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Henrique Araújo: Um país sob fumaça
Opinião

Henrique Araújo: Um país sob fumaça

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Tipo Notícia Por
Henrique Araújo
Jornalista do O POVO
henriquearaujo@opovo.com.br (Foto: O POVO)
Foto: O POVO Henrique Araújo Jornalista do O POVO henriquearaujo@opovo.com.br

Ex-ministro de Jair Bolsonaro, Gustavo Bebianno afirmou dias atrás que o presidente "precisa superar os complexos que traz do passado". Não se referiu a quais, mas um deles talvez seja essa relação mal resolvida com a noção de patrimônio: o cultural, demonstrado na censura a filmes, entre os quais um do Ceará; e o ambiental, de que é resultado o avanço no desmate da Amazônia, punido com a suspensão de recursos oriundos de nações como Alemanha e Noruega e as queimadas que se seguiram.

Alçado ao Planalto, Bolsonaro replica como política de Estado uma postura do indivíduo Bolsonaro, para quem é preciso exaurir ou afastar o que o incomoda. O presidente, todos sabem, exerceu a atividade de garimpo mesmo quando já era capitão do Exército, ainda na década de 1980. Antes dele, o pai havia se ocupado do ofício, assim como da pesca, a mesma que Bolsonaro pretendia liberar em áreas de proteção ecológica como a da Estação de Tamoios, em Angra (RJ). Ali, o então deputado federal foi multado por um fiscal do Ibama, depois demitido quando o pesselista se tornou chefe do País, já neste ano.

Esse passado talvez ajude a iluminar a beligerância do presidente no que diz respeito à ideia de preservação. Uma das acepções de cultura é a de acúmulo, necessária para que uma floresta se enraíze e frutifique. Outra é a de cultivo, responsável pela progressão humana de uma dada sociedade.

A ambas o pesselista tem respondido da mesma maneira: dilapidando e fazendo cessar a fonte que irriga ora a riqueza imaterial/material (corte de verbas para educação, por exemplo), ora a natural, como o ecossistema nativo da Amazônia, consumido em chamas que produzem uma fumaça que encobre o território nacional, num simbolismo cujo alcance ainda estamos longe de entender.

Por trás dessa postura do presidente não há um projeto de desenvolvimento do qual se possa dizer que é meramente conservador. É reação instintiva e passional. Nele o indivíduo e o homem público se igualam ao mesmo nível, numa interação belicosa.

Ex-braço direito do capitão, Bebianno sabe do que fala. Bolsonaro tem de resolver esses complexos se quiser estar à altura do seu cargo. Seus atos, porém, apontam para o contrário: um Brasil em processo de combustão. 

 

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