Era tarde de um dia de semana, eu e a fotógrafa Mariana Parente percorríamos as ruas do bairro Conjunto Ceará, em Fortaleza, em busca da casa da família de Dandara dos Santos, morta e torturada dias antes.
Lembro do portão, da garagem da casa e das feições da senhora Francisca Ferreira, mãe de Dandara.
A abracei e perguntei se poderia falar sobre a filha. Ela então detalhou como tinha sido a rotina nos dias antes do crime, mostrou o canto da casa onde Dandara armava a rede e assistia TV, lembrou da década vivida em São Paulo, dos irmãos, das amizades conquistadas ao longo da vida. Amigos que pagaram o enterro, o ônibus que levou as pessoas ao cemitério e as fotos que ficaram em cima do caixão, que não pôde ficar aberto.
A foto que rodou o mundo, noticiando o bárbaro caso de transfobia no Ceará, mostra as unhas cor de rosa e a mão envelhecida de uma mulher que precisou ver o vídeo da filha recebendo socos, chutes e tiros.
"Pra mim, vingança é só Deus. Se Ele achar que a pessoa merece, Ele se vinga por mim", disse dona Francisca ao fim da entrevista. Os R$ 50 mil e a pensão que o Estado deverá pagar à família de Dandara não são vingança. Representam o mínimo diante do cenário de violência, transfobia e omissão que aquele vídeo escancarou.