Este Supremo Tribunal Federal (STF) de hoje, de maneira definitiva, não é aquele que precisaríamos ter para a travessia de momento nacional tão dramático. As caras de surpresa dos jovens estudantes de Direito sentados nas cadeiras logo atrás do ministro Luís Roberto Barroso enquanto ele, voz e feições alteradas, se insurgia contra Gilmar Mendes, colega de Corte, na sessão da última quarta-feira, chamando-o, dentre outras coisas, de “pessoa horrível”, “mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia”, “desonra para o Tribunal”, meio que simbolizam o espanto que é de todos os cidadãos brasileiros diante dos espetáculos recorrentes de desequilíbrio que ultimamente partem daquele espaço, que deveria ser de permanente respeito entre pares.
De outra parte, para deixar mais claro o tamanho do problema ali instalado, tivemos o atacado Gilmar também atacando, vinculando o colega a “manobras” para conduzir votações de acordo com o próprio interesse, recomendando, ironicamente, que ele fechasse “‘o escritório de advocacia” etc. Coisa de dois bêbados numa mesa de bar, com todo respeito aos que bebem e aos que frequentam tais lugares. É impossível se fazer justiça em meio a um ambiente de tanta falta de educação, incivilidade e ausência de companheirismo, no melhor sentido do termo. Aceitando-se como verdade tudo que um diz do outro, como dar àquele colegiado a condição qualificada de última palavra no debate jurídico nacional? O Judiciário é, por sua natureza, o poder mais fechado entre os que fazem o equilíbrio institucional do Estado. Este aspecto, que até costuma parecer antipático em tempos de democracia, ao mesmo tempo lhe garante a condição teórica, confrontados Legislativo e Executivo, de único em condições reais de manter uma distância necessária do humor das ruas quando chamado para tomar decisões de grande impacto para o interesse da coletividade.
A discussão de baixíssimo nível da tarde da última quarta entre os dois ministros é uma denúncia da tragédia de momento que experimentamos. Quando membros do mais alto escalão da Justiça nacional engalfinham-se verbalmente daquela forma rasteira, rude, até, um colocando a capacidade e a honra do outro em xeque, o que acaba exposto é o descompromisso de ambos com a preservação de uma Casa que quanto mais fragilizada menos servirá ao interesse da sociedade, que a mantém na perspectiva de tê-la apta a oferecer sempre as melhores respostas. Não é aquilo que vimos acontecer, nas palavras dos próprios envolvidos durante a inacreditável refrega daquele dia triste.
A má qualidade da vida pública é um problema cuja complexidade não será enfrentada mantendo-se o foco apenas na representação política, por mais que ela efetivamente mereça sempre atenção especial. Há muito mais a ser consertado e os ministros do STF apresentam, com o mau comportamento, um lado do problema que não tem a ver com a decantada característica do eleitor nacional de nem sempre fazer as escolhas adequadas quando chamado ao voto. O infeliz episódio da vez pode ser transformado em mais uma chance de discutirmos as mudanças que o processo exige, abrindo-se espaço real à meritocracia, especialmente quando se trata de compor a nossa Corte de Justiça mais importante. Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, pelo exemplo, mostram muito pouco compromisso com o STF, o Judiciário e o País.
Guálter George
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Editor de Política