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O voto nordestino mais à direita
Opinião

O voto nordestino mais à direita

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Tipo Notícia
Prezado leitor, os fatos da eleição permitem diversas análises. Detenho-me em uma. Como explicar o paradoxo de o Nordeste, nitidamente mais conservador, votar à esquerda? Haveria uma "consciência crítica de esquerda" na região, ou seria outra a razão para o voto em Haddad? Teria a região mais cristã do Brasil aderido à agenda da "esquerda", em favor da liberação do aborto, das drogas e da ideologia de gênero? Como compreender o fato de os nove Estados da região terem votado majoritariamente no PT?

 

Alguns poderiam dizer que foi o receio de Bolsonaro acabar com a democracia e os direitos fundamentais. Isso pode ter contribuído. Mas, fosse isso, algo similar teria se passado no Sul e Sudeste, regiões com elevado senso crítico, onde se deu o oposto nas urnas. Além disso, em 2014 Dilma teve mais votos e não se dizia que Aécio ameaçasse a democracia.

 

A explicação, acredito, está em algo mais próprio da região: a situação de pobreza e o medo de piorar. Portanto, o voto no 13 se daria, antes, em favor da manutenção do status quo material, do que por opção ideológica.

 

Evidentemente a pobreza gera vulnerabilidade. Bolsa Família e políticas assistenciais tornam-se moedas de troca. Autoridades locais cativam o voto de quem depende delas. Atualiza-se o cabresto eleitoral. Isso independe do partido. Ou seja, o povo carente se alinha a quem tem poder de lhe ajudar de imediato, seja de esquerda ou de direita. A "fidelidade" aos líderes locais é reforçada mediante ameaça de perda do benefício. Também é comum a cooptação pela entrega de algum auxílio concreto. Desse modo, o povo sofrido prefere manter as coisas como estão, com receio de dias piores. 

 

Instrumentaliza-se a vulnerabilidade econômica. Hoje, os líderes políticos no 

Nordeste são majoritariamente de partidos à esquerda, herança dos últimos 20 anos, quando o Governo Federal do PT aumentou políticas assistenciais.

Ao lado disso, o aparelhamento dos órgãos de governo favorece a manutenção no Poder. A "máquina" é usada na campanha. Tal fator atinge capitais e interior.

 

No interior há maior contingente populacional e maior pobreza.

Apesar da pobreza e do aparelhamento na região, começou uma guinada à "direita" nas capitais.

 

As capitais concentram instituições mais representativas e possuem estrutura econômica superior, com melhores salários e serviços. Apresentam IDH maior. Desse modo, representam um Nordeste mais próspero. Logo, com voto mais livre.

 

Note-se que em 2014 o PT ganhou nas nove capitais. Em 2018 venceu em 6. Em 5 delas teve menos votos em comparação com 2014. Por outro lado, Bolsonaro ganhou em Maceió (62,5), João Pessoa (54,8%) e Natal (52,98%). 

 

Quase empatou em Recife (47,5%) e Aracaju (47%). Teve 44% em Fortaleza e 42% em São Luís. Em Teresina obteve 37% e em Salvador 31%. Enquanto isso, o percentual de votos nos interiores, excluindo-se as capitais, ficou abaixo de 30% em todos os Estados, com exceção do RN (31,5%).

 

Por isso, o que de fato deve chamar a atenção do País no último pleito é o aumento da votação à direita nas capitais, a despeito de toda a pressão governamental local contrária.

 

A redução da pobreza no interior do Nordeste, com desenvolvimento sustentável, permitirá aos nordestinos escolher a agenda política mais de acordo com sua cultura que, com certeza, não se harmoniza à ideologia de esquerda.

 

Antonio Jorge Pereira Júnior
Doutor e mestre em Direito - USP,  professor do Programa de Mestrado e Doutorado em Direito da Unifor 

 

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