Vitor Lopes Araruna
vitorararuna@edu.unifor.brAdvogado especialista em Direito e Processo Constitucional; membro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-CE
Uma breve análise do modo e dos argumentos com que a gestão municipal legitimou o aumento da tarifa de ônibus permite concluir que ele é claramente abusivo e ilegal, sendo anulável via Poder Judiciário.
Primeiramente: por se tratar de medida diretamente impactante no orçamento das famílias, especialmente as que integram a base da pirâmide social, caberia ao Poder Público motivar o ato de forma cuidadosa, minuciosa e exaustiva, sem deixar qualquer espaço para dúvidas acerca de sua necessidade e adequação – até porque se trata do maior aumento desde o Plano Real, bem acima da inflação e em meio a delicado período da economia nacional.
Mas não foi o que se viu: a nota da Etufor que anunciou o reajuste carece de informações concernentes a custo por passageiro, receitas extratarifárias, subsídio público, comportamento da demanda, dentre outros. Além disso, contenta-se apenas com informações de uma planilha (não divulgada) fornecida pelo Sindiônibus, entidade que representa os únicos interessados no aumento da tarifa.
Também é bastante discutível a forma diferenciada como se deu o reajuste, de 16,36% para a tarifa inteira e de 7,69% para a meia estudantil. Com isso, a Prefeitura joga a responsabilidade por sua escolha política no colo daquela parcela de usuários que já não contava com benefício algum.
Se é politicamente interessante para a gestão agradar ao movimento estudantil, evitando desgastes por protestos, ela que arque com as consequências da política que instituiu – por exemplo, aumentando os subsídios da passagem. Não vale simplesmente mandar a conta para os pagantes de inteira, tão socialmente desfavorecidos quanto os beneficiados
com a meia.
Gradativamente, no Brasil, o Poder Judiciário toma mais consciência da sua missão de ser a última trincheira da cidadania, assumindo o encargo de corrigir as injustiças a que os cidadãos são submetidos (muitas delas ocasionadas pela própria ação estatal), quando todas as demais vias de defesa dos direitos se esgotam.
Como prova disso, veja-se a recente suspensão do aumento da tarifa de ônibus em São Paulo, em caso que guarda muitas semelhanças com o de Fortaleza: ali, a justiça deixou claro que está do lado da lei, ao não mais tolerar atos prejudiciais ao interesse público, desprovidos de motivação, de transparência e praticados com fins diversos.
Sinal de que, afinal de contas, estamos evoluindo enquanto sociedade.