Diz antigo adágio que tudo que está dentro já esteve fora e tudo que está fora já esteve dentro. Isso também se aplica a existência de duas lógicas: uma aplicada exclusivamente ao mundo do pensamento e das ideias e outra adequada à vida prática cotidiana. Não se trata de saber qual dessas é mais fundamental, são duas maneiras de se viver: ora fazemos o mundo, ora pensamos o mundo que foi feito. Isso também significa que não há uma correspondência entre visão prática e visão teórica. Elas se referem ao mundo existente e cada um dotado com lógica própria que se conformam entre si. A verdade dos fatos práticos não decorre imediatamente das ideias, mesmo que seja apoiada em ideias. Da mesma forma, as ideias teóricas não se referem ao que se passa no mundo imediato da vida porque temos uma dimensão simbólica e imaginativa que nos levam sempre para além do que está presente na vida imediata.
Como a condição humana limita a experiência no mundo através da subjetividade individual, criamos a ilusão de portas que permitem ver mais coisas e mais longe os acontecimentos. Mas para falar desses fatos distantes, temos que confiar e repetir as impressões e julgamentos feitos por outras pessoas. O risco de aderir a uma opinião dominante é grande, tomar partido sobre ideias complexas. A experiência pessoal tem valor inestimável, mas a razão moderna a pôs em descrédito e suspeição. A experiência válida é a que aparece como anônima, como se inexistisse sujeito. A objetividade foi construída como se o mundo exterior existisse em si mesmo independente das considerações subjetivas a seu respeito. Somos educados num mundo comum de reprodução e interpretação baseada em julgamentos longe do apoio da nossa experiência direta. A confiança cria e mantém o mundo público e comum a todos. Mas esse mundo coletivo é todo ele construído na base de experiências individuais que se apoiam numa colaboração subjetiva entre muitos até que se forme um entendimento comum, baseado no poder de fala autorizada. Em algum momento, esse equilíbrio de força e poder dos que detém a fala autorizada se desfaz, sem que uma outra tenha ainda se constituído. O vácuo de autoridade desorienta a todos. As antigas autoridades se batem para reconquistar o poder, mas dada a conjuntura de desordem interpretativa sobre o mundo, não há como reconquistar a autoridade.
A história nos ensina que enquanto as pessoas levam suas vidas preocupadas com os acontecimentos do presente, formam-se forças lentas e silenciosamente modelando o futuro. No presente e em todos os tempos, pessoas fizeram uma história que não sabiam nem tinham como saber qual história estavam a fazer. Uma história futura não de grandes lances nem feitas por grandes personalidades, mas uma junção de pequenas ações que reunidas ao final do dia aglutinam-se de maneira ainda hoje enigmática para dar luz a coisas imprevisíveis. De tanto nos preocuparmos com o domínio dos resultados de nossas ações, esquecemos na maior parte do tempo dos resultados involuntários produzidos em maior proporção de nossas ações.