Uma forte explosão na região portuária matou ontem pelo menos 78 pessoas e deixou mais de 4 mil feridos em Beirute. Testemunhas relataram tremor e janelas quebradas em várias partes da capital do Líbano. O violento choque foi sentido até no Chipre, ilha que fica a 240 quilômetros de distância. Embora autoridades tenham descartado um ataque ou um atentado como causa, o acidente levou pânico a uma cidade traumatizada por anos de violência e guerra civil.
Foram duas explosões. A primeira, segundo a TV Al-Manar, veículo oficial do Hezbollah, foi causada por uma falha elétrica pouco antes das 18 horas (12 horas em Brasília). Ela teria provocado um incêndio em um depósito de fogos de artifício. Philip Boulos, que governa a região de Beirute, disse que uma equipe de bombeiros foi enviada para conter o fogo. Alguns minutos depois, veio a segunda explosão.
Badri Daher, diretor da agência libanesa de fronteiras, disse que o fogo teria atingido um estoque de quase três toneladas de nitrato de amônia, oriundas de uma carga de fertilizante que havia sido confiscada de um navio e vinha sendo guardada no porto havia seis anos. A razão de a segunda explosão ter sido documentada de vários pontos da cidade, segundo ele, vem do fato de a primeira ter atraído a atenção dos telefones celulares que estavam filmando o incêndio.
 Em um país que vive sob o espectro constante da violência sectária, da ameaça de ataques de países vizinhos e ainda não se livrou dos traumas da guerra civil, as explosões provocaram pânico generalizado em Beirute, com pessoas em fuga da região portuária, de carro ou a pé. Em pouco tempo, feridos começaram a lotar hospitais como o Rizk, um dos mais próximos do local da explosão, que realizou 400 atendimentos.
A Cruz Vermelha do Líbano enviou para a capital ambulâncias do norte, do sul e do Vale do Bekaa. Rapidamente, quando os hospitais de Beirute ficaram lotados, os feridos começaram a ser transferidos para outros centros de atendimento na região metropolitana e no interior do país. "Foi um show de horrores", disse Marwan Ramadan, uma testemunha que estava a 500 metros do porto. Ele foi derrubado pela força da explosão. "Não via nada assim desde a guerra civil."
Em razão da trágica história da cidade, Israel logo se apressou em negar que tenha atacado alvos em Beirute - nos últimos dias, forças israelenses e milicianos do Hezbollah trocaram tiros na fronteira. "Não temos nada a ver com a explosão", afirmou um funcionário do governo israelense ao jornal The Jerusalem Post.
"Uma grande catástrofe atingiu o Líbano", disse o primeiro-ministro, Hassan Diab, que declarou luto nacional. "Prometo que essa catástrofe não ficará impune." O presidente libanês, Michel Aoun, convocou uma reunião de emergência do Conselho de Defesa e montou um comitê para investigar as causas do acidente, que ele classificou de "inaceitável".
Nas redes sociais, moradores disseram que o impacto da explosão estilhaçou janelas e vitrines de lojas em pontos diferentes da capital, de Raouche, na orla do Mediterrâneo, a seis quilômetros do porto, até o subúrbio de Rabieh, a 13 quilômetros de distância. O impacto também foi sentido em Nicósia, capital do Chipre, segundo relatos de testemunhas.
 Para o físico Luiz Pinguelli Rosa, professor da Coppe/UFRJ, o tamanho da onda de choque gerada pela explosão foi surpreendente e indica que havia muito explosivo no local. "Em linhas gerais, tem-se uma explosão quando algo que tem um volume relativamente pequeno se expande e passa a ocupar um espaço maior. Essa onda de choque derruba paredes, prédios e pode esmigalhar uma pessoa", diz.
A devastação pôde ser vista nas proximidades do distrito portuário - o choque afetou o prédio da embaixada do Brasil, localizado a poucos quarteirões da explosão. Imagens de TV mostravam residentes feridos perambulando pelas ruas e carros abandonados com os airbags inflados.
Soldados da missão da ONU no Líbano (Unifil), cujo navio estava ancorado no porto, também ficaram gravemente feridos. A fragata brasileira Independência, que faz parte da missão, escapou por ter deixado o local cerca de dez minutos antes da explosão. Uma embarcação de Bangladesh, a BNS Bijoy, que estava ancorada ao lado, teve 19 feridos.
A casa onde vive o executivo brasileiro Carlos Ghosn, ex-presidente da aliança Renault-Nissan, que se refugiou em Beirute depois de fugir da Justiça japonesa, em dezembro, foi destruída pela explosão. "Estamos todos bem, mas a casa está destruída", disse Carole Ghosn, esposa de Carlos, à reportagem. (Agência Estado)