Entre 1855 e 1864, o poeta parisiense Charles Baudelaire, escreveu um conjunto de poemas em prosa, que foi publicado postumamente pelo jornal francês Le Fígaro, sob o título Spleen de Paris, trazia uma crítica social alinhada ao "espírito do tempo".
Paris passava por uma profunda transformação promovida pelo então imperador Napoleão III. O plano desenvolvido pelo então prefeito Haussmann, implicaria na demolição das antigas vilas medievais, para dar lugar às grandes avenidas, com isso, 19.730 prédios foram demolidos e 34 mil foram construídos no lugar.
Nesse contexto, Baudelaire escreveu o poema Os olhos dos pobres, que ilustraria de forma brilhante os impactos do urbanismo na vida do cidadão.
O poema narra a história de um casal apaixonado que irá se separar após conhecer os novos Bulevares recém-construídos em Paris. Sentados num café da nova avenida, notam uma família pobre, em farrapos, olhando para eles pelo lado de fora. O namorado constrangido repara que a renovação urbana trouxe melhorias, mas também, desigualdade e pobreza. Esperando a mesma conclusão, ele é surpreendido pelo pedido da namorada que se dirige a ele e diz:
"Não suporto essa gente com seus olhos arregalados como as portas das cocheiras! Será que você poderia pedir ao maître do café para afastá-los daqui?"
Podemos interpretar o poema de Baudelaire de vários ângulos, sobretudo como as questões urbanas ampliam as desigualdades sociais. Mas a lição mais importante que podemos aprender é como gestores públicos produzem cidades para uma parte da sociedade, onde os investimentos são alocados de forma desigual e os mais pobres são removidos das áreas centrais em nome dos projetos de renovação urbana. Onde estão os direitos dos cidadãos tão aclamados pelos ideais liberais?
Na cidade, os pobres são mantidos à distância. A mobilidade urbana é usada como instrumento de controle, que separa os pobres dos territórios de poder, de forma que a distância cria barreiras de acesso às oportunidades.
Lincoln Paiva
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Planejamento e Gestão de Cidades - Poli/USP, mestre e doutorando em Arquitetura e Urbanismo FAU/Mackenzie e consultor de Mobilidade Urbana - Green Mobility