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O 7 a 1 da Câmara contra o Brasil
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O 7 a 1 da Câmara contra o Brasil

Num surto de produtividade, os deputados aprovaram a PEC da blindagem num dia e a urgência para um projeto de anistia no outro, provando que, quando há interesse, e nesses casos havia bastante, o parlamento é operoso
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HUGO Motta conduziu a articulação e a votação da PEC da blindagem na Câmara dos Deputados (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)
Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados HUGO Motta conduziu a articulação e a votação da PEC da blindagem na Câmara dos Deputados

Entre a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro no STF e o libera-geral da Câmara, menos de uma semana se passou. Num surto de produtividade, os deputados aprovaram a PEC da blindagem num dia e a urgência para um projeto de anistia no outro, provando que, quando há interesse, e nesses casos havia bastante, o parlamento é operoso, praticamente incansável. Apelidada de "PEC da bandidagem", a emenda constitucional, como se sabe, confere aos congressistas aura de intocáveis criminal e civilmente, o que pode fazer de Brasília um lugar perigoso - afinal, não se imagina que tipo de gente se mudaria para a capital federal à procura de uma proteção tão ampla e eficaz contra investigações da PF.

Já o projeto de lei da anistia é um salvo-conduto para crimes passados, presentes e futuros, isto é, os que foram cometidos na esteira do 8/1, aqueles que estão sendo praticados agora e os que eventualmente sejam levados a cabo. Mesmo na sua versão "gourmet", com a substituição de anistia por palavra menos áspera e comprometedora (dosimetria), essa arapuca textual atualiza o golpismo a pretexto de pacificar o que está pacificado na legislação. Para encerrar, nada mais emblemático do que o ressurgimento de Michel Temer e Aécio Neves, cujas silhuetas adicionam uma nota sulfurosa ao momento político já irrespirável do país. Às voltas com costuras e conchavos miúdos e graúdos, ambos apostam num acordão que os reposicione no tabuleiro, ainda que ao preço de fazer o Brasil retroceder - enquanto o julgamento do golpismo tentou projetar a nação para adiante, acertando as contas com um capítulo mal resolvido de sua história recente.

E, no meio dessa fauna pantagruélica, com ares de menino rico cujo brinquedo foi roubado, está Hugo Motta, que parece diminuir de tamanho a cada nova rodada de negociações que envolvem seu padrinho, Arthur Lira, e outros próceres do centrão. Eis aí um resumo possível da novela: quando supúnhamos que dávamos dez passos para a frente, regressamos dez.

 

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