficar por lá e nos outros dias não. Nos fins de semana, que tinham hóspedes, tinha que fazer tudo lá fora, mas sempre lotava, e nessa época eu tinha 16 jumentos. E eles começaram a incomodar a proprietária do imóvel, que pressionava o meu ex-companheiro, deixando ele estressado e a gente começou a brigar por isso. Eu queria manter os bichinhos lá, mas ele queria que fosse em outro lugar. E eu vi que, em determinado momento, eu estava prejudicando um negócio que era dele, porque ali era um sonho dele e não meu. Então decidi seguir o meu caminho e ele seguiu o rumo dele. A separação foi super amigável, inclusive somos amigos.

O POVO - Como você se sente sabendo que você está dando uma vida de qualidade pros seus bichinhos?

Érica de Caria - Eu me sinto abençoada, honrada, vitoriosa! Eu tenho muita baixa autoestima na minha vida pessoal, como mulher, mas quando eu vejo tudo o que tenho feito pelos jumentos, tudo que eles têm hoje e (ter) conquistado pela minha voz eu me sinto uma vitoriosa, eu realmente falo: “Nossa, você é muito guerreira Érica”, porque tudo eu passo sozinha! Eu não tenho uma pessoa aqui da minha família, eu moro num povoado distante de tudo e de todos, eu sou extremamente urbana e eu me sujeitei a vir a um povoado que nem farmácia tem e nem sinal de telefone tem, e tudo por amor aos jumentos. Então, quando eu olho pra trás e quando eu olho pra eles, me dá muita gratidão. Eu me sinto como se fosse uma heroína.

O POVO - Você disse que era muito apegada a sua mãe e que os seus pancinhas lhe ajudaram a lidar melhor com o luto. De que forma eles lhe ajudaram a conviver com a ausência da sua mãe?

Érica de Caria - Eu era uma pessoa muito apegada à mamãe, nós tínhamos uma ligação muito forte e de repente, quando ela se foi, por decorrência de um câncer, eu fiquei muito abalada. E aí, eu sofria com depressão, como se parte de mim tivesse morrido também. E aí, com os jumentos, eu fui me apegando, brincando com eles e foi preenchendo o vazio que eu tinha. E foi algo que aconteceu naturalmente, quando eu vi, já estava com uma responsabilidade com os jumentos e aquilo me deixava feliz. Hoje não tenho mais espaço para tristezas. Eu penso que ela estaria orgulhosa de mim, tanto que quando um jumento adoece, eu sempre peço a ela para me ajudar a curar ou até mesmo aliviar o que ele está sentindo. E tudo isso acalmou o meu coração, eles preencheram o vazio que ela me deixou.

O POVO - O que o Lar dos Pancinhas significa pra você?

Érica de Caria - É a minha razão de viver, a minha razão de lutar, a realização de um sonho. Por mais que eu não nunca imaginei que seriam jumentos, mas há muitos anos e anos atrás eu sempre pensava, que um dia eu ganharia na Mega-Sena e resgataria todos os cachorros e gatos das ruas. E, por ironia do destino, por sei lá qual o motivo, uma força maior e a vida me levaram a isso, a eu recolher não gato, cachorro, mas os jumentos e eu sou extremamente feliz com a vida que eu tenho, por mais que eu tenha que passar por muita coisa e abrir mão de muita coisa. Mas eu sou extremamente feliz com eles e eu não me vejo sem eles.

 

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